De: Joana da Cunha Barros - "Uma pequena aldeia"
Chamo a vossa atenção, mais uma vez, para as minhas "dores" e desejo não estar a perder o vosso tempo. O meu saberão que só estará perdido quando deixar de fazer a minha parte quer tenha mais ou menos sucesso.
É estranho, no entanto, como os últimos temas sobre política se interligam com o "meu", este que elegi como bandeira numa guerra em várias frentes. Como vos disse antes, vontades políticas. No último fim-de-semana tive a oportunidade de visitar outros Centros Históricos, um pouco melhor tratados do que este que me acolheu, bem mais pequenos é certo, bem diferentes morfologicamente, mas com o mesmo cardápio de problemas a todos os níveis. No entanto, o sorriso das pessoas já é bem diferente, uma satisfação de quem parece ter ultrapassado algumas das adversidades, ter equilibrado melhor a balança, possuir outras ferramentas na luta pela subsistência.
A Cidade do Porto tem dentro de si um lugar onde as pessoas vivem abaixo do limiar da pobreza, mas mesmo assim as grandes prioridades parecem ser outras. Vejo corridas de automóveis e de aviões, assisto à construção da marina, às obras pagas por todos nós no Palácio do Freixo cujo acesso é restrito e prepara-se para ser Pousada, uma Casa da Música e um Edifício Transparente, uma avenida renovada, tanto fogo de artifício para animar o povo e fazê-lo esquecer todos os outros dias do ano. Acreditem não sou contra nada disto, até gostava de ter um barquito amarrado na Marina do Freixo e a velocidade é uma das minhas paixões secretas. Tenho é outras prioridades que a Cidade deveria tentar adoptar. Saio à rua e cumprimento os meus vizinhos e vizinhas, todos aqueles que procuro ajudar da melhor forma possível, mesmo quando não sei arranjo outra pessoa que o faça. Creio que esta atitude pro-activa me tem ajudado a ser aceite com um peso diferente de uma "estrangeira".
O retrato cinematográfico da Sé feito por Cristina Santos (ao nível de Manoel de Oliveira dos primórdios) é uma realidade bem presente todos os dias do ano. Os técnicos da FDZHP eram apenas alguns desses técnicos que procuravam minorar a desgraça da D. Fernanda, da D. Gracinda, do Sr. Manuel e da D. Maria, respondendo com solidariedade e não com comiseração, com profissionalismo e dedicação. Conheço o rosto de alguns desses técnicos por me cruzar com eles na rua e sei o trabalho que faziam pelas pessoas que eles cuidavam. Uma das provas do impacte que eles tinham na população foi o facto de apenas as colectividades locais terem votado contra a extinção da Fundação e o despedimento colectivo. A todos os outros que votaram a favor parece ter sido oferecido algo em troca que aos primeiros pareceu pouco para aquilo que estavam prestes a perder.
Quando este executivo chegou, a FDZHP preparava-se para conquistar alguma autonomia com as empresas de inserção que acabava de criar. Uma empresa de inserção, julgo, em termos básicos, prepara e forma desempregados de longa duração ou à procura do primeiro emprego, ao mesmo tempo que fornece um serviço à comunidade, serviço esse que é pago tendo em conta as capacidades dos agregados familiares. Após a formação os formados poderiam ingressar numa empresa ou montarem o seu próprio negócio. Era assim na empresa de inserção que se pretendia instalar no edifico de Mouzinho da Silveira que a CMP subtraiu à população e onde instalou a SRU por um montante mensal ridículo que esta paga à Fundação (não esqueçam que os administradores da SRU também o eram na FDZHP, já no tempo do Dr. Paulo Morais, essa figura cómico-trágica); era assim na que se instalou na Rua dos Mercadores, ao Túnel e que foi encerrada, sendo as suas instalações prometidas a outras instituições mas que nunca mais nada lá funcionou. Encerraram o Infantário que contribuía para (...) Apoiar o funcionamento dos diversos programas na área da formação e do emprego, criando condições de acolhimento das crianças cujos pais participam nas actividades; Proporcionar um espaço de aprendizagem onde os pais/educadores possam identificar e adoptar práticas educativas adequadas; Contribuir para o desenvolvimento harmonioso e global da criança; Desenvolver interesses de carácter sociocultural nas crianças; Minorar os efeitos discriminatórios das diferentes condições socioculturais.(...) in página web da fdzhporto.
