De: F. Rocha Antunes - "Pregar na cidade"
Caro Rui Valente
A cidade é feita de cidadãos. E isso significa bem mais do que governantes da cidade para um lado e governados inconformados por outro. A cidadania implica participação nos assuntos da cidade, da forma que cada um achar que pode e consegue. E tal como tudo o resto, as formas de exercer a cidadania estão em profunda mutação.
Eu não escrevo aqui com a preocupação de medir se os responsáveis políticos tomam nota das ideias que alguém aqui transmite, mais ou menos pormenorizadamente. Escrevo aqui porque sinto a necessidade de partilhar e discutir regularmente assuntos que me importam. Se calhar, a parte mais importante é o tempo em que penso no que escrevo e algumas repercussões, ou não, que o que escrevo tem. E sobretudo a percepção de que afinal não estamos sozinhos em muitas das coisas que pensamos. Participar antes de mais é envolvermo-nos na discussão, na criação de um conhecimento mais alargado dos assuntos da cidade.
A distância entre eleitores e eleitos é uma realidade que também é alimentada pelos eleitores. Eu, passe a imodéstia, não sou menos que os eleitos. Nem mais. E a participação entre iguais, cidadãos de uma mesma cidade, não se mede em reacções ou em ideias e sugestões. Muito menos em pregões. Mede-se na existência de uma crescente consciência da cidadania. E isso, mais cedo ou mais tarde, e aqui costuma ser mais tarde, vai ter reflexos na forma como os eleitos exercem o seu mandato. E os eleitores os elegem. A mim isso basta-me para participar. Reconheço que pode ser deformação profissional, porque se há coisa que um promotor imobiliário como eu tem é a consciência da dificuldade e lentidão das mudanças. Mas sou um optimista, senão tinha que mudar de profissão
Francisco Rocha Antunes