De: Pedro Figueiredo - "Foz Velha - cidade quarteirão - 2º centro histórico medieval"
A Foz Velha é o segundo centro histórico medieval desta cidade, sendo o primeiro a Sé, Ribeira, Barredo, Vitória e Miragaia. Pelo que conheço da Foz Velha (Rua Padre Luís Cabral, Rua da Beneditina, Rua Alegre, Rua do Monte Belo, Rua de Santa Escolástica) não é nada de espantar a coexistência de diferentes classes sociais na mesma rua e lado-a-lado, a Casa da Patroa e a Casa da Criada. As cidades de origem medieval, os burgos, são por excelência o ideal urbano da mistura social ao longo da rua e no mesmo espaço. Na Foz Velha, basta observarmos casa sim, casa não, o portão onde por trás vive a criada e a casa de família logo ao lado, como regra urbana. (Por todas as razões e mais alguma defendo a cidade-quarteirão e as ruas-corredor como "o" modelo de cidade a adoptar e preservar.)
Na Foz Nova, e como zona de férias onde os portuenses alugavam casa durante o Verão, a criada vinha e ficava num quarto. O resto? O resto é o século XX. Tanto quanto sei a impressionante discriminação por espaços urbanos e por classe social nesta cidade invicta só começa com a industrialização do séc. XIX, e o maciço movimento para rentabilizar cada logradouro da casa burguesa com cerca de dez rendas para habitação, uma renda por cada microcasa de 16 m2 por cada casal (ele operário, ela "criada de servir"). As ruas para o burguês, a invisibilidade miserável para o trabalhador, escondido no interior do quarteirão.
De resto, primeiro com o plano "de melhoramentos" (1955+66), a vida destas "criadas" apenas melhora no tamanho da casa que passa de 16m2 para 50 ou 60 m2, só que passam a ter de se deslocar quilómetros do seu bairro camarário de subúrbio até Casa da Senhora, onde quer que esta more. (As torres HLM "habitation à loyement moderée", onde morava a minha sogra - "criada de servir" em França, Versailles, Paris, distrito 78 - eram torres de luxo, a qualquer nível, em comparação com os nossos blocos - miseráveis rc+3 de habitação "social".)
Por fim, com a selecção "natural" pelo preço, que é feita pelo mercado "livre" (uma fantasia de direita, ou utopia/distopia se quiserem), o pessoal só tem hipótese de arranjar casa nas gaias, nas gondomares, nas areosas, em ermesindes vários... (Perguntem às senhoras da limpeza - às da periferia, não às "finas e fozeiras" que entram no autocarro da Marechal às 19h30, quanto tempo demoram até Ermesinde em hora de ponta.)
Sim, na Foz Velha há ainda algum mix social, mas não no Porto em geral, onde - como dizia o Nuno Portas em "urbanismo 1 e 2" (2º e 4º anos da FAUP) "é muito fácil dizer-se onde estão ricos, pobres e remediados no Porto, onde a segregação é claríssima: ricos na Foz e em duas ou três bolsas (Foco e Boavista), pobres em Campanhã e escondidos em inúmeras bolsas (bairros sociais e ilhas). A classe remediada? Na periferia, cada vez mais longe do centro, reservado que está o centro a preços absurdos e invendáveis em muitos casos".