De: Pedro Figueiredo - "IRS e IRC: tributar o que tem de ser tributado para distribuir o que tem de ser distribuído"
Concordo bastante com a opinião de José Ferraz Alves sobre a ineficácia dos chamados Grandes Investimentos Públicos na resolução das crises. Julgo ser praticamente senso comum que muitos pequenos investimentos beneficiam um maior número de pessoas do que poucos e grandes investimentos. E com a vantagem acrescida de cada pequeno investimento precisar de menos capital impulsionador e menos estrutura pesada para se suportar e evoluir. E este pensamento tanto será válido para o investimento de Estado como para o investimento Privado.
1 – Relativamente ao abuso do crédito como causa de ruína das nações: Julgo não estar errado ao citar o economista Adam Smith ao dizer qualquer coisa como “O capitalismo vive do crédito, mas perde-se com o abuso do crédito”. Aparentemente esta quase contradição será um paradigma da economia livre de mercado. E de facto o crédito às empresas aparentemente possibilita a muito mais empresas a obtenção de capitais que lhes permitem entrar no jogo do mercado, suprindo a sua falta. E o crédito a particulares permite a muitos indivíduos consumir, apesar de não terem dinheiro para tal, alimentando a parte “de consumo” da sociedade que alavanca todo o resto do sistema (a parte “produtiva de coisas e serviços”).
Onde é que temos neste sistema económico o reverso da medalha que se tornou por estes dias visível para todos? O reverso da medalha são dois reversos: o crescimento desmesurado do capitalismo financeiro (com e sem regras que alimenta com ou sem dinheiro real toda esta economia real) e a manutenção ad aeternum do sistema de baixos rendimentos que mantém a microeconomia dos Portugueses dependente do crédito para as suas necessidades, e não apoiada em real crescimento de rendimento próprio para a supressão destas mesmas necessidades. Pois claro que, se os salários se mantêm baixos, continuaremos a necessitar de crédito. E não estou aqui a falar de luxos como crédito abusivo para viagens ou outros luxos. Não tenho visto muitos economistas a defender um aumento real dos salários/rendimentos como factor de crescimento da economia... Creio que é perfeitamente possível porque as mais-valias da produção industrial dão perfeitamente para serem reinvestidas em maiores salários. Para tal, o motor do capitalismo teria que deixar de ser o lucro máximo dos accionistas e patrões (utopia?). Terá de ser – espantêmo-nos – dar lucro a quem produz! (Espantoso, não é? Como isto faz tanto sentido aqui mesmo à nossa frente...).
2 – Relativamente à redistribuição através dos impostos, é essa uma maneira de “entretanto” irmos corrigindo as desigualdades que o sistema económico irá todos os dias continuar a fazer. Todos os dias o sistema (Estado e empresas) gera desigualdades / todos os dias o sistema (Estado) corrige essas desigualdades. E portanto as mudanças económicas de fundo serão sempre adiadas (correcção económica de base, na estrutura das empresas, na cooperação dentro das empresas, na auto-gestão, na distribuição igualitária da posse das coisas, das máquinas, dos sítios, dos edifícios, dos ganhos, etc). Enquanto adiarmos ano após ano a correcção do sistema económico a favor de quem trabalha, teremos sempre de alimentar um Estado que redistribui através de IRS, IRC, etc. na melhor das hipóteses. Só que, para mim, esta melhor das hipóteses é afinal a mínima hipótese. É a diferença base entre uma Social-democracia e um Socialismo Marxista de base.
3 – Relativamente à multiplicação dos micro-investimentos para gerar um efeito de saída da crise, eu subscrevo, José Ferraz Alves, e acho que se deverá ter um modelo público para gerar múltiplos micro-investimentos na reconstrução dos centros históricos das nossas cidades. Dinheiro público que seja investimento directo do Estado criando economia e gerando procura para as empresas privadas. Investimento público que gera investimento privado, portanto. Colocarmos dinheiro público injectado em programas que fazem a ligação ao reanimar do sector da Construção (agora com pequeno investimento, casa a casa, não enormes investimentos imobiliários arriscados ou ruinosos) e que junte este “útil” de reanimação económica ao “agradável” que é a tão necessária reabilitação urbana.
Aproveito para criticar uma vez mais – e não sou o único arquitecto a fazê-lo – a actuação da SRU do Porto, que faz reabilitação de fachadas com custos elevadíssimos porque o faz usando a unidade quarteirão a quarteirão – que será porventura uma unidade mais fácil e proveitosa para um Grande Investimento Imobiliário, mas não se integrando portanto neste conceito de multiplicação de micro-investimentos urbanos. E, já agora, que reabilite - com inteligência e sensatez- também os interiores dos edifícios. Não gera economias que nos façam sair da crise. Não proporciona o realojamento de habitantes da zona porque pratica preços de investimento especulativo. Não reabilita cidade porque destrói para sempre a unidade casa urbana ao desligar para sempre o miolo do edifício da fachada. E isto não se faz nem ao nosso pior inimigo.
Pedro Figueiredo