2009-06-07
Caro Nuno,
Eu não disse que o problema da desigualdade se resolvia com a redistribuição do IRS, apenas disse que ela não se resolvia agravando essa redistribuição como foi implicitamente sugerida por Manuel Leitão. Limitei-me a chamar à atenção para a forte redistribuição que já existe por essa via. Já agora, e porque não referi ainda, eu sou adepto de uma taxa única, independentemente do escalão de rendimento de cada um, apenas com um limite inferior de isenção equivalente ao salário mínimo. Concordo consigo quando diz que temos de saber criar novas condições de acesso aos benefícios da economia a um universo o mais alargado possível de pessoas.
Francisco Rocha Antunes
Caros Amigos
Vamos subir um pouco a fasquia da discussão, Ok! Genericamente, o balanço faz-se entre o valor, o risco e a confiança. O mundo perdeu sensivelmente 50% do seu valor. Isto é, o valor mundial da raça humana no planeta terra, por grosso e por atacado, estava sobreavaliado. E não estamos a contar com as externalidades humanas sobre o pan-ecossistema. Elevou-se demasiado a confiança sobre riscos absolutamente incomportáveis. De um momento para o outro caímos na real. Portanto, o valor estava suportado por uma especulação desmedida num vórtice de confiança virtual e o risco estava escondido, ou apenas era do conhecimento de alguns. Exactamente, aqueles que estavam a auferir dos resultados da especulação sobre o valor.
1) Entretanto milhões de orientais e sul-americanos deixaram o nível de pobreza extrema. E porquê? Porque, não estando acomodados como os europeus e americanos, fizeram o seu percurso. Claro também, com a ajuda dos especuladores e gestores ocidentais, à custa da deslocalização global das organizações.
2) Entretanto uns fazem filhos e outros não. Impressionante, é que quem faz filhos ganha. Portugal não faz filhos. A Europa não faz filhos. Os Estados Unidos importam filhos. A China ainda faz filhos. E a Índia não faz de facto outra coisa que não sejam filhos. A Rússia não tem filhos para fazer filhos. Em África morrem filhos e pais.
3) Uns dizem que é a derrota do neo-liberalismo! Errado. A miséria humana não se derrota, vive-se com ela! É verdadeiramente extraordinário como ainda há “totós” que aceitam a dicotomia esquerda/direita. Não tenhamos receio dos marxistas, dos guevaristas e dos trótskistas – a miséria humana trata deles de forma voraz, mesmo que lentamente. Agora, cuidado com os nazistas, os leninistas, os maoístas e os bushistas, pois os métodos são pouco recomendáveis… A questão neste momento é a dialéctica entre conservadores e evolucionistas/reformadores. É sim a derrota dos governos e das governanças!
4) Vem aí uma nova guerra! Na primeira morreram cerca de 19 milhões. Na segunda pereceram cerca de 73 milhões. A nossa aposta é de cerca de 300 milhões na próxima! Número jeitoso… Nada, é pouco perante a fasquia de 9,5 mil milhões que se espera a raça humana venha a atingir, por aplicação dos modelos mais complexos de simulação da evolução.
5) E a Terra não se queixa? Nada. Na maior. A Terra ri! A sua perenidade ultrapassa a de Deus e Alá, logo está pacientemente à espera do “último dos moicanos”… Nós portugueses podemos estar descansados; se for a trabalhar, será um japonês de certeza. Contudo, haverá sempre o momento de “Um Último Português!
E o Último Português:
- -Ainda dependerá da identidade dos seus antecessores gilianos? Ou, ajudado por verdadeiros sistemas de alavancagem, qualificou-se, tem iniciativa, é pró-activo, assume o risco e transmite confiança – isto é, tem valor real!
- - Estará ainda assoberbado em impostos sucessivamente aumentados que lhe coarctam a sua dinâmica económica e social ou vive desses mesmos impostos resultado das cunhas que os seus antecessores conseguiram ao manter a dicotomia privilégio/caridade?
- - Será um lutador com origem nas berças ou um snob urbano acomodado aos privilégios dos seus antecessores ou alguém sem os traumas dos primeiros e o cinismo dos segundos?
- - Qual irá ser o seu valor? Actualmente, não é elevado – 36º. lugar no ranking PIB (PPC).
