De: José Ferraz Alves - "O IRS, não o IRC"
Miguel Sousa Tavares, do meu ponto de vista, esteve exactamente no cerne para a resolução dos problemas com que nos debatemos, ao questionar a política de obras públicas do Governo, que vai apenas conseguir injectar fundos em empresas que atravessam dificuldades financeiras, que com isso, em parte, vão reduzir os seus níveis de endividamento junto da Banca, que só os irá re-injectar na economia via crédito, se o fizerem, suportado por garantias do Estado, ou seja, dos próprios devedores. Mas não é o IRC que deverá mexer, porque por aí só vai aumentar os dividendos e as contas bancárias no exterior de accionistas diversos. Não desmultiplica o dinheiro. A resolução passa pelo IRS. Reforço, os empreendedores precisam de clientes não de credores. Ou seja, a retoma seria mais rápida se dinamizados os clientes, a procura, pelo efeito do aumento do rendimento disponível. Isso consiste em baixar a taxa de IRS.
Entendo que poucos perceberam o cerne da actual crise financeira internacional e que, por isso, não a estão a atacar no seu ponto certo. John Kenneth Galbraith, a propósito da crise de 1928, colocou a desigualdade na distribuição de rendimentos como sendo a sua principal causa. O problema não era o consumo, mas existirem poucos consumidores, o que tornou a economia dependente de um alto nível de investimento ou de um elevado nível de consumo de bens de luxo, ou de uma composição de ambos. O capitalismo moderno tentou resolver o problema através do crédito. Mas a solução passa necessariamente pela correcção real das desigualdades na distribuição de rendimentos. Numa sociedade onde a riqueza é melhor distribuída, esta circula melhor. Mais vale entregar migalhas a milhões, do que muito a poucos.
Considero que a própria origem desta crise não está no acesso ao crédito. Não se podem assumir alguns dos comportamentos desviantes a este nível como a regra geral. Mas que a sua razão está na queda do rendimento disponível das pessoas. Então, há que combater esta queda do rendimento disponível das pessoas. Das tais pessoas que se constituem em Estado, em empresas, em contribuintes… Que são o princípio e o fim de tudo o que existe no mundo. Aumentando-o em termos globais, em ritmo superior ao do crescimento da quantidade de pessoas. Procurando sistemas multiplicadores, distribuidores e indutores de impactos no maior número possível de agentes. Ou seja, por exemplo, em vez de se aplicarem 500 mil euros directamente na reabilitação de cinco edifícios da Baixa do Porto, entendo preferível apoiar 20 projectos de micro-geração, no valor unitário de 25.000 euros, que depois proporcionam em cada casa uma renda mensal de 250 euros, capaz de suportar um financiamento de 75-100 mil euros. Em vez de cinco casas, reabilitam-se vinte.
Isso seria atacar a crise financeira pelo seu âmago, o que não foi feito. Não deveriam ter sido os Bancos a receber a capitalização dos fundos, mas directamente os incumpridores, de forma a injectar os meios no ponto onde escasseavam. E, é verdade, falta dinheiro na economia. Porque é necessário que circule de forma multiplicadora. Há um específico projecto, que já deveria ter sido aplicado na Baixa do Porto, para que tal se concretize.
José Ferraz Alves
Rede Norte