De: Daniel Rodrigues - "Re: «Gente diferente para pior»"

Submetido por taf em Segunda, 2011-11-14 18:09

Caro António Alves

Não obstante a possibilidade de criticar o modelo de funcionamento da Metro do Porto, há que ter conta peso e medida. A utilização do valor de "passageiro km" não é uma comparação viável, visto tratarem-se de sistemas com propósitos e fluxos diferentes. A rede onde opera a CP Porto conta com perto do triplo da distância que tem a Metro do Porto. Usando a métrica de Passageiros Km, 10 passageiros que venham de Aveiro para o Porto (45km) contribuem com 450 passageiros km. Para obter o mesmo valor para Trindade Casa da Música (2km), é necessário transportar 225 passageiros. Como a utilização do comboio é tendencialmente suburbana, e a do Metro focada em percursos reduzidos, isto cria uma distorção nos resultados apresentados. De igual modo, os dados referente a 13,83 cêntimos referia-se ao mês de Setembro, portanto não há qualquer inverdade no dado apresentado. Os dados referentes a 2010 não incluíam a linha de Gondomar, que presumo possa ter contribuído para melhorar o desempenho financeiro.

Mas, sobretudo, implica ressalvar no seu comentário um aspecto importante, respeitante à diferença salarial. Eu não tenho a menor dúvida que o valor do trabalho em Portugal está frequentemente desajustado, e rapidamente podemos saltar para a indignação quando apresenta a comparação de um maquinista de alfa pendular em topo de carreira vs. o salário médio na Metro do Porto. No entanto, vamos ser claros: comparar salários médios de gestores com "a esmagadora maioria dos trabalhadores das outras empresas de transportes" é incorrecto. Se queremos ser justos, um profissional num cargo de responsabilidade que realize um trabalho competente merece ser remunerado por isso. E esta diferença pode parecer escandalosa (e eu reconheço que em Portugal ainda é significativa), mas há que frisar que tem de se descontar a progressividade do imposto e os impostos adicionais sobre a poupança. [1]

Relativamente a esta diferença salarial, em particular, os gestores do Metro do Porto têm feito um bom trabalho. É porventura uma das empresas mais transparentes do país: os relatórios e contas estão facilmente disponíveis online desde há anos, e num formato legível (os da CP continuam a ser fotocópias digitalizadas, e só recentemente passaram a estar disponíveis). A gestão da rede, numa base comparável (ou seja, outros sistemas de metro), é competente e tem gradualmente melhorado os seus resultados financeiros e operacionais. Manteve afastado o estigma de ser um poiso de pessoal político, algo a que a CP não foi capaz de se esquivar. Aumentou a sua rede e operações enquanto a CP cada vez mais se afasta do seu âmbito de serviço nacional.

Pode o António Alves indignar-se com a posição dos gestores da Metro. Mas eles têm razão no artigo que escreveram. Eles deram as 8 razões que poderiam ter prevenido a greve da CP. Tivesse esta adoptado o mesmo modelo de gestão e porventura os gastos com pessoal, de 122 milhões de Euros, estariam mais detalhados, como o estão os do Metro: sabemos exactamente quanto ganha cada um dos membros do conselho de administração. E, sobretudo, fosse a CP mais como a Metro do Porto e os seus passageiros não teriam sofrido as consequências da última greve.

Cumprimentos,
Daniel Rodrigues

[1] Corrigindo o que referiu, os gastos com o pessoal na Metro foram, em 2010, de 5.847.558€, e o número médio de empregados 118, 49.555€, e não 58 mil euros, como referiu. Na CP 122.251.079€, com um número de empregados de 3212, incluindo contratados a prazo, média de 38.060€