De: José Silva - "O mito da aproximação à Galiza"

Submetido por taf em Sexta, 2007-04-13 18:56

Decorre hoje em Guimarães o 7º Plenário da Comunidade de Trabalho Galiza - Norte de Portugal, que tem na agenda de trabalhos, como principais pontos de interesse, a apresentação do Plano Estratégico de Cooperação 2007-2013.

Sempre que se fala da situação do Norte aparecem sempre como solução os mesmos clichets: dizer mal do Centralismo (aliás deveria designar-se de Concentracionismo, porque a gestão centralizada até é mais eficaz em certos casos), reivindicar a Regionalização / Descentralização e aproximação à Galiza. Ora, na minha opinião a aproximação à Galiza é uma falsa solução para o Norte e apenas expõe a nossa falta de capacidade de correctamente interpretar os factos. Efectivamente existem laços ancestrais entre os residentes do Norte de Portugal e os galegos, como bem demonstra o blogue Legião Invicta. Porém, esses laços também existem com os Romanos que nos povoaram em tempos anteriores e deixaram um idioma baseado no Latim, ou com os Fenícios ou Germanos. Basear a nossa estratégia de desenvolvimento em bases tão etéreas como a proximidade cultural ou antropológica, não me parece sensato. Este critério levaria a muitas outras aproximações...

Nas várias conferências a que assisti sobre os assuntos do Norte, já alguém chamou a atenção para a arrogância das elites galegas sobre o Norte de Portugal. Efectivamente a linha Porto-Vigo serve sobretudo para rentabilizar com passageiros e mercadorias portugueses a linha ferroviária de elevada velocidade Galiza-Castela e «mata» à nascença o upgrade da linha do Douro ou a linha Aveiro-Salamanca. Além do mais, como do nosso lado não existe estrutura administrativa competitiva, o Porto-Vigo é também uma ameaça ao porto de Leixões que continua sem ligações ferroviárias activas. Na minha actividade profissional tenho perdido exportações para Espanha devido aos custos de transporte rodoviário. Já tentei ligar 5 vezes para a CP Cargo (de Lisboa) para saber de preços alternativos, mas ninguém atende. Com o sistema intermodal existente em Vigo, futuramente será mais barato aos cargueiros internacionais descarregar em Vigo e enviar por comboio para o Porto do que usar Leixões.

Mas as ambições económicas galegas sobre o Norte de Portugal não ficam por aqui: existe uma migração de mão-de-obra barata para a construção civil galega e uma invasão de Zaras, Pescanovas e automóveis PSA por cá. Ainda vamos ganhando no tráfego de Pedras Rubras, mas até quando? Até à Ota arrancar? E a refinaria da Corunha que seria beneficiada se Leça fechasse? Os galegos, naturalmente, disfarçam as suas ambições económicas sobre o mercado do Norte de Portugal com panos quentes. Não os critico.

Sempre existiu uma tentativa de absorção de Portugal por Castela. Lisboa responde. Nas últimas décadas, tentando crescer à custa da drenagem económica de Portugal para a zona da foz do Tejo. Rui Moreira também o diz: «Desde os governos de Cavaco que há um propósito de impedir que o Noroeste Peninsular possa vir a ser uma região num futuro mais ou menos distante. Será pela melhor razão, para preservar as fronteiras do nosso Estado-nação? Ora, quando se assiste à submissão dos nossos governos aos interesses de Espanha, seja na política económica (que sucumbe às ordens das suas grandes empresas e não resiste às perseguições às portuguesas em solo espanhol), seja nas negociações dos dossiers da energia e da água, seja na construção do TGV em que se aceita a lógica radial de Madrid, é lícito perguntar: não haverá um plano furtivo para garantir que Lisboa sobreviverá, mesmo que apenas como capital de uma futura região (decalcada no nosso mapa e da qual o Norte não se possa vir a destacar) de uma federação ibérica orquestrada na Moncloa?»

Efectivamente podemos reparar que eixo da actual campanha contra a Ota e Sócrates se centra no grupo Prisa em Portugal, como por exemplo Sócrates: a polémica continua e A Ota «parece um filme de terror». Também sabemos que os recentes ganhos de poder económico no Norte de Portugal face a Lisboa, compra da Galp pelo grupo Amorim, OPA Sonae sobre PT e regresso da Lusomundo a mãos nortenhas e consequente viragem editorial do JN, tiveram como eixo comum o financiamento do grupo Santander. Ora, da geopolítica, compreende-se facilmente que Castela está a atacar Lisboa «dividindo» Portugal. Lisboa que responde ao peso de Castela reforçando-se à custa de Portugal; Castela responde com a criação de divisões em Portugal. Daí a imaginativa notícia das intenções autonomistas do Porto no El Pais. Conjunturalmente e inconscientemente, Castela tem feito mais pelo Norte de Portugal ao «atacar» Lisboa, do que nós próprios, ignorantes, Felizes Como no Prozac (FCP), manipulados pelo «mainstream media» da capital, políticos locais cata-vento/yesman ou pelos empresários portuenses anti-regionalização (porque não queriam ameaçar as redes de lobby montadas com o poder central).

Daí que a aproximação à Galiza seja uma resposta muito arriscada. Por um lado não sabemos o que o futuro nos reserva em termos de criação de novos Estados a nível mundial e Ibérico. Jogar no escuro é perigoso. Por outro lado a nossa aproximação à Galiza é precisamente aquilo que mais convém a Lisboa para criar medos de separatismo e justificar as campanhas e acções contra o Norte.

David Afonso referia que «enquanto Lisboa redefine as fronteiras da nação à sua maneira, isto é, esquecendo as populações do norte e interior, a Galiza também o faz, mas na exacta medida em que Lisboa recua. O futuro dos galegos está em grande medida no Portugal que Lisboa não quer. E o do Porto também. Resta saber se saberemos aproveitar esta oportunidade. Caso contrário, ficaremos entalados entre dois centros numa situação ambígua de dupla marginalização».

Efectivamente corremos o risco de substituir uma capital egoista e drenadora por um vizinho interesseiro num cenário de reconfiguração de Estados, algo que objectivamente o Norte não tem qualquer vocação ou preparação. A solução é mesmo um «Orgulhosamente acompanhados», com ênfase no «Orgulhosamente», baseado em muito «trabalho de casa».

José Silva