De: Joana da Cunha Barros - "Centro Histórico do Porto - Património da Humanidade"
Isto de se possuir algo que é Património da Humanidade deixa qualquer pessoa orgulhosa (pelo menos é assim em qualquer país civilizado), mesmo não tendo nascido nesse local - como é o meu caso, mesmo que não se saiba bem o que isso representa - como parece ser o caso de muita gente (pior quando essa gente tem o poder de decidir sobre o assunto). Nem sempre o silêncio é neutralidade e nem sempre a ignorância é uma bênção. Confundir a FDZHP (ou até o CRUARB) com a Porto Vivo, é quase tão grave como achar que o Centro Histórico do Porto é a mesmíssima coisa que a Baixa ou a Foz Velha.
Chegar a esta conclusão é possível, não apenas do ponto de vista jurídico, bastando ler os estatutos e a missão de cada uma e sem se precisar de uma Licenciatura em Direito. Aliás, é precisamente por tê-lo já feito que sei que a FDZHP não é um organismo público e que os seus funcionários não são assalariados do Estado, pese embora as verbas que a sustentam venham dos seus fundadores que são entidades públicas. A Porto Vivo tem uma personalidade jurídica bem diferente, mas de igual forma os seus funcionários deverão ter um contrato individual de trabalho ou qualquer outra forma contratual prevista à luz da Lei Geral e não da Função Pública. Não invalida que quer uma quer outra possam ter colaboração de técnicos que são destacados ou requisitados à CMP, à Segurança Social, à CCDRN ou a tantos outros organismos da Administração Pública.
Por outro lado a Fundação tem um papel apenas localizado no Centro Histórico e eminentemente de carácter social, ao qual associou mais tarde a componente de reabilitação de edifícios (isto recorrendo à memória) uma vez que se revelava penoso reabilitar socialmente as pessoas e deixá-las viver nos mesmos locais degradados a que chamavam "casa". A SRU não tem qualquer vocação social, caso contrário a lei que a criou não teria previsto um instrumento violento e pouco dialogante como a expropriação. O que este expediente vai produzir é aquilo que já se antevê que esteja a acontecer nos Quarteirões Prioritários (ver site da SRU), ou seja, pouco mais que uma transferência de propriedades de umas mãos para outras com um resultado final negativo em termos de património reabilitado, à luz de outras cidades europeias onde este modelo tem sido implementado. Se uma instituição tem provas dadas no terreno a outra nem por isso, mesmo falando em termos temporais relativos.
Assim, se após estes 18 anos (maioridade portanto) em que moro, cresço e trabalho no Centro Histórico do Porto - Património da Humanidade - berço desta nobre cidade, vejo o meu elevar de voz ou a expressão das minhas convicções serem comparadas a "perda de tempo" ou "choramingado contínuo", não só estou indignada mas suficientemente revoltada para lutar contra o crime (insisto) que se está a cometer ao local e às pessoas (que andam a ser "exportadas" para os bairros de periferia, completamente desenraizadas e com perda total de valores). Sossegue-se, a revolta ainda não me tolda a lucidez (julgo)!
São os discursos derrotistas e a indiferença que continuam a permitir que o nepotismo, em vagas, invada a nossa Cidade e decida as nossas vidas.
Joana da Cunha Barros
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Nota de TAF: Permita-me apenas um comentário sobre a expropriação. Trata-se de uma ferramenta que pode ser bem ou mal utilizada, mas parece-me indispensável no caso do Porto para "desencravar" situações em que o diálogo se esgota. Nem sempre é possível encontrar consensos.