Perante isto, todos devem pagar impostos. Todos sem excepção. Só assim quem recebe sabe quanto custa e quem contribui em termos líquidos sabe que é correctamente aproveitado o que paga. Agora, não tem poder quem quer. Só tem poder quem pode e quem os outros deixam – até um dia. Os príncipes têm responsabilidades! Qual o verdadeiro valor dos príncipes? Será que os príncipes vão nus? E o bom senso dos príncipes?
“Um povo só pode ser feliz e próspero se estiver unido.” – Nicolau Maquiavel
Um abraço
Paulo Espinha
Caro TAF,
Tem toda a razão quando refere que o ordenado mínimo em Portugal é isento de IRS, o que é, aliás, dado o seu baixo valor face ao custo de vida, inteiramente justo. O que, por lapso, não indiquei quando trouxe o de França à baila foi que ele é ali cerca de três vezes superior ao nosso. Não creio que este esclarecimento seja fundamental para o debate do tema; no entanto, caso tenha um entendimento diferente, poderá naturalmente publicá-lo.
Cumprimentos.
Manuel Leitão
Em relação à fibra óptica e às notícias recentes (e não tão recentes) da instalação de infraestrutura de fibra óptica na cidade do Porto.
Dúvidas
- - O facto de um grupo estar a instalar fibra óptica na cidade quer dizer que outras empresas não o vão fazer? Vai haver só uma infraestrutura de fibra óptica para a cidade toda?
- - Se os operadores optarem por fornecer o seu serviço através dessa infraestrutura que não tiveram que instalar mas que naturalmente terá na mesma custos de exploração (previsivelmente mais baixos) quer dizer que vão ter uma oferta, a nível de preço, diferenciada para a cidade do Porto? Ou seja, como o aluguer da linha será em principio menor que o custo de instalar a infraestrutura então essa diferença de preços vai-se repercutir positivamente no consumidor?
- - Quais são de facto os serviços que vão passar a ser possíveis implementar em cima da fibra óptica e que com a infraestrutura actual não tinham viabilidade tecnológica?
Reparem que eu não estou a dizer que não faz sentido este investimento só pelo facto de não conseguir ver claramente quais poderão ser os seus benefícios, acho que quase nunca conseguimos antecipar os usos verdadeiramente inovadores e interessantes que podem aparecer quando algo de novo é disponibilizado ao mundo. Mas a minha teoria é que este tipo de investimentos (infraestruturas) é o investimento fácil, não implica mobilizar as pessoas para nada, não implica mudanças na forma como as pessoas encaram a sua cidadania, não muda verdadeiramente aquilo que é preciso, que é as pessoas. E as tecnologias de informação e principalmente os sistemas de informação poderiam (e na minha opinião deveriam) contribuir fortemente para resolver as questões cada vez mais importantes como da transparência e escrutínio da utilização de recursos públicos.
O que apareceu nas notícias?
- - "Isto porque, em suas casas, todos os portuenses vão passar a dispor de um serviço que combina a transmissão de dados, voz e multimédia - o chamado triple play - com uma capacidade de débito que pode ir até aos 100 megabits." e a minha pergunta é mas quanto irá custar essa oferta triple play? e mais do que isso, que riqueza para o país traz o facto de as pessoas poderem aceder ao messenger 50 vezes mais depressa do que actualmente? (nota: sei que estou a ser um pouco demagógico aqui...)
- - Ligar as escolas - Mas é ligar as escolas à Internet? Ou ligá-las entre si de forma a partilharem os seus sistemas de informação? Ah!? E elas têm algum sistema de informação já implementado? E capaz de comunicar com o mundo?
Em relação a outro sector de actividade, a Dra. Maria José Morgado referia a propósito da justiça portuguesa: "temos ferramentas do tempo da idade da pedra, não temos bases de dados, não trabalhamos em rede, e portanto não temos acesso à informação que permita detectar os fenómenos e agir com proactividade".
O meu principal ponto é que com a infraestrutura actual já se consegue imenso a nível de trabalho em rede, o que é preciso é sistemas de informação que o permitam/facilitem.
