De: Paula Morais - "Reabilitação de edifícios vs legislação urbanística"
Caros participantes
Por ser um assunto que muito me chama a atenção, tenho acompanhado atentamente o recente debate produzido aqui no blogue sobre o tema da reabilitação de edifícios. Assim, e talvez por ter dedicado cerca de 70% dos meus projectos à reabilitação e recuperação de imóveis, entendi que seria esta uma boa oportunidade para oferecer o meu breve contributo ao diálogo que aqui se vai desenvolvendo.
Apesar de, à primeira vista, para quem tem de elaborar o projecto de reabilitação de um edifício, a legislação seja, como disse César Costa, um “entrave”, e não existindo um necessário regime jurídico unitário dedicado à reabilitação de imóveis, tenho contudo constatado que, afinal, a actual legislação urbanística, apesar de dispersa, até contém bastantes normas de excepção para as edificações que já existem e necessitam de ser reabilitadas ou recuperadas. Para não me alongar muito deixo apenas quatro exemplos:
- as normas do Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU) são apenas aplicáveis a edificações que tenham hoje em dia menos de 55 anos, ou seja, existem ainda muitos edifícios (anteriores a 1951) que para serem reabilitados não necessitam de cumprir o RGEU (desde que tais obras, de acordo com o actual Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, “não originem ou agravem a desconformidade com as normas em vigor; ou tenham como resultado a melhoria das condições de segurança e de salubridade da edificação”); inclusive, nos anos 80, e com o objectivo de permitir a legalização (ou seja, uma forma de reabilitação e recuperação de imóveis) de edifícios que encontrando-se já consolidados não conseguiam cumprir o RGEU, foi publicado um diploma que dispensa determinadas obras do cumprimento dos “mínimos” estipulados no RGEU (Portaria n.º 243/84, de 17.04);
- o Regulamento de Segurança Contra Incêndio em Edifícios de Habitação também é bastante permissivo em relação a edifícios que já existiam antes da sua publicação (1990), pois de acordo com o art. 1 este regulamento aplica-se aos edifícios existentes apenas quando estes sofram “remodelações profundas de que resulte a ultrapassagem dos limiares de 9 m ou de 28 m na altura do edifício”;
- um outro exemplo que contém excepções nos casos de edifícios existentes, é o Regulamento Geral de Higiene e Segurança do Trabalho nos Estabelecimentos Comerciais, de Escritório e Serviços, como por exemplo a norma que refere que “o pé direito dos locais de trabalho não deve ser inferior a 3 m, admitindo-se, nos edifícios adaptados, uma tolerância até 2,70 m”;
- e, por último, o recentemente aprovado Regime da Acessibilidade aos Edifícios, que apesar de alargar a sua aplicação aos edifícios existentes (incluindo os destinados a habitação), refere que o mesmo não é exigível “quando as obras necessárias à sua execução sejam desproporcionalmente difíceis, requeiram a aplicação de meios económico-financeiros desproporcionados ou não disponíveis, ou ainda quando afectem sensivelmente o património cultural ou histórico, cujas características morfológicas, arquitectónicas e ambientais se pretende preservar”.
Paula Morais