De: Pedro Figueiredo - "Escalas erradas 2"

Submetido por taf em Quinta, 2010-06-17 23:15

É bem pertinente a apreciação negativa que o Alexandre Burmester faz do "novo" edifício a agigantar-se na encosta mais proeminente de Vila Nova de Gaia. É de facto um exemplo de vários problemas urbanísticos e mentais que subrepticiamente tendem a considerar-se pela opinião pública mal ou não informada de todo como situações "normais" e aceites. Não será tanto a questão da volumetria. Eu até aceito a escala deste edifício (Hotel Yeatman), como aceito que alguns edifícios de carácter excepcional fazem sentido enquanto tal, excepcionais e proeminentes: o Paço Episcopal, a Torre dos Clérigos, a Cooperativa dos Pedreiros.

Ora, não é o caso, aqui. O que faz falta aqui, é Qualidade. É uma arquitectura de "pastiche", aparentemente sem uma linguagem assumida, nem contemporânea, nem antiga de todo (não me lembro de ter alguma vez visto algum edifício mesmo neoclássico - com frontão - e tudo com esta tipologia tipo "empreendimento algarvio às escadinhas - terraços com vista para...). É uma pirâmide género zigurate, mas sem zigurate nem pirâmide, nem o contexto que a justifique. Não possui a qualidade necessária para eu a aceitar como elemento digno de excepção. Acho que em democracia, qualquer um tem o direito a ter opiniões estéticas, mesmo quem não tenha formação artística. E também temos o direito de críticar, logo a seguir. Os arquitectos também enquanto cidadãos com interesses na matéria podemos fazê-lo, criticando os colegas, com a propriedade e rigor que nos seja possível.

Outra coisa ainda: Cada vez mais se vê que os arquitectos que trabalham para câmaras municipais não fazem verdadeiro serviço público, ou seja, tendo como referente a Qualidade da Arquitectura - grosso modo e com todas as divergências aceitáveis... Mas sim, cada vez mais, os que de nós vão sendo contratados pelos municípios tornam-se "técnicos" (...é aliás esta a designação oficial, e não a expressão "arquitectos", a expressão que é usada pelo função pública) ao serviço do cumprimento estrito, estreito e restrito dos regulamentos, normas, leis, planos, etc... E tudo muito bem, assim é que tem de ser, a lei tem de se cumprir. Cada vez mais a questão é outra: a questão é mesmo fazer Arquitectura "apesar da lei" de e "com a lei" e que seja Arquitectura, e aprovada com "aquela" qualidade, chamemos-lhe "com estética" seja isso o que for (polémica!). No limite, se eu pudesse, enquanto técnico ao serviço do município, deveria ter reprovado este projecto, porque apesar de ele cumprir (!) todos os regulamentos camarários e legais em vigor, ele não cumpre o que deveria cumprir: ser um bom projecto de Arquitectura. Mas isto os legalistas de todas as cores políticas e arquitectónicas não conseguem perceber.

Pedro Figueiredo

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Nota de TAF: "The Yeatman has been considered as a PIN Project (Project of National Interest) by the Portuguese government"; "O projecto de arquitectura foi realizado pelo Arq.º Vítor Miranda". Pelas imagens que vi, aquilo é mesmo muito mau... Muito me espanta que o promotor de um empreendimento com esta ambição possa fazer uma obra (não encontro outro termo) tão parola.