Sem dúvida que a fibra óptica possibilita maiores velocidades na transmissão de informação, mas se não tivermos nada para transmitir então é dinheiro deitado ao lixo.
links referência
JN, 4-março; Público, 4-março; Público, 8-junho
Caro Manuel Leitão,
Tenho a certeza que somos todos descendentes desse ilustre portuense, Afonso Martins Alho, que dá o nome a uma das perpendiculares da Rua das Flores e que negociou com os ingleses com tal mestria os termos de um acordo comercial no século XIV que ainda hoje sabemos bem o que quer dizer ser “fino como o Alho”. E prometo que não vou trazer modinhas em que os Alhos são abundantemente usados nas rimas. Concordo consigo quando diz que as contas do meu IRS interessam sobretudo a mim. Já não concordo é quando diz que não têm nada a ver com o seu exemplo. Recordemo-nos dele: perguntava porque razão um assalariado via reduzida a sua remuneração de 2 para 1 quando um gestor apenas reduzia de 10 para 9, e não para 5 como lhe parecia mais justo. Eu apenas demonstrei que o seu exemplo não estava correcto, que de facto quem ganha 10 já desconta 5 e fica com os 5 que achava justo. A relevância vem da realidade que o meu exemplo espelha e não de um raciocínio que esquece o efeito redistributivo dos impostos.
Já agora, e como parece termos uma ideia diferente do que é o IRS em Portugal, trago aqui um extracto de uma nota estatística do Ministério das Finanças referente ao recebimentos do IRS:
6. Quadro 37 – Total das Declarações com IRS Liquidado por Escalões de Rendimento Número de Agregados
O total de agregados com IRS Liquidado corresponde a cerca de 46% do total de agregados com rendimento bruto declarado. Daquele total de agregados, cerca de 28% apresentam rendimentos brutos até 13.500 Euros, enquanto que 70% declararam rendimentos brutos superiores àquele montante mas inferiores a 100.000 Euros.
7. Quadro 40 – IRS por Escalões de Rendimento Bruto Valores Liquidados
Da conjugação dos quadros 31, 37 e 40 retiram-se as seguintes conclusões:
- Para mais de metade dos agregados não é apurado qualquer valor de IRS;
- Para os agregados com IRS Liquidado:
- - Com rendimento bruto até 13.500€ (28%), o montante de imposto é de apenas 2,5% do valor total do IRS Liquidado em 2006;
- - Com rendimento bruto entre 13.500€ e 100.000€ (70%), o montante de imposto é de 70,4% do valor total do IRS Liquidado em 2006;
- -Com rendimento bruto superior a 100.000€, (2%), o montante de imposto é de 27,1% do valor total do IRS Liquidado em 2006.
Eu sei que esta coisa dos números assusta muita gente mas tem a vantagem de ser uma descrição, não uma opinião. Resumindo: de 4.371.037 agregados familiares identificados pelas Finanças em 2006, 2.360.360 não pagaram nada de IRS. Nada é mesmo isso, zero. O Estado arrecadou nesse ano 7.671.000.000 € de IRS. Do total de 2.010.677 agregados que de facto pagaram IRS, 562.990 tiveram um rendimento anual bruto até 13.500€ e pagaram 2,5 % do valor do IRS liquidado, ou seja, 340€ de IRS efectivamente entregue por agregado. No escalão dos agregados que tiveram um rendimento bruto entre 13.500€ e os 100.000€ estavam 1.407.474 famílias que pagaram, em média, 3.836€ de IRS por ano cada uma. Por fim, com um rendimento bruto superior a 100.000€, estiveram 40.213 famílias que pagaram em média, cada uma, 51.695€ de IRS nesse ano.
É por isto que não me parece que a solução seja aumentar os impostos aos que ganham mais. A redistribuição do rendimento já é maciça.
Francisco Rocha Antunes
O tipo de raciocínio que expus relacionando qualidade de vida com equidade deriva dos estudos do prémio Nobel Amartya Sen, cuja obra prima Desenvolvimento como Liberdade recomendo vivamente. Aí se encontram razões mais que abundantes por ex. sobre o erro grosseiro que é cometido ao tomar por garantido que PIB = desenvolvimento. Sen apresenta o desenvolvimento de uma forma múltipla composta por diversos tipos de liberdades.
Sem querer bater no ceguinho, aumentar-se a equidade é sem dúvida aumentar as oportunidades de uma grande parte das pessoas e logo o nível de desenvolvimento de um país (quem diz país diz região, cidade, etc.).
