De: António Alves - "Rio corrido II"
Caro F. Rocha Antunes,
Garanto-lhe que sou do tipo racional e até bastante frio. O sangue sobe-me à cabeça apenas nas quantidades estritamente necessárias para a alimentação e arrefecimento do meu cérebro. : )
Concordo que a Junta Metropolitana tem dado sinais de alguma vida nos últimos tempos. No entanto, não concordo que a ela se deva, nem exclusivamente e nem sequer em maior parte, a mudança de posição do ministro em relação à ligação Porto-Vigo. A mudança de atitude do Governo deve-se, a meu ver, ao efeito conjunto da pressão de variadas instituições e personalidades, estando entre elas, obviamente, a Junta Metropolitana. O papel desta última foi mesmo menor e ficou-se inicialmente por declarações de circunstância, só vindo o seu papel a ser mais notório quando a sua imobilidade, face ao movimentar doutras instituições e personalidades, já era insustentável. Creio que a mudança de opinião do ministro se deve mais à pressão do Governo da Galiza - foi gritante a falta que nos faz um governo regional -, ao facto de aparecerem investidores reais para o projecto - sintomaticamente também galegos -, e à própria pressão interna do PS do Norte sobre o Governo. Ao PS central seria insustentável justificar a ausência a norte de qualquer ligação a Espanha, já que nem Salamanca nem Vigo eram consideradas, quando a sul o Governo pretende construir em simultâneo duas: Lisboa-Badajoz em alta velocidade e Sines-Badajoz para mercadorias. Um aparte: na Junta Metropolitana tenho muito mais esperança no seu vice-presidente, o edil de Matosinhos, do que em Rui Rio. Está ali um nome a ter em conta, entre outros, para a câmara do município central da Urbe Porto e quiçá para uma futura macro-autarquia.
Concordo inteiramente com a sua acusação de miopia às anteriores câmaras socialistas em matéria de centros comerciais. Não o esqueço e sempre achei tais políticas como absurdas e contrárias ao progresso do comércio e da cidade. Eu, pessoalmente, gosto de centros comerciais como também gosto de comércio tradicional de qualidade. Há espaço para todos os que queiram evoluir. Porém, os últimos 4 anos não trouxeram, infelizmente, nada de novo. Antes pelo contrário, o mesmo tipo de opções manteve-se e foi até agravado por algumas polémicas estéreis. Comprova-o a transferência do El Corte Inglês para Gaia, a negociata das Antas em favor da Associação de Dona Laura Rodrigues e o protagonismo que a própria tem tido nos últimos anos. O facto da grande superfície espanhola ter sido implementada em Gaia não me causa qualquer espécie: o Porto, para mim, não está limitado à circunvalação; o que me repugna é o tipo de atitudes que provocaram tal facto.
Se Rui Rio está a comunicar mal está na hora de despedir aqueles que contratou especificamente para essa tarefa. Em coerência com o seu tão propalado rigor, pouparia aos cofres da autarquia vários milhares de euros mensais.
Em relação ao subsídio dos funcionários da recolha do lixo, como TAF tão bem sustenta, não existe nada objectivo que impeça a câmara de o pagar. O argumento de que se a recolha fosse privada tal problema não existiria carece de fundamento. Para mim este problema não aparece inocentemente: deve-se a uma estratégia clara para entregar a recolha de lixos a empresas privadas e também a um puro preconceito ideológico: Rui Rio considera que as vidas dos trabalhadores camarários menos qualificados e mais pobres são coisas menores. Ninguém com um mínimo de preocupação com a coesão social, que Rio tantas vezes evoca, tomaria a atitude que ele tomou em relação a pessoas com recursos materiais tão escassos. Entretanto a cidade tem visto degradar-se a sua limpeza urbana. Aos fins-de-semana é repelente a quantidade de lixo que transborda dos contentores e que se encontra espalhado pelo chão nas ruas da baixa. Para quem diz ter como grande objectivo a revitalização desta zona da cidade estamos conversados. Constata-se que neste campo as coisas pioraram.
Nada tenho contra o facto de empresas privadas tomarem conta de serviços actualmente prestados pela edilidade: desde que sejam mesmo privadas e não meras extensões de gente ligada às vereações e aos partidos do poder. Em Portugal estas situações são verdades quase científicas. Por norma, no balanço final, as despesas suportadas pelos contribuintes crescem quando muitos serviços públicos são concessionados a “privados”. Com as chamadas empresas municipais passa-se o mesmo. Frequentemente servem apenas para multiplicar os administradores, aumentar exponencialmente alguns salários, e arranjar bons empregos a muitos “jotas”. Sobre este tipo de coisas, e outras semelhantes, não faltam maus exemplos neste país. Num sector que conheço bem, o caminho-de-ferro, desde Cavaco que sucessivamente tem sido vítima de várias reestruturações: centenas de quilómetros de linha foram encerrados, centenas de estações fechadas e milhares de postos de trabalho eliminados; em contrapartida as empresas multiplicaram-se, os lugares de administração proliferaram como cogumelos e os prejuízos quadruplicaram. Nem tudo o que é “privado” é bom. Anuncia-se pelo menos mais uma empresa municipal para o Porto. Lá vem mais “tacharia”.
Se a renovação da estrutura da CMP resultar num funcionamento mais célere e competente da edilidade, eu também apoio. Esperemos para ver.
António Alves