De: Nicolau Pais - "O Exemplo do Interior"
Embora concorde com a visão geral por detrás do último post de Cristina Santos, penso que só lapso ou precipitação a poderão ter levado a conotar Viseu com a cultura de shoppings. Claro que Viseu não está imune a esta praga desactualizada e ao bacoco modelo de desenvolvimento imobiliário que a sustenta; mas sugerir que de alguma forma devamos "mandar" a praga para lá (ou Vila Real) é redutor e merece, se a autora mo permite, reparo.
Viseu é uma cidade cuja qualidade de vida está hoje no "top" português, conforme o recentemente publicado estudo da Deco revelou, e cujos anos de pós 25 de Abril têm servido para a "par e passo" construir um distrito que, por via do subdesenvolvimento Salazarista, ostentava na década de sessenta números de 3 em cada 100 nados-mortos e 60% de analfabetismo. Foi há pouco tempo, mas tudo melhorou:
- - A qualidade do seu primoroso centro histórico (onde pautam Museu Grão Vasco, Sé e Igreja da Misericórdia), animado e recuperado.
- - O seu Teatro Municipal (o Viriato), dirigido por um dos mais cobiçados coreógrafos do País com reconhecimento internacional (falo da Companhia Paulo Ribeiro). Foi também uma obra de recuperação, batalhada através de duas gestões autárquicas de "cor" diferente.
- - A vitalidade do seu comércio - veja-se as Ruas Formosa e do Comércio, entre Rossio e Centro Histórico, e sobretudo a auto-estima que nos legam.
- - A politica de primazia aos peões - veja-se a quantidade de ruas exclusivamente pedonais ou a fantástica inserção de espaços verdes em pleno centro, como o Parque da Cidade onde não consta que vá Sport Club nenhum construir coisa nenhuma.
- - A recuperação pelo arquitecto Siza Viera do Mercado e as novas valências a ele associadas - nada de parkings ou shoppings, mas, precisamente, cafés, esplanadas e livrarias.
- - O cuidado esmerado com passeios, arruamentos, saneamento, edificado, enfim, tudo aquilo que uma cidade civilizada deve assumir como gestão corrente: em Viseu, como no Porto, não gostamos de ter as pérgolas a cair e muito menos de lixo nas ruas.
- - O apoio dado pela autarquia às transportadoras públicas em parcerias público-privadas equilibradas e consequentes.
- - A gestão urbana de estacionamento - Viseu foi uma das primeiras cidades a introduzir parquímetros.
- - A esperança de uma Candidatura a Património Mundial, enquanto alguns ignoram o que já têm.
Isto entre muitas coisas que se poderiam enumerar para "driblar" a sobranceria do Litoral. Fica o desejo de que a derrama e os habitantes continuem a crescer, com a fixação do tecido empresarial e de quadros médios que poderão inclusivé, a muito curto prazo, permitir a opção por aquela cidade àqueles que, como eu, não têm escolha senão pelos grandes (ou ditos "grandes") centros urbanos.
Cara Cristina, já foi tempo em que se faziam 3 horas de viagem em agonia de contracurva para vir pasmar ao Brasília ou ao Dallas; dentro do que uma "cidade do interior" de um país como Portugal pode crescer, Viseu "dá aulas" - e nem sequer tem Mar! Conheça Viseu, e se puder leve em visita guiada e de estudo os autarcas do Grande Porto.
Nicolau Pais
PS - Três notas:
- - O mesmo estudo indica Lisboa, Porto e Setúbal como as cidades que menos agradam aos seus habitantes.
- - Há já muitos anos que o Porto é tido e respeitado em Viseu como uma cidade exemplar e única sendo que números recentes indicam que muitos jovens preferem hoje a Invicta como cidade universitária, preterindo, por ex., Coimbra.
- - Já aqui explanei em diversos posts a minha admiração incondicional pelo Porto e não gosto de "tomar a nuvem por Juno": a minha estadia de quase 11 anos no Porto tem-me ensinado que por debaixo dos escombros da emoção/opinião está sempre a Verdade.