O raciocínio que o Francisco Rocha Antunes nos apresentou sobre o IRS já está ele próprio enviesado. Considera que como uns pagam muito e outros pagam pouco está tudo bem porque há redistribuição de riqueza. Mas está a passar ao lado do fundamental! Não é esse tipo de redistribuição que precisamos, acho eu. Mais importante que isso seria uma economia inerentemente equitativa, ou seja, geradora de equidade, e não uma economia que no fundo gera desigualdades e que depois, como se tivesse peso naconsciência, anda a distribuir trocados a quem precisa.
Aliás é isso que mais me irrita nos partidos da esquerda. É que ao tratarem as pessoas como coitadinhas e merecedoras de todos os apoios e mais alguns, ignoram o essencial e agravam as causas dos problemas, criando dependências cada vez mais difíceis de ultrapassar. Se dermos condições para as pessoas serem preguiçosas sabem bem que assim o farão!
Portanto no fundo acho que estamos a caminhar no sentido errado, mesmo em tempo de crise. Há uma fatia cada vez maior da população que se está a habituar à ajuda sempre presente do Estado. E isso paga-se caro.
Em suma: eu gostaria de viver num país onde ninguém tivesse de estar isento de pagar IRS porque auferiria rendimentos para isso e para viver com qualidade. Infelizmente não há nenhum partido cá que pense desta forma. O PS atira dinheiro para os problemas e ganhou uma absurda mania das grandezas; o PSD e o PP não acreditam na equidade, só acreditam no salve-se quem puder, embora em extensões diversas; o BE faz a apologia do ser humano como coitadinho; e para a CDU o ser humano passa a ser uma entidade abstracta. Há alguns partidos novos aí, como o MEP, mas que em certos aspectos tem um discurso lamentável, e pelo que li no excelente site euprofiler acaba por entrar também naquela lógica da subsídio-dependência que é a raiz de muitos dos nossos males...
Abraços
Nuno
Recebi alguns textos para publicação, mas terá de ficar para mais tarde...
Caro F. Rocha Antunes,
Ainda bem que "achando graça" ao que exemplifiquei me coloca de fora da condição de "engraçado". É que, em ameno clima linguístico de expressões e ditados portugueses, será sempre conveniente não confundir alhos com bugalhos.
A justiça social é coisa que, como bem saberá, anda pelas ruas da amargura em Portugal. Todos os dados da União Europeia não param de o afirmar e reafirmar. Neste blog, referencia Nuno Quental a Escandinávia como exemplo de menos pobreza e melhor qualidade e vida e, com naturalidade, alia estas à menor diferença entre os proventos máximos e mínimos dos cidadãos. Em França o ordenado mínimo está isento de IRS. Que interessam para o caso as contas que faz ao seu IRS? Em Portugal, os que ganham dez vezes menos que outros não pagam IRS? Não têm que se alimentar, vestir, calçar, educar os filhos, pagar transportes, comprar ou alugar um local onde morar? Seguramente não estará convencido que vão pagar tudo isso com o seu IRS...
Porém, alguma profundidade na abordagem da questão não pode ficar por demonstrações tão óbvias como estas e aplicáveis apenas a um aspecto lateral. A base do problema tem a ver com a propriedade e a distribuição do valor criado em qualquer empresa: enquanto se escamotear que não é "natural" considerar "sagrada" a exclusiva apropriação do lucro por parte do proprietário (mesmo com sua eventual, parcial distribuição pelos trabalhadores em caso de "bons sentimentos" por parte do dito...),continuaremos à mercê das maiores injustiças. Madoff (e alguns outros, por cá também) lá vão tendo que prestar contas das malfeitorias que passaram a vida a praticar. Muitos ainda não...
Termino com uma quadra duma famosa canção brasileira dos anos 50, do premiado filme "Os Cangaceiros", que, embora referindo-se à renda num outro contexto, nos remete para uma realidade bem próxima.
Olé mulher rendeira
Olé mulher rendada
Tu me ensina a fazer renda
Que eu te ensino a namorar...
Cumprimentos.
--
Nota de TAF: Só um esclarecimento - em Portugal quem ganhar apenas o salário mínimo garantidamente paga zero de IRS. Mesmo para ordenados bastante acima do mínimo não são nada invulgares situações em que a colecta acaba também por ser nula, recebendo o trabalhador a totalidade daquilo que lhe foi retido na fonte (isto quando chegou a ser retido).
Mais uma vez, apontam medidas que visam a melhoria das condições de vida do povo, mas isentam o Estado e as suas empresas de qualquer responsabilidade. Se estas últimas não impusessem aumentos de 2% e mais para os serviços que prestam sem os quais as empresas não podem trabalhar, talvez o trabalhador pudesse ser aumentado como merece e como qualquer empresa que se digne do nome deseja fazê-lo.
