De: Jorge Ricardo Pinto - "Ainda a casa neomanuelina"

Submetido por taf em Sábado, 2007-08-25 21:20

Não concordo nada com a desvalorização patrimonial que tem sido feita por aqui à casa neo-manuelina da Foz. O pastiche e o “neo-qualquer coisa” são movimentos artísticos tão válidos como quaisquer outros, que obviamente têm que ser contextualizados, mas que respondem por vezes de forma perfeita à mentalidade e maneira de estar de uma época. Arriscando a crítica, direi mesmo que alguns desses exemplares são tão ou mais genuínos que a Sé com os seus novecentos anos, tal a confusão de estilos que o tempo lhe foi impondo, desde as torres românicas à rosácea gótica ao barroco da galilé ou às transformações do Estado Novo.

Mais ainda, apetece-me dizer que desde a Renascença que todos os movimentos são versões, réplicas, cópias, releituras de todos os anteriores. Se a casa da Foz é neomanuelina, o Museu Soares dos Reis é neopalladiano, ou seja, releitura dos textos de Andrea Palladio, a capela dos Pestanas na Rua do Almada é neogótica, e por aí fora… Nem me parece que essa reinterpretação seja necessariamente obra de um arquitecto saloio, como o Pedro Cameira aventa.

Já agora, também não concordo com o Pedro Aroso quando relativiza a sua importância histórica. Provavelmente aquela casa é um dos últimos exemplares de um certo estilo de vida da transição do século XIX para XX, aquando da criação da residência secundária na Foz, onde se vivia durante os seis meses mais quentes do ano, ou aquando da partida definitiva de algumas famílias para a Foz, vindas do Centro Histórico.

Poderemos não gostar da arquitectura, considerá-la de bom ou mau gosto, mas o seu valor é, em meu entender, importante, quer pela sua carga histórica, quer pelo valor paisagístico na actualidade. Uma frente de mar de uma cidade que quer figurar no top mundial não se pode dar ao luxo de deixar ao abandono aquela peça valiosa, oferecendo a quem nos visita uma paisagem urbana degradada e uma lamentável perda de identidade. Mas os exemplos são mais que muitos. Veja-se a ponte Dona Maria, com aproximadamente a mesma idade da casa da Foz…

Jorge Ricardo Pinto