De: JA Rio Fernandes - "O essencial da reforma da administração não pode ser a alteração de limites de freguesias!"
Custa-me perceber que se discutam dimensões geográficas antes de se conhecerem as competências e os meios dos diferentes níveis de administração. Custa-me perceber que o “documento verde” fale de migração de poder dos municípios para as freguesias bem como para associações de municípios e ao mesmo tempo tente vender a ideia da descentralização e do reforço do papel dos municípios… Custa-me que se comece a reforma pelos níveis mais próximos da população e menos essenciais na reestruturação do centralismo do nosso Estado (a quem tenha dúvidas, pf. compare a percentagem da despesa do Estado Central português relativamente ao de outros países europeus, designadamente os que têm maior crescimento económico). Reestruturação do Estado e descentralização, sem regionalização? Pode ser… Descentralização, com associações intermunicipais-piloto e sem que os seus dirigentes sejam legitimados através de eleição direta? Não me parece… Descentralização com as Câmaras Municipais a fazer migrar competências para novas juntas de freguesia e associação intermunicipais? Mais centralismo é o que nos espera, neste “Relvas 2” dito “documento verde”, apesar da capa azul... E, muito provavelmente também, o que nos espera é (ainda) mais ineficiência do Estado comandado e vigiado por muito poucos (sempre mais ou menos os mesmos “lesboetas” na naturalidade ou na aculturação), aos quais os autarcas terão de tirar o chapéu e baixar a cabeça ainda mais baixo, rogando a Suas Exas. um pouco mais de atenção às condições de vida duns portugueses perdidos num qualquer lugar longe da vista e do coração de quem, desde a capital e em direta articulação com o FMI, Bruxelas e Berlim, “comanda superiormente os destinos da pátria”.
Neste quadro, a fusão das freguesias parece um bom contributo sobretudo para aumentar um pouco o poder de pequenos autarcas locais e retirar notoriedade aos presidentes de câmara. Sim, bem sei que o país mudou muito em século e meio. Sim, bem sei que é preciso poupar (e fazer crescer a economia também, sem que quem nos dirige pareça saber como). Mas, para se ser sério sobre a reforma administrativa, não basta falar de aplicar a lei que já existe nas empresas públicas municipais, diminuir vereadores ou fundir freguesias, é essencial definir a cada nível, no Estado e nos serviços públicos, as fontes de receita (com clareza e transparência assegurada) e as competências (sem sobreposições).
Sobre o que menos interessa, gosto da proposta de Tiago Azevedo Fernandes para o Município do Porto, ainda que Aldoar não seja a Foz, a Baixa tenha um lado oriental e outro ocidental, o Centro Histórico seja muito diferente junto ao Douro e numa colina (Sé) ou na outra (Vitória) e os nomes dos lugares tenham um valor identitário e de relação das pessoas com a sua memória que vale muito mais que alguns euros de senhas de presença em assembleias municipais ou de vencimentos de presidentes de junta… Mas, se se pretende aumento da eficiência e descentralização, muito bem. A proposta de Tiago Azevedo Fernandes pode ser base para debate entre representantes da população. Se é apenas para troikar (ou, quem sabe, ir além), acho que a coisa tem o nível da poupança em gravatas no Ministério do Ambiente, ou dos bilhetes de avião do PM. E, por favor, digam lá que competências e que meios pensam que as freguesias podem/devem ter. E, se possível, comecem por cima e pelo essencial: que meios e competências devem ter as áreas metropolitanas e as comunidades intermunicipais? O que sobra para os municípios? O quê e como é descentralizado? O quê e como é centralizado? O quê e como deixa de ser do Estado e passa a ser propriedade ou de gestão privada?