O problema é que antes do trabalhador há que pagar o aumento de toda uma série de serviços, que mesmo em ano de crise e tendo esses serviços lucros abismais, impõem; o trabalhador e o empresário "normal" não impõem nada. A taxa efectiva de tributação é geralmente de 65%, as ajudas de custo aos trabalhadores por exemplo são tributadas autonomamente.
Continuar a culpar o empresário pela má redistribuição da riqueza, isentar bancos, EDP, Galp, serviços municipais, coimas (tributadas autonomamente também) com base em normas que nos ultrapassam em largas dezenas de anos, só demonstra que de facto há poucos empresários neste país. E dos poucos que há raramente chegam ao Governo, vêm do Governo para as grandes empresas finda a carreira política, não pela redistribuição equitativa, mas para subterfúgios que permitam o alcance de contratos públicos de monta. Se há que limitar alguma coisa, limite-se o Estado, dê-se mais liberdade ao empresário, e verifiquem-se os resultados e os verdadeiros interesses do país.
Bom feriado.
Cristina Santos
Na sequência da intervenção de hoje de Cavaco Silva em torno da questão da abstenção algumas perguntas:
- Quando apenas 40% dos eleitores votou (ou um pouco menos se se considerarem os registos que já não deveriam existir) será que alguém "venceu" realmente estas eleições ou ganhou apenas numa distribuição de "migalhas"?
- Será que é verdadeiramente representativa uma eleição decidida por uma minoria?
- Fará sentido a introdução do quórum participativo nas eleições?
Introduzir a solução do quórum seria fortalecer a representatividade sem regulamentar comportamentos individuais (existiria abstenção e liberdade para a praticar, sem voto obrigatório) e era realçada uma maior união da sociedade em torno desta celebração da Democracia, que não deve ser confundida com partidos, candidatos ou contextos específicos. Não é contraditório estar descontente com a situação política e continuar a apoiar activamente o sufrágio universal. Comparecer para votar diz que se quer Democracia, o sentido de voto é que demonstra descontentamento ou apoio. São coisas diferentes e independentes.
O PR apelou à consciência cívica - a melhor forma de diminuir a abstenção - e seria essa a recompensada na situação do quórum, envolvendo a sociedade no seu todo no sucesso das eleições enquanto processo. Bastariam apenas mais 10% de eleitores com vontade de manifestarem em pessoa (o seu veemente protesto, por exemplo) para que não ocorresse indefinidamente esta situação vergonhosa.
Cumprimentos e bom feriado a todos.
--
Nuno Oliveira
--
Nota de TAF: a propósito, recomendo o discurso de hoje de António Barreto.
... vou estar menos tempo online, pelo que a publicação dos textos que me enviarem pode demorar um pouco mais do que o habitual.
PS: Caro Nuno, resta saber então se defendes a limitação de ganhos dos empresários e a diminuição dos direitos de propriedade privada. É que muitas destas medidas são contraproducentes! De boas intenções... ;-)
Caro Tiago
Quando sugeri tectos salariais globais era exactamente isso que queria dizer! Digamos que a minha "veia comunista", de vez em quando, fala mais alto. Mas é só em raras ocasiões. Este assunto deriva não apenas da concepção de liberdade mas também de justiça. Há várias interpretações do que é a justiça e cada uma delas tem implicações diferentes para a organização da sociedade. Rawls, por exemplo, considera que o aumento de bem-estar de um ser humano que está em piores condições é muito mais significativo do que o aumento do bem-estar de uma pessoa que já se encontra bem.
Portanto, o importante é mais uma vez saber o que queremos. Se queremos uma sociedade justa (nesta sentido), onde se procura igualar o acesso às oportunidades, há que fazer algo por isso. É evidente que o capitalismo na sua vertente liberalista não capaz de tal coisa. Imagino que muitos magnatas deste planeta não estejam especialmente preocupados com isso. Nós é que estamos, e com razão.
Claro que daqui até ao salário máximo vai ainda uma certa distância. É preciso estabelecer uma relação entre as duas coisas... Sugiro a leitura de Beyond growth, de Herman Daly, um economista que trabalhou no Banco Mundial. Foi aí que primeiro encontrei esta sugestão. Ela poderia tomar diversas formas, a mais correcta das quais talvez fosse impor uma razão máxima entre o salário mínimo e o salário máximo dentro de cada organização.
