De: Nicolau Pais - "«Lisboa» Agradece"
Não pode o Presidente da Câmara Municipal do Porto ler, com certeza, a carta de Teresa Stillson, ocupado que estava a "marcar passo" com a sua presença nas marchas populares de Lisboa.
Lisboa agradece. Agradece que sejam aqui (re)alojados os empresários do entertainment em condições de luxo, já que não consegue tomar conta do seu Parque Mayer; Lisboa agradece que não se reivindique financiamento para recuperar o Bolhão e que este seja entregue de mão beijada sob o augúrio das novas tendências de (des)governação; Lisboa agradece "pouca bulha" sobre o Metro do Porto, enquanto os custos do seu congénere alfacinha disparam mais de 60%; Lisboa agradece que para aqui não se atraia nem investimento privado nem mercado de trabalho, pois assim pode "receber de braços abertos" uma geração inteira de trabalhadores jovens e qualificados que lá fazem a sua semana a preços de saldo, antes de voltarem "à paisagem" de onde vieram; Lisboa agradece que a imagem externa do Porto seja a de um resort pitoresco ao invés de um pólo científico, económico e cultural impositivo por natureza, capaz de justificar o óbvio: que é bom investimento para o Estado para aqui canalizar verbas (e também da mais elementar Justiça); Lisboa agradece que o debate sobre a regionalização fique por umas conversas de mesa de timing inócuo e legitimidade duvidosa; Lisboa agradece que não se coloque à mesa nenhuma estratégia concreta de investimento para a região, que é no fundo meio caminho andado para que equipamentos como o Aeroporto Francisco Sá-Carneiro se tornem estrategicamente redundantes e venham daí mais uns milhões para um faraónico aeroporto a Sul; Lisboa agradece que se faça tábua rasa das estratégias e sinergias criadas durante a década de 90 - o "caso do Porto" começava a destapar muita careca. Lisboa agradece que o Presidente da Câmara Municipal do Porto seja mais um político de carreira, que esses Lisboa sabe "tratar" e "receber"; alguma Lisboa agradecerá até que se tenham perdido mais 30.000 habitantes nos últimos 7 anos, com o que isso implica demograficamente e em termos de massa crítica (Lisboa não gosta, por "tradição", de massa crítica com implantação "no Norte"); esta Lisboa agradecerá as taxas de abstenção dementes com que hoje se elegem Presidentes de Câmara, porque a não-legitimidade convém sobretudo aos irresponsáveis; mas Lisboa agradece, sobretudo, que o Porto não meta medo.
Pode ser que António Costa cá ponha os pés para o nosso São João; ver para crer. Nessa noite, enquanto a bordo do habitual barco cavaqueia com Rui Rio sobre a "beleza" e a "utilidade" de festas "tão populares" que é preciso "preservar", pode ser que algum dos dois perceba que são aqueles os milhares que atentamente, os observam; e que é para aqueles milhares que trabalham, pois são aqueles milhares que contribuem para lhes pagar o salário.
Nicolau Pais.
PS- Neste post a palavra "Lisboa" (como as aspas do título pretendem declarar) surge como representativa do Poder&Vícios lá instalados, e não dos seus habitantes, também eles legítimos apaixonados pela sua Cidade tantas vezes abandonada pelos seus autarcas. Tenho defendido que esse poder não é malévolo ou qualquer outra coisa estranha, mas sim o resultado do vácuo político que, com a inconsequência de medidas populistas, se vai criando nas outras Regiões; perde-se assim a ferramenta essencial à legitimação pública das reivindicações: o Carácter. Sem ele, estamos a governar/reivindicar em "Excel" e isso só pode ser vantajoso para quem "passa os cheques".