De: José Ferraz Alves - "O empreendedorismo e os clientes"
A solução está mais nos clientes e menos nos credores bancários… Na economia, menos nas finanças… Na micro-economia, menos na macroeconomia. E em pequenas acções, não em megalomanias… Em trazer o poder de decisão, o público mas também e sobretudo o privado, de volta para centros urbanos fora de Lisboa… E em procurar as solução dentro de nós, no que é nosso, e não fora. Passo a justificar-me, dado que entendo que são mais importantes e mais necessárias as pequenas acções, que fogem muitas vezes aos primeiros decisores das organizações empresariais.
Tenho tido a oportunidade de visitar algumas iniciativas para a incubação de novas empresas, no domínio do empreendedorismo social, tecnológico e artístico. Também entendo estas apostas como um dos mais válidos e frutuosos caminhos para sairmos da situação de falta de criação de riqueza no país e que se sente sobretudo na Região Norte, mais deixada a uma solitária capacidade de autonomia na resolução pela iniciativa privada dos seus problemas, do que ancorada nos impostos que são colocados à disposição das empresas públicas e dos monopólios e oligopólios privados que se constituíram nas últimas duas décadas. E não me estou a referir aos investimentos públicos, mas à capacidade desses impostos fazerem encomendas, de serem clientes. Esta distinção, para mim, é crucial. De momento só existe um cliente no país, o Estado, em Lisboa.
Ou seja, todos os projectos, sem excepção, que tenho visitado, querem simplesmente vender, querem clientes. E estas iniciativas, de simples “jingles musicais”, conteúdos para a televisão, reciclagem de materiais, brindes, restauros, mais importante do que a visita de um Presidente do Conselho de Administração e dos seus parabéns, querem é a do Director de Marketing ou de Aprovisionamento que lhes possa fazer uma encomenda de 2 ou 3 mil euros para poderem pagar depois a ida ao supermercado e a escola dos filhos.
Podemos oferecer excelentes cursos de aptidão para o empreendedorismo na EGP, Católica ou até no INSEAD, claro. Se quisermos dotar quem já tem o espírito de risco e de mudança de burocracias técnicas que só os vão desviar do essencial. Ou concluirmos, como já verifiquei, que a melhor escola para muitos dos actuais empreendedores foram os escuteiros ou as associações humanitárias ou mesmo religiosas em que participaram aos 12/13 anos, como a recente dinamização de Taizé nas ruas do Porto mostrou. Só duas perguntas, é para fazer ou para se dizer que se faz? Uma responde aos anseios de grandiosidade dos seus promotores, a outra, à efectiva necessidade dos seus destinatários. Claro que há muito prestígio associado a estas Escolas, mas ainda ficam longe do essencial, pelo que é preciso outra abordagem.
Melhor, muito melhor, a recente acção da vereadora da Câmara do Porto Guilhermina Rego no seu projecto Educação para os Valores, e é isso que entendo dever pedir-se aos decisores públicos. Claro que é já uma das senhoras que mais força vai ter de ter, porque vai continuar a ser das mais atacadas pelo nosso espírito mesquinho que se confunde com os que procuram fazer.
Pomo-nos a culpar o que os decisores da PT, CP e outras andam a fazer e não vemos que essas práticas são também correntes em quase todos nós. Como querem que as novas empresas sobrevivam e novos empreendedores surjam sem quererem pagar pelos seus serviços? As grandes empresas têm milhões de orçamentos publicitários para campanhas publicitárias nos grandes canais TVI, RTP e SIC e depois acham pouco prestigiante pagar ao Porto Canal, à RTV, ao Semanário Grande Porto, mil euros mês para o mesmo serviço, dado que não é o seu target de notoriedade. Qual, o do seu umbigo ou o de efectiva chegada aos seus destinatários? E depois são capazes de telefonar a pedir emprego para os seus filhos que viram em cursos de jornalismo ou de artes a felicidade para as suas vidas. E como é que estes projectos vão pagar aos seus colaboradores, quando anda tudo pelo país fora a pedir favores e baldas a torto e direito? Só mesmo recorrendo a vias menos claras. O curioso é que ninguém paga os tais 500 euros pela entrevista, mas depois pedincham se o canal ou o jornal lá vão à festa de inauguração da expansão das suas instalações. E o que dão em contrapartida, como querem que se viva?
O que peço? Que se pague e que se deixem de pedir borlas. O justo e necessário. Que se diversifiquem essas despesas, que se privilegie o pequeno e mais próximo, que se seja cliente das empresas que estão, por exemplo, a desenvolver-se no HUB do Porto ou em IN Serralves. Que os Directores de Marketing e de Aprovisionamento das Empresas, que são quem decide para onde vai o cheque, e que geralmente têm maiores orçamentos em gabinetes de Lisboa, deixem de ter medo de arriscar e comprem a novos empresários, que a responsabilidade social que os CEO’s colocam nos seus relatórios de sustentabilidade seja monitorizada dentro de casa, dando liberdade a esses Directores para fazerem encomendas. Que empresas como a RAR, Sogrape, COLEP. Amorim, SONAE deixem de procurar os empreendedores nos jardins de Serralves, nos salões de Vidago Palace ou em Fontainebleu e que olhem para dentro de portas e vejam se não têm muito empreendedores que estão escondidos e perdidos pela mesquinhez das estruturas hierárquicas. CEO, para mim, é ser isto. Humilde e prático quando tem de ser. E cumpridor. Que combatamos os malefícios do centralismo público e privado a que conduzimos o país, em que os salários são os mais baixos da Europa e os preços dos serviços (energia, comunicações, portagens, banca) os mais elevados.
Vou repetir algo que já tinha dito no Palácio da Bolsa a propósito de um seminário sobre Finanças Públicas da Descentralização, promovido pelo Dr. Miguel Cadilhe: “De acordo com estudos efectuados na Suécia, EUA e Brasil, mostrou-se que a grande obra pode custar menos 30% a 50%, se efectuada por troços menores (pelo efeito da competitividade). Concluiu-se que, quanto menor o troço, menor o custo por km. Há números para se poder concluir o que se passará em Portugal? (quando se refere o caso de estradas, também se poderia falar de aeroportos, portos, barragens, etc.). Pergunta sem resposta: quais são os reais custos das grandes obras? Pergunta que deveria ter resposta: os lucros devem ser baseados na eficácia ou no monopólio? Uma concessionária em Portugal, por exemplo, tem bons lucros, baseados não na eficácia, mas no monopólio. Trinta pequenos empresários são menos eficientes e, mesmo assim, com as mesmas tarifas, dão mais lucro, sendo algo que ninguém quer publicitar por desconhecer os reais custos das grandes obras.”
José Ferraz Alves