De: F. Rocha Antunes - "Desacordo com o Arquitecto Pulido Valente"
Meu Caro Pulido Valente,
Tu és das pessoas que sabem o trabalho e a persistência que dá fazer algo que se acredita que tem de ser feito. O que isso significa de persistência, atenção, disponibilidade para explicar a outros conceitos e questões que saem da superficialidade das notícias do dia. Ou, na linguagem que tu preferes e eu não, o que é o esforço militante.
És respeitado pela tua determinação, pela tua frontalidade, e até pelos teus apelos mais inflamados. Mas como tu também sabes, isso não chega para ter sempre razão. Neste caso não tens razão no comentário que aqui fizeste a propósito do projecto do Arquitecto Siza Vieira em Madrid. E eu, que percebo muito pouco de arquitectura, não entendo essa tua obsessão contra Siza. Ele é tão fraco como arquitecto como tu dizes? Ao ponto de dizeres que faz desenho de moda nos Aliados?
No caso dos Aliados apresentaste uma ideia alternativa para aquele espaço e provaste a todos, com esse exemplo, o enorme potencial criativo que pode ser libertado por uma discussão pública. A discussão pública é desejável em todas as questões que mexem com o espaço público, exigível já em muitas situações de planeamento e imprescindível, pelo menos do ponto de vista da cidadania, no espaço mais significativo da cidade.
Eu não sei o suficiente para ter uma opinião definitiva quanto ao projecto, uma vez que não houve debate público. Uma das vantagens de um debate público é permitir que todos os cidadãos interessados possam formar uma opinião mais qualificada sobre um assunto importante para a cidade. Agora, o que eu contestei, e estou absolutamente contra, independentemente do projecto, ainda que fosse teu, é que uma modificação desta importância se tivesse feito sem se ter promovido uma discussão pública. É uma questão de método essencial numa cidade civilizada.
Não gostei nada que uma empresa pública que apenas para efeitos de gestão operacional é equiparada a empresa privada tivesse tido a oportunidade de oferecer, sem hipótese de discussão pública, um projecto para a Praça principal da cidade. E que como pagava, a Câmara tivesse aceite como boa a oferta. E que o IPPAR se tenha portado de forma tão ligeira, e ainda hoje não se tenha percebido afinal se o processo de classificação dos prédios dos Aliados já caducou, já foi concluído ou, o que é o mais provável, continua em vias de classificação por mais 10 anos. Em resumo, eu opus-me e oponho totalmente quanto ao método como o projecto foi desenvolvido e aprovado. Quanto ao projecto ainda não consegui avaliar completamente.
Foram muitos os que, sentados nas cadeiras mas não conformados, deram a sua opinião, como em tantas outras situações. Mas houve muito mais do que isso, feito por alguns, poucos, que deram um exemplo de mobilização e cidadania verdadeiramente invulgares e exemplar: Manuela Ramos e os outros activistas da Campo Aberto, com o seu Aliados. Batalharam, mobilizaram, persistem, esclarecem, intervêm. Convocaram quem queria participar para estar presente numa manifestação para o dia 12 de Novembro, sem correntes a árvore nenhuma, mas com o objectivo de chamar à atenção para o assunto antes das obras começarem efectivamente e apareceram 30 pessoas.
Portanto, não concordo contigo com a ideia que somos todos uns conformados sentados. Alguns não são, como sabes. E o que vem fora de horas, por serôdio, é o teu apelo à mobilização.
A propósito, onde estavas tu no dia 12 de Novembro?
Francisco Rocha Antunes
Promotor imobiliário
PS. Para que não haja equívocos, eu não acredito que os assuntos da cidade se resolvam com manifestações, embora reconheça que evidentemente podem fazer parte de uma onda de contestação. E que a opinião persistente e qualificada sobre um determinado assunto é mais importante que a maioria dos slogans e gritos de uma manifestação. Eu não participei na manifestação, mas participei activamente com os meus comentários contestando o método e a falta de discussão pública.