De: Daniel Rodrigues - "Ainda o excesso de Zelo, e o Regresso ao Rivoli"

Submetido por taf em Sexta, 2007-10-12 18:45

Cara Cristina Santos,
"podemos dizer que esse crime está previsto na lei, mas ao caso não se aplica. Exigir que as leis sejam levadas à letra pode ser perigoso"

A mim parece-me perigoso considerar que as leis não sejam levadas a letra! Concordo que deva existir bom senso, e neste caso, pareceu-me existir toda a paciência do mundo para com artistas habituados, infelizmente, a toda a compreensão do mundo... O cidadão comum (e parece-me que muitos dos intervenientes no blog estao cada vez mais distantes dos cidadãos comuns), está cada vez mais farto de artistas impulsivos: acções impulsivas são bem antagónicas em relação a característica construtiva que mais é necessária nos dias de hoje.

O Porto, ao contrário do que diz, não tem como sua característica cor. Tem as cores graníticas, sem dúvida diversas (mica, feldspato, quartzo), mas cinzentas, duras, viscerais. O Porto não tem diversidade: o Porto aceita a diversidade, desde que as pessoas se adequem a um determinado tipo de valores: honra, respeito pelo próximo, verdade e determinação. Se vir o Porto pelos olhos de alguém exterior ao Porto apercebe-se que este traço é distintivo: o Porto é uma sociedade fechada em si: acolhedora, mas que distingue quem está dentro dela ou lhe é estranho. O Porto não exclui, integra, é verdade: conforme disso, desde que as pessoas se adequem a certos valores básicos. E porventura devíamos reflectir nisso como um dos factores para a perda da nossa força: neste blog, o que mais tenho lido são lamentações, frustrações, críticas insustentadas. Em vez de ver reflexão, resultados, construção. Essa mudanca de valores passa por comecar a mostrar uma imagem que reflicta aquilo que o Porto sempre foi. E o Porto nunca foi impulsivo. Nunca chegou ao fim de um espectáculo e envolveu o resto do público numa acção porque sim. O Porto sempre construiu, passo a passo, pedra sobre pedra, geração para geração. O Porto nunca foi uma cidade de elites, foi uma cidade em que as elites e o povo comungam de propósitos comuns.

Eu não entendo, sinceramente, porquê esta postura de 'fim-do-mundo'. O Rivoli foi entregue 5 anos ao Filipe La Feria? Então e o Rivoli não tem quase 100 anos? Quantos destes não esteve ao abandono? Não sera um ciclo necessário? Gostava sinceramente que em vez de pensar que o Rivoli enquanto o conhecemos acabou, se pensasse o que se poderá fazer para melhorar o Rivoli depois destes 5 anos. Para quem se quer perder em lamentos, 5 anos serão 5 anos perdidos. Para outros, será o tempo de fermentar ideias inovadoras, e daqui a 5 anos voltar com a energia para projectos mais aliciantes e mobilizadores que o de Filipe La Feria. Nao sei se o wikipedia está correcto, mas indica-se lá que apenas a partir da decada de 70 o teatro pertence à CMP, e esteve fechado entre 1992 e 1997. Ora, podemos pensar que é uma oportunidade de construir uma parte da história do Teatro Rivoli! Quem sabe não será uma fórmula de sucesso, para devolver a sala ao Povo do Porto?

Por isso convidava todos os leitores a fazerem essa reflexão: afinal, que valores queremos defender para o Porto? A cidade é o reflexo de quê? Acho que devemos distinguir o que é de facto construção da cidade, e o que são fait-divers.

Felizmente este blog congrega tudo ;) E por isso tenho seguido atentamente a discussão sobre coisas bem mais essenciais, como as novas vias, as leis de reabilitação urbana (já agora, depois de fazer as leis melhores, elas nao vão ser para cumprir, cara Cristina?), os projectos estruturantes para o Porto. Sinceramente, acho que se está a perder tempo e energia a mais com coisas pontuais, quando se podia aproveitar a potencialidade deste blog como o canal de comunicação mais directo com o Executivo da Câmara Municipal do Porto, para passar ideias e sugestões mais vivas, práticas e concisas. Vivas, práticas e concisas, como o Porto é: nobre, leal, invicta.

Melhores cumprimentos,
Daniel Rodrigues