De: Rui Valente - "Esclarecimentos"

Submetido por taf em Quinta, 2006-07-06 18:21

Caro Miguel Oliveira

Por ausência do país, só hoje posso responder ao seu comentário.

Sendo (como refere) um jovem apaixonado por urbanismo, consigo compreender um pouco melhor a distinção que faz entre cidades e pessoas, mas pode ter desde já a certeza que umas não são nada sem as outras. Sem as pessoas, as cidades não são nada, são mausoléus sem vida nem história. Se calhar, é esse o mal de que padecem alguns arquitectos da nossa praça quando projectam algumas obras, como foi o caso da remodelação tristonha e pobre da Avenida dos Aliados...

O fair play com que inicia o seu post é logo contrariado pelas afirmações que faz a seguir, insistindo em sentir-se "confuso" com a ideia que tem dos portuenses serem anti-lisboetas. Se há algum ressentimento dos portuenses em relação a Lisboa, é acima de tudo devido à concentração quase absolutista da política que a partir dali se desenvolve, do que aos cidadãos da capital (somos todos portugueses) que, tal como diz (e bem), também acabam por ser prejudicados por essa estratégia estúpida e (essa sim) germinadora de focos de desagregação nacional. Depois, essa imagem é também transferida para outras áreas da nossa vida, como será o caso do futebol, onde a "tal" comunicação social se encarrega de potenciar rivalidades clubistas em vez de as atenuar. Tudo isto (sabemos) em nome das audiências, em obediência ao vil metal.

Vejamos: procure fazer um pequeno exercício, invertendo as suas origens e encarando este tema com alguma seriedade. Acha realmente que os portuenses quando reinvindicam do governo um pouco mais de atenção - tendo em conta que somos a segunda cidade do país - o fazem por inveja ou (como já escreveu) por terem complexos em relação à capital? Sinceramente, acredita mesmo nisso?

A questão não está (como diz) em criticarmos qualquer obra que se faça em Lisboa - elas devem ser feitas por todo o país -, mas sim por provocarem sistematicamente a secundarização e até a anulação de obras há muito necessárias para o Porto, e é isso que está errado. Alguma vez ouviu algum portuense insinuar (mesmo por brincadeira) a mudança de local da capital? E admitindo mesmo que alguém por graça o tenha reclamado, seria capaz de o levar a sério?

Quanto às televisões, reitero a minha convicção do pleno sentido em continuar a falar do tema, pelo menos enquanto as coisas continuarem desiquilibradas.
Sem se dar conta, às tantas, é por influência da própria televisão, que tem essa ideia pré-fabricada sobre os portuenses. Repare que o Miguel contestou a minha opinião sobre o assunto, alegando como comprovativo a emissão do Jornal da Tarde da RTP e a RTPN, esquecendo-se de referir o principal que é o aspecto da autonomia e controle que é feito a partir de Lisboa, nomeadamente o da sua Direcção Informativa. E não irá decerto desvalorizar a importância deste pormenor.

Relativamente à Invicta TV, apesar de dispor de TV Cabo (e nem toda a gente ainda dela beneficia), não a conheço sequer, e talvez esta revelação por si mesma seja bastante para perceber a dimensão do problema.

De resto, corroboro tudo o que o TAF aqui escreveu quando decidiu fazer-nos companhia. É sempre bem vindo quem vier por bem, sejam quais forem as suas origens.

Cumprimentos
Rui Valente

PS- Caro F. Rocha Antunes, não quero acreditar na sua teoria sobre aquilo que chama as nossas "manias", porque nem eu jamais tive a presunção de (como diz), erguer o Porto aqui, ou em qualquer outro sítio, nem o meu amigo decerto estará convencido que o "resolve" (o Porto) com os edifícios que vende.
Como aqui acima referi ao Miguel Oliveira por outras palavras, há mais vida para lá do betão. A vida de uma cidade é uma coisa multifacetada, interessando-me tanto as obras que se vão fazendo como as ideias (vulgo projectos) que as concebem.