De: Pedro Figueiredo - "Afinal é «Filhos Da» ou «Filhos De» que se diz?"
1 – Incrível a maneira como se discute na sociedade “a aplicação de palavras em abstracto” em vez de se aferir o “significado dos objectivos propostos” e de forma inteligente e sensível. Incrível, e de loucos, claro. Dá sempre óptimos sketches tipo “Gato Fedorento”. Só há uma coisa a dizer, em bom rigor: O objectivo da tal lei não é impedir que qualquer autarca se candidate por mais de três mandatos, porque se supõe que o poder não deve ser eterno? Então está tudo dito. Se eu à frente da palavra “mandatos” não escrevo mais nada, então o caso é geral, é óbvio. É evidente! Não posso nunca sub-entender. Se nada se diz à frente, nunca se pode sub-entender nada pois nada está escrito… Nem mandatos ali, nem acolá, nem empresas, nem carros, nem papagaios. Nada. Simples, não é? Não. Errado. Quando estão em causa os dinossauros do PSD (e pelos vistos também os do PCP, que parece concordar com a “tal interpretação”…) isso é que é, afinal, a coisa mais importante do mundo. E nós, parvinhos, a ver esta ridícula discussão enquanto somos comidos por lorpas (uma vez mais e repetidas vezes).
2 – O legalismo da sociedade e a sua amiga burocracia são uma perversão não-contraditória com o ultraliberalismo em processo de imposição. O legalismo é o suporte do liberalismo, já que o liberalismo “nada deve à ética, seja esta qual for”. Daí toda uma religião só para sábios e intérpretes sagrados “da palavra” tal como no antigo testamento, da “interpretação da palavra” e afins. Em que nunca coisas simples como “a vontade”, “a ética”, o “bom senso”, o “bem comum” não existam sequer como conceito aplicável (“falta-lhes personalidade jurídica, dirão”). É a morte das palavras afinal, em vez da sua plenitude.
3 – Numa fase anterior, a minha profissão de arquitecto foi também transformada numa mera transposição de palavras escritas de inúmeras “legislações”, prontas para serem materializadas em construções. Uma construção não Arqui-tectónica (”A principal tectónica”) afinal, mas um somatório (em tijolos) de palavras desconexas entre si, onde a “Arquitectura” é, no fundo e à superfície o que menos interessa.” Antes cumprir a lei e não ser-Arquitectura!” Tem sido este um dos cancros que urge combater, como Dom Quixote em causa própria.