De: Pedro Figueiredo - "Aqui podia viver gente"
“Aqui podia viver gente”, e aqui podia mesmo haver um Programa Nacional para a Reabilitação Urbana!
1 - Só faz sentido “um sistema acabar” quando há um outro sistema pronto a substituí-lo. Actualmente está felizmente falido o mau sistema imobiliário-financeiro que “vorazmente” (assim é o capitalismo, voraz!) ousou provocar um endividamento sem precedentes aos Portugueses e construiu o equivalente a casas para 20 milhões de Portugueses(!) – evidentemente a maior parte vazias e não-vendáveis tanto hoje como a prazo… Este sistema tem, no entanto, de ser substituído por outro sistema… Assim terá de ser. E o novo sistema a implementar já deveria estar em vigor desde 2000 pelo menos, pois há mais de dez anos que a crise imobiliária era previsível, dada a sua óbvia irracionalidade, insustentabilidade e declínio visível nos últimos 10 anos…
2 – O contrário de haver um novo sistema que substitua o paradigma imobiliário-financeiro é não haver plano económico algum da parte do governo. É o que temos actualmente. Actualmente, “tenho esperança que chova”, como diria a ministra Assunção Cristas, pois o governo não tem planos (“planificar é coisa de planos quinquenais soviéticos”), preferindo ter fé nos mercados que hão-de salvar.
3 – Assim, para que o “caos” do mercado (da recuperação urbana) seja por milagre iniciado, nem políticas keynesianas (“Keynes? Krugman?… Kruzes, Kredo”), nem injecção de capitais (“não há dinheiro” diz sempre o governo, e eu digo: excepto uma grande parte de “apenas” 78 mil milhões que recebemos da troika”), nem o uso de fundos QREN (13.000 milhões estarão disponíveis). O não-impulso da Reabilitação Urbana por parte do Estado põe em risco e empurra para o desemprego/miséria cerca de 140.000 operários da construção civil e 15.000 arquitectos.
4 - Melhor é possível. Aqui, aqui e aqui estão algumas políticas que o Bloco de Esquerda tem proposto na Assembleia, para um mundo melhor. ”Aqui podia viver gente” sim, porém, nenhum caminho é isento de riscos e críticas, é no mínimo necessário “haver um caminho”…
5 – O governo “crê” (“tenho esperança que chova”) que a nova lei das rendas que prevê o aumento de cerca de 1/3 das rendas (são apenas 33% das rendas as rendas mais antigas) seja o suficiente para que haja interesse e capital para que os proprietários-senhorios iniciem “a reabilitação” que salva. Diz o preâmbulo da nova lei do arrendamento: “Criando um procedimento especial de despejo do local arrendado que permita a célere recolocação daquele no mercado de arrendamento”. Despejar uns que pagam pouco, para voltar a arrendar a outros a preço mais alto, e assim supostamente os senhorios terem dinheiro para a “reabilitação”.
6 - “No meu tempo” quando se queria estimular uma coisa – o arrendamento por exemplo -, baixava-se o preço dessa coisa, criando mais acessibilidade, mais “mercado”. Era uma lógica simples e directa, sobretudo quando o país tem baixos rendimentos. A outra alternativa é um aumento induzido de rendimentos (o salário mínimo que temos é um escândalo e faz todo o sentido para a economia aumentá-lo). Com a nova lei da rendas, o Estado propõe-se uma vez mais a nada fazer… O mercado há-de funcionar (fé) com este tipo de estímulos… (Afinal, o Estado é para destruir, apenas serve entretanto para cobrar super impostos para entregar à banca internacional sob a forma de 50% de juros sobre os 78 mil milhões da “ajuda”.)
7 – Li a nova lei do arrendamento e não vi nenhuma obrigação em o proprietário usar a diferença do dinheiro entre a renda antiga mais baixa e a nova renda aumentada (“actualizada”) para reabilitar o edifício em causa. Assim, obviamente, nada irá acontecer. Os proprietários porão o dinheiro (muito ou pouco) ao bolso e pronto: não haverá “alavancagem” para a reabilitação urbana, apenas e tão somente a costumeira transferência de dinheiro para os bolsos de quem é proprietário. O mínimo seria a existência de uma conta, um fundo, um mecanismo qualquer de concentração do dinheiro da renda obrigatoriamente canalizado para a dita “reabilitação” do imóvel.
8 – A reabilitação urbana funciona a partir de Políticas para a Reabilitação Urbana. Coisa simples de perceber. A “reabilitação urbana” está a começar de forma absolutamente desastrosa quando a primeira proposta serve para tentar passar uma enorme quantidade de dinheiro de pobres pessoas arrendatárias em plena crise para os proprietários dessas casas, “por pobres que estes sejam” (!)… e, ainda por cima, quando não há qualquer plano para a dita “reabilitação urbana” propriamente dita (“tenho esperança que chova”).
9 – A cegueira em nem sequer se iniciar a reabilitação urbana parece que vai inclusivamente “acabar com a Porto Vivo / SRU” aqui no Porto, segundo notícia do “Grande Porto”. Este posto de trabalho de Rui Moreira está portanto em perigo, pese embora a parte pior da notícia seja, uma vez mais, “acabar com um mau sistema”, sem entretanto cuidar de substituir esse sistema (a SRU)por um outro sistema que funcione!
10 – Aqui ao lado, em Espanha, onde também há um governo de direita, onde também está em curso austeridade e agressão aos direitos das pessoas… haverá, no entanto e apesar disto, um plano de investimento a 12 anos para a Reabilitação Urbana “enquanto economia”, no valor de cerca de 225.000 milhões de euros (!) (números JN). Ambos estamos em maus lençóis, mas a burrice do governo que os Portugueses elegeram parece não ter limites (“temos esperança que chova”).