A ligação principal que faço relaciona-se com o facto de o dinheiro não nascer do solo. Acredito que um limite salarial, mesmo que "abonado" (ninguém deixaria de ficar com um salário generoso por causa de tal lei...), levaria necessariamente a uma distribuição da riqueza mais igualitária, levando por isso a uma sociedade mais justa, menos pobreza e mais qualidade de vida. A verdade é que as sociedades onde existe "de facto" um limite semelhante (caso de alguns países nórdicos, onde a diferença entre os salários máximos e mínimos é menor) são efectivamente os mais justos. O contrário também é verdade. Acima de tudo, não consigo encontrar uma razão para existirem salários tão elevados. Que fazem essas pessoas de tão especial para merecerem isso? A concentração de riqueza significa concentração de poder, o que mais uma vez implica um afastamento dos princípios democráticos.
Bom, podem-me considerar um radical neste aspecto, mas recordo que isto nada tem a ver com uma cultura de exigência e de trabalho. São coisas completamente diferentes. Igualdade de oportunidades não significa andar a atribuir subsídios a quem gosta de ficar em casa a descansar.
Um bom dia de Portugal!
Nuno
Caro Manuel Leitão,
Achando graça ao seu exemplo, apenas relembro que o malvado gestor paga 42% de taxa de IRS, além de descontar apenas menos 0,5% de Taxa Social Única perdendo (bem, quanto a mim) o direito a ter subsídio de desemprego. Ou seja, recorrendo ao seu exemplo, enquanto o assalariado ganhava 2 e passou a ganhar 1, o gestor ganha 10 e paga 3 de IRS e 2 de TSU, ou seja 5. Acha mesmo que é preciso limitar o ganho dos gestores depois desta redistribuição toda? Ou se calhar bastava fiscalizar mesmo o rendimento de toda a gente para ter a certeza que a "optimização" fiscal acabava de vez? É que 5% dos contribuintes malvados já é responsável por 60% das receitas do IRS. Não me parece que o progresso possa vir de agravar mais as taxas dos poucos que pagam, mas sim de ter a certeza que os que não pagam o passam a fazer. Eu por mim agradecia o fim de tanta "concorrência desleal".
Francisco Rocha Antunes
um dos malvados que paga os impostos todos
Com o seu habitual elevado nível de educação, procurou TAF replicar ao meu comentário anterior sobre o tema dos tectos salariais. Afinal, mais do que isso, é o conceito de liberdade que está aqui em discussão; por outro lado, questões morais sobre a finalidade do dinheiro de cada um não foram por mim trazidas para o debate - os meus exemplos tinham, sim, o propósito de ilustrar com ironia como, em tempos de crise, não podem uns queixar-se do "negócio" e simultaneamente não quererem abdicar, ao menos parcialmente, das habitualmente chamadas "coisas boas da vida", passando o "prejuízo", na íntegra, para os seus colaboradores / empregados / assalariados. Não é, pois, questão de o Estado regular comportamentos individuais do foro íntimo mas, sim, da liberdade e seus limites no sentido de distribuição, em alguma medida solidária, do que passou a haver (a menos) num universo que pode ser tão diferente (e ao mesmo tempo tão semelhante) como o da pequena e o da grande empresa, privada ou estatal. Perdoem-me mas dou rapidamente mais um exemplo simples do que digo: se o assalariado ganhava 2 e passou a ganhar 1, porque deverá o gestor que ganhava 10 passar a ganhar 9 e não 5, por exemplo?
E por aqui me fico, sem que isso signifique que não tenha opiniões mais profundas sobre o tema da justiça social. Mas para o que estava inicialmente em causa, espero ter clarificado a minha entrada anterior.
Cumprimentos.
Um comentário necessariamente muito sucinto, dada a falta de tempo para a atenção que o assunto, e os meus interlocutores, mereciam. Acredito que quem defende a limitação obrigatória de salários (refiro-me ao sector privado) não ponderou devidamente as implicações disso.
- 1) Por que razão se hão-de limitar salários sem, pela mesma ordem de ideias, se limitar então os ganhos de capital ou outros? Limitam-se os ganhos dos trabalhadores dependentes mas não dos outros?
