De: Nuno Quental - "Tectos salariais"

Submetido por taf em Quarta, 2009-06-10 13:49

Caro Tiago

Quando sugeri tectos salariais globais era exactamente isso que queria dizer! Digamos que a minha "veia comunista", de vez em quando, fala mais alto. Mas é só em raras ocasiões. Este assunto deriva não apenas da concepção de liberdade mas também de justiça. Há várias interpretações do que é a justiça e cada uma delas tem implicações diferentes para a organização da sociedade. Rawls, por exemplo, considera que o aumento de bem-estar de um ser humano que está em piores condições é muito mais significativo do que o aumento do bem-estar de uma pessoa que já se encontra bem.

Portanto, o importante é mais uma vez saber o que queremos. Se queremos uma sociedade justa (nesta sentido), onde se procura igualar o acesso às oportunidades, há que fazer algo por isso. É evidente que o capitalismo na sua vertente liberalista não capaz de tal coisa. Imagino que muitos magnatas deste planeta não estejam especialmente preocupados com isso. Nós é que estamos, e com razão.

Claro que daqui até ao salário máximo vai ainda uma certa distância. É preciso estabelecer uma relação entre as duas coisas... Sugiro a leitura de Beyond growth, de Herman Daly, um economista que trabalhou no Banco Mundial. Foi aí que primeiro encontrei esta sugestão. Ela poderia tomar diversas formas, a mais correcta das quais talvez fosse impor uma razão máxima entre o salário mínimo e o salário máximo dentro de cada organização.

A ligação principal que faço relaciona-se com o facto de o dinheiro não nascer do solo. Acredito que um limite salarial, mesmo que "abonado" (ninguém deixaria de ficar com um salário generoso por causa de tal lei...), levaria necessariamente a uma distribuição da riqueza mais igualitária, levando por isso a uma sociedade mais justa, menos pobreza e mais qualidade de vida. A verdade é que as sociedades onde existe "de facto" um limite semelhante (caso de alguns países nórdicos, onde a diferença entre os salários máximos e mínimos é menor) são efectivamente os mais justos. O contrário também é verdade. Acima de tudo, não consigo encontrar uma razão para existirem salários tão elevados. Que fazem essas pessoas de tão especial para merecerem isso? A concentração de riqueza significa concentração de poder, o que mais uma vez implica um afastamento dos princípios democráticos.

Bom, podem-me considerar um radical neste aspecto, mas recordo que isto nada tem a ver com uma cultura de exigência e de trabalho. São coisas completamente diferentes. Igualdade de oportunidades não significa andar a atribuir subsídios a quem gosta de ficar em casa a descansar.

Um bom dia de Portugal!
Nuno