De: António Alves - "Federalismo"
Caros TAF e outros,
Nesta discussão sobre os partidos regionais parece-me que estão a pegar no assunto pelo lado errado. A existência ou não de um ou mais partidos regionais, e de partidos nacionais que defendam o regionalismo, não é verdadeiramente a questão. Mesmo a defesa da independência do Norte (será mais secessão, porque independentes já somos desde os tempos do senhor dom Afonso) não é o ponto, embora a ideia não me repugne nada, e cada vez mais me convença que o tempo, a inacção e o autismo dos agentes políticos institucionalizados, levará a que tenha cada vez mais adeptos. O ponto é: mudar o sistema; mudar a arquitectura do estado português; acabar com o estado unitário; construir um edifico de cariz federalista. Este é o único caminho capaz de satisfazer os objectivos de conservar a unidade e coesão nacional com os anseios de autonomia, governo próprio, desenvolvimento económico e social, justiça e equidade na aplicação dos activos gerados pelos impostos cobrados aos cidadãos das várias regiões. O que não é o caso actual, pois como sabemos a nossa região, apesar do estado lastimável em que se encontra, ainda é chamada a contribuir para pagar investimentos (alguns megalómanos, inúteis e obscenos, como o país inteiro ser chamado a pagar a recuperação da frente ribeirinha lisboeta, com a astronómica verba de 400 milhões de euros, quando, por exemplo, esta cidade do Porto faz um esforço enorme (e aqui honra seja feita a Rui Rio, mesmo não concordando em muitos aspectos da metodologia) para recuperar a Baixa e o Centro Histórico praticamente às suas próprias custas.
Este sistema de cariz federalista acolheria, logicamente, partidos de cariz nacional e de cariz regional. Estes últimos concorreriam às eleições da sua região, autonomia, província, comunidade autónoma ou estado federado, a taxonomia é indiferente, e também às eleições nacionais se assim o entendessem. Ou até a duas ou três regiões simultaneamente. Nada impediria que um partido regional pretendesse representar o povo de, por exemplo, toda a realidade sociopolítica a norte do vale do Mondego. O mesmo se aplica, inversamente, aos partidos nacionais: só concorreriam a uma determinada, ou a várias, e mesmo a todas as eleições regionais, se assim o pretendessem.
O sistema de representação nacional deveria ser constituído por duas câmaras: a primeira eleita por círculos uninominais onde caberiam partidos nacionais e regionais, e por um circulo moderador nacional ao qual apenas concorreriam os partidos de cariz nacional; a segunda, paritária, uma espécie de senado, representaria de modo igual as várias partes do conjunto. Ao estado central caberiam preferencialmente funções de representação nacional, defesa, administração de um sistema de justiça único, segurança social única, projectos de infra-estruturas inequivocamente de cariz nacional e funções de orientação macroeconómica, embora estas últimas já estejam muito mitigadas e residam actualmente em entidades supranacionais. O seu financiamento corrente seria suportado pela riqueza criada pelas regiões numa percentagem ponderada pelo produto e pela dimensão da população. As regiões contribuiriam também para um fundo comum destinado a fomentar a coesão nacional desenvolvendo as que possuem maiores carências. Tudo o resto ficaria a cargo das diferentes autonomias, incluindo o sistema de ensino, com a excepção do superior, que é autónomo, e seria suportado tanto pelo estado central como pelos estados regionais.
Para isto é necessário mudar a actual constituição. E como se faz isso? Pela força. Pela força dos votos ou das armas (parece que nos últimos tempos, uns tipos – que possuem armas - andam a ameaçar fazê-lo, mas por razões diversas) . Nós (os que se revêem nestes objectivos, obviamente) devemos fazê-lo pela força dos votos. Para isso precisamos de um partido/movimento organizado e com meios. E esse partido/movimento regional nem sequer, na fase inicial, precisa de ir a votos, porque até, à partida, está impedido de o fazer. Só precisa de ter força. Ser mobilizador. Constituir-se claramente como uma forte ameaça ao sistema vigente. Nesse cenário o sistema acabaria por ajustar-se. Não há nada mais darwinista, i.e., adaptável, que um sistema político ameaçado de ruptura. Caso contrário, ruiria estrondosamente e um totalmente novo emergiria. Também acontece.
O TAF num ponto tem razão: uma das vias possíveis será mudar o sistema a partir de dentro; a partir dos partidos nacionais. Não acredito muito que tenha sucesso, e sou capaz de fundamentar empiricamente, se necessário, esta minha descrença, mas poderei estar errado.
António Alves