- 2) Por que razão um empresário há-de ser impedido de pagar tão bem quanto queira a um seu funcionário? Não poderá dispor do seu dinheiro como bem entende?
Significa isto a defesa do liberalismo selvagem? Claro que não. Terá de haver regras de protecção dos trabalhadores, mas exigir um mínimo de retribuição não obriga, de modo nenhum, a impor também um máximo a essa retribuição.
Deverá o Estado impor regras de ética aos cidadãos, estipulando comportamentos e quantificando o uso que podem fazer do seu património (que nessa altura já nem era bem seu, portanto...)? Se sim, quem é que define o que é um "comportamento ético"? Por este andar estar-se-ia a defender o fim da propriedade privada e da liberdade individual...
Em síntese: eu posso não concordar (e de facto não concordo) com a forma como muita gente gasta o dinheiro que tem (e que a mim também me daria muito jeito). Mas, desde que cumpra a lei, defendo ao mesmo tempo a sua liberdade de desbaratar o seu património e de assumir comportamentos pessoais que eu considero altamente reprováveis. Numa sociedade livre e democrática dever-se-ão proporcionar garantias suficientes a todos, mas nunca tentar impor padrões de comportamento. Digamos assim: o que interessa é que não haja pobres, e não eliminar os ricos. Quem me dera a mim ter muito dinheiro para poder investir e ajudar a desenvolver o país! ;-)
Meus caros,
A questão dos tectos salariais aqui abordada por um blogger e logo contestada por TAF com clara referência ao coarctar de liberdade que isso implicaria, não deixa de me espantar, vinda a contestação de quem vem e de quem não fazia ideia que tivesse da dita liberdade um conceito tão, digamos, amplo. O que me parece é que há algumas coisas que passam por símbolos de liberdade, quando se trata, ao contrário, do mais indigno abuso da mesma. Mas a realidade tem uma força tremenda e, às vezes, é suficiente para fazer entender até alguns que, pela sua posição social privilegiada, têm mais dificuldade em compreendê-la. O patrão dum amigo meu já compreendeu: como não lhe basta lançar a redução de lucros na conta do salário dos seus empregados, decidiu dispensar uma das duas amantes que tem, só passar férias no estrangeiro duas vezes por ano, ir algumas vezes menos aos excelentes (e caros) restaurantes que costuma frequentar e até, sacrifício dos sacrifícios!, não trocar este ano o seu Mercedes actual (já tem dois anos...) por outro novo.
Um bravo, este patrão do meu amigo! Mas se quiser mesmo tornar-se um ser humano digno, já não vou ao ponto de esperar que abjure o capitalismo sem freio mas, pelo menos, deverá deixar-se de lições de moral em relação aos que, em vez de trabalharem de borla para ele ao fim de semana, gostam mesmo de, uma vez por outra, "meter os pés na água". E se acredita no Além, passará a ter uma, ínfima embora, possibilidade de lá ir parar quando a sua horinha chegar... Porque, como diz aquele tal livro, é bem mais fácil o "...camelo passar pela buraco da agulha...", etc., etc...
Liberdade?
Cumprimentos.
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- Caro Nuno, essa dos "tectos salariais para todos" só pode ser engano!... Se assim for também deveremos então limitar aquilo que os empresários podem ganhar com as suas empresas? Além de uma medida dessas ser contraproducente, seria mais um atentado à liberdade a juntar a tantos outros. O problema não é ganhar muito, é 1) gastar mal e 2) não garantir a todos a possibilidade de, querendo trabalhar, ganhar pelo menos um mínimo indispensável.
Também eu, como a Cristina Santos, sinto uma certa alegria quando vou votar e vejo pessoas tão diferentes umas das outras. Umas com os filhos, outras com os avós (ou netos), uns com o vestido de Domingo, outros descontraídos... É de facto o único dia em que somos todos iguais. O voto é das poucas regras verdadeiramente democrática. Tudo o resto fica a alguma distância, e muitas vezes o afastamento dos princípios democráticos é mesmo muito grande.
Creio que a correcção dos problemas do nosso sistema - que há problemas penso que é consensual - passa pelo aprofundamento da democracia, sobretudo por métodos tipo referendo. Por que não, por exemplo, referendar a construção do TGV? São obras enormes que nos deixarão endividados por muito tempo! Enquanto continuarmos a achar que o "povo" não sabe escolher - como se fez com o referendo sobre o pseudo-tratado de Lisboa - não se vai a lado nenhum.
Passa ainda por um parlamento com deputados em exclusividade de funções; por tectos salariais globais, aplicáveis a todos; por uma economia inclusiva e que premeie o trabalho e o esforço, e evitando ao máximo as dependências criadas pela atribuição indiscriminada de subsídios (de que a esquerda tanto gosta).
Alguns problemas, como os da educação, só poderão ser resolvidos quando os próprios profissionais da classe decidirem o que deve ser feito. Não me refiro aos sindicatos, que actualmente e com honrosas excepções só servem para convocar greves e acabam por ter um papel muito pouco construtivo, mas sim a esquemas de organização e participação muito mais elaborados que procurem ouvir e pôr a debater, de forma sistemática, os profissionais desse ramo.
As freguesias, como disse o Arq.º Pulido Valente, poderão ter um papel muito mais importante, mas apenas para as questões de índole local.
Enfim, aqui ficaram algumas pistas. Perdoem a desarrumação, mas foi o possível :-)
Abraços
Nuno
O que um filme, “Star Crossed – Amor em Jogo” e outros que se seguem – D. António e Zé do Telhado -, poderá trazer para o desenvolvimento de uma região e de um país?
Do meu ponto de vista, muito. E permitam-me não estarmos sempre a falar sobre questões, também importantes, mas muito pesadas, como o metro do Porto, o Parque da Cidade, a reabilitação da Baixa, o Aeroporto, a Av. dos Aliados, etc.. Os muitos incorpóreos filmes e romances também têm o seu lugar, muitas vezes como verdadeiros aglutinadores de peças que estão demasiado soltas.
Querem ver a magia de saber reunir peças soltas num todo coerente? Neste caso, cinco ou seis nacionalidades diferentes desenvolvem um projecto universal a partir de uma cidade que tem estado muito longe de tudo (Porto) e reúnem-se numa história banal e imortal (Romeu e Julieta), num cenário, pese embora a sua grandiosidade, improvável (o nosso Estádio do Dragão).
Este projecto teve o inesperado apoio de uma entidade empresarial que até agora nada teve a ver com filmes, a Associação Empresarial de Portugal. Foi produzida pela Yellow Films, de Angelino Ferreira e sua filha Soraia Ferreira, que tem no seu capital a InovCapital e a Change Partners de Mário Pinto e SONAE Capital.
Quais são as peças soltas, imbatíveis por si só, que parecem tontas de uma forma desligada mas que têm todo o sentido se integradas? Criar de raiz, cidade natal, universalidade, independência, empresarialidade, remuneração dos accionistas e empregados, internacionalidade, multiplicação de nacionalidades envolvidas, certificação nos EUA, seguros internacionais, carreira internacional, Portugal primeira escolha, custos de contexto mais elevados, produtividade, eficácia, continentalidade do Porto, sucesso.
Isto é o Porto. Um verdadeiro cocktail de ingredientes que quando sabiamente misturados e liderados dá uma mistura que poderá ser arrebatadora. É o assumir da cultura e da criatividade no desenvolvimento económico e no reforço do posicionamento da nossa marca portuguesa mais marcante: o Porto.
Por mim, vou assistir ao filme e sei que me vou deliciar com as imagens da Ribeira vista de Gaia, com o azul do Estádio do Dragão e sonhar com o ouro do Rio Douro, e já agora vou ansiar que os amantes não se suicidem. Se o fizerem, espero que se reencontrem noutra vida, neste Porto, e que sejam muito felizes.
No passado dia 30-maio Maria José Morgado esteve no Porto na Universidade Lusófona onde fez uma apresentação a que chamou Urbanismo Ilegal: Uma Justiça Impossível. Essa intervenção está agora disponível via podcast "O Porto em Conversa".
Na primeira parte apresentamos a sua intervenção inicial que foca o enquadramento legal aplicável às questões do urbanismo e explica porque razão estes lhe parecem insuficientes apresentando como proposta de melhoria o exemplo espanhol. Na segunda parte do podcast (que irá ficar disponível na quarta-feira) temos a sessão de perguntas e respostas que se seguiu à sua intervenção inicial.
Algumas notas sobre a sua intervenção podem ser consultadas na imprensa no sites da RTP, Sol, Visão, entre outros. Podem descarregar o programa directamente ou subscrever o podcast através deste link.
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