Numa intervenção concertada e global tratavam os problemas na nascente e não, geograficamente falando, na foz do rio, como é o caso do programa Porto Feliz da autoria deste executivo. Sim é isso mesmo, um paliativo... Não podia estar mais em desacordo com Francisco Rocha Antunes em tanta coisa que tem escrito ao longo destes anos, mas principalmente quando diz (...) que é legítimo a qualquer executivo camarário escolher os instrumentos que acredita serem os melhores para cumprir a sua política (...). Não é, acredite que assim não é! Creio que é por não acreditarmos todos nisso que existe aquilo a que se chama de "participação democrática", "consciência cívica", e até, quiçá, uma das principais razões para a existência deste Blog. A legitimidade dos eleitos é dada pelo povo que neles vota mas não só, também por aqueles que não concordam com as políticas escolhidas e que por elas são afectados, todos em conjunto.
Nunca um executivo desta cidade antagonizou tantos em tão pouco tempo, nem nunca tratou o bem público como se de um bem privado seu se tratasse, como este que gere o Porto.
Ao contrário do que diz FRA, não conheço ninguém no Centro Histórico que não deseje cá estar, até mesmo aqueles que são desenraizados para a periferia acabam por regressar, mesmo para condições ainda mais precárias que as anteriores porque é aqui que estão os amigos, as ruas que eles conhecem, o rio que os viu nascer. Aquilo que diz que a SRU está a fazer "misturando-os e integrando-os" só vai fazer aumentar as assimetrias, tendo alguém já dado um nome a isso - gentrificação.
Quanto ao IPPAR, não se esqueça que a sua Directora Regional é alguém que já esteve no CRUARB e que cometeu os maiores disparates em reabilitação do Centro Histórico, com a cumplicidade de técnicos que agora estão na SRU. Veja melhor os Documentos Estratégicos aprovados e verá que aquilo que se está a fazer em Carlos Alberto - o Pátio Luso - bem podia chamar-se pátio alfacinha (o seu autor até é de Lisboa e tudo) e nada tem de portuense. Com maior ou menor pormenor estético o mesmo acontecerá nos restantes, como no Quarteirão do Corpo da Guarda, onde desaparecem as características individuais de cada edifício, restando a fachada, nascendo um parque de estacionamento ao nível do primeiro piso em relação a Mouzinho (???). Espero que sobrem alguns quarteirões para quando vier outro executivo, da mesma ou doutra cor política para mim é igual, que saiba fazer diferente e para quem inserção e reabilitação não sejam palavras vãs.
Quanto à expropriação (o Tiago compreenderá que sei o que é e que por ser um instrumento tão complexo até tem um código próprio) se não existe dinheiro como diz FRA, os proprietários poderão estar descansados porque, depois do desfalque que foi em Carlos Alberto, mais ninguém será expropriado. Assim vai ser possível percorrer todos os corredores que devem ser percorridos até esse ponto, sem que o bastão da expropriação tenha que ser levantado, não deixando ninguém a choramingar.
Joana da Cunha Barros
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Nota da TAF: Cara Joana, será certamente defeito meu, mas não percebi o seu comentário quanto à expropriação. O que eu digo é que esta ferramenta me parece indispensável para evitar situações de impasse em que foi impossível encontrar um consenso. O dinheiro para as realizar pode aparecer através de parcerias com promotores privados. Claro que é preciso saber gerir este processo com sensatez para evitar abusos.