De: Rui Valente - "O Porto agradece!"
Sr. Rocha Antunes
Nasci, cresci, estudei e brinquei na cidade do Porto, uma cidade que eu amo antes e sobre qualquer outra. Bacoquismo, isto? Pode ser, mas se é, é coisa boa.
De pequeno habituei-me ao convívio com esta gente, partilhei sonhos, vivi cumplicidades, criei amigos e aprendi a índole muito pópria deste povo, muito antes das televisões existirem para ditarem opinião. No Porto foi sempre costume dizer-se abertamente o que se pensa (mesmo trocando os bês pelos vês), o que só exprime a nossa autenticidade. No Porto fomos sempre hospitaleiros e virados para o trabalho, mas agora até isso a opinião publicada de Lisboa nos quer roubar, chamando-lhe mitos. Por este andar, qualquer dia, também nos roubam o vinho do Porto e o transformam noutro mito. Só falta mesmo é roubarem-nos a alma. Também no Porto, ainda rapazinho, assisti com meu pai, à recepção apoteótica, nunca antes vista em lado nenhum, do povo (que você deve achar bacoco) ao General Humberto Delgado.
O Porto, Sr. Antunes, dispensa bem a importação de tiques, conceitos e preconceitos oriundos de fontes externas, venham elas de onde vierem, porque tem identidade própria e porque são essas falsas noções de civilidade que têm contribuído para o nosso definhamento. Por isso, senhor Antunes, não é o Porto que tem de se adaptar a quem chega, seja para logo partir ou para permanecer, mas sim o contrário. O meu pai era transmontano, minha mãe minhota, vieram novos para o Porto, cá passaram a viver e cá se integraram, e se tornaram verdadeiros tripeiros. Mas antes tiveram naturalmente que assimilar a cidade e as suas pessoas, os seus gostos, as sua paixões (o que, diga-se, para quem cá está de boa fé, não é nada difícil). Isso, senhor Antunes, também é ser portuense.
Já percebi (e se percebi) que pouco adianta repetir e explicar-lhe que não é Lisboa que eu ataco, nem os seus habitantes, mas a prepotência que economica e politicamente simboliza para o resto do país. Prepotência essa que, paradoxalmente, consegue em regime democrático ultrapassar a que exercia no tempo da ditadura. Mas o senhor Rocha não quer perceber, e prefere gastar os neurónios a deturpar a essência do que os outros dizem. Está a ver, esse é um dos grandes defeitos que têm os políticos, que eu e outros aqui tanto criticamos.
Assim se compreende melhor que o meu "Dicionário de lisboês" (e outras ironias), o tenham incomodado e revelado o seu desenraizamento perante a cidade que o acolheu e sobretudo, a sua total ausência de sentido de humor. O senhor tem todo o direito de viver no Porto ou onde quiser (quem sou eu para o impedir), o que não tem é o direito de nos impingir as suas normas complexadas de como exercer a cidadania. E, se é verdade que você já frequentava este blogue antes de mim (chegou primeiro, como diz), também é verdade que ao Porto fui eu quem chegou primeiro, porque aqui nasci. E o Porto é muito mais importante que todos os blogues do Mundo (com todo o apreço e amizade que já tenho pelo Tiago e pela "A Baixa do Porto").
Como deve saber, no vocabulário luso não faltam adjectivos, e se eu quisesse escolher um ou mais para o qualificar, não teria dificuldade, mas prefiro não o fazer, para não correr o risco de fazer a sua figura.
Passe bem
Rui Valente
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Nota de TAF: Caro Rui, eu publiquei este seu texto apesar de, na minha opinião, ele sair completamente fora do estilo e do tema que aqui pretendo manter. Não me parece boa prática pressupor que está de má-fé quem tem opinião diferente aqui no blog, por muito diferente que ela seja. Mas, principalmente, esta "troca de galhardetes" é completamente estéril. Por isso dou por encerrado este "incidente" e não publicarei mais textos de ninguém sobre ele. Gozemos o fim de semana! :-)