De: Pedro Figueiredo - "A re-habilitação urbana que a gente precisa"
A re-habilitação urbana que a gente precisa é assim: é um “programa económico” que emana do Estado e estabelece regras claras, pesquisa entidades públicas e privadas carentes de reabilitação do seu património, negoceia e junta verbas, iniciando processos de reabilitação. Contagiante, associativa, que conte com a multiplicação vagarosa mas persistente de unidades (edifícios) pequenas e médias que se vão reabilitando como uma vaga de fundo que vai aumentando (dinâmica).
Um processo de âmbito nacional que abranja Porto, Lisboa e Coimbra e que seja em simultâneo um programa económico para criação de postos de trabalho e um programa económico que envolve Estado e Privados. Sendo um plano e um programa económico, é coisa para o “Ministério da Economia” e apela a um Estado que planifica (alguma dúvida?), um Estado que queira organizar coisas para bem de um país, país este que tanto precisa destas coisas, … e sem se envergonhar o tal Estado de “ser um Estado que intervém na economia”, … pois mais do que nunca esta intervenção é mesmo necessária… posto o mercado privado per se “não avançar” sem fundos, garantias, créditos, coragem, obras e graças do Espírito Santo, etc, etc, coisas que não existem. Para já, a re-habilitação urbana que a ministra-de-muitas-coisas Assunção Cristas propõe, parece ser assim: um conjunto de medidas para “agilizar processos”. Coisa muito pouca. Precisamos de processos mesmo! Quando havia trabalho em arquitectura, sim, era preciso agilizar processos, agora é preciso processos. Ou seja projectos, ou seja investimentos.
Também já se sabe que de seguida a ideia será aumentar as rendas mais antigas, chamando a isso “dinamização do mercado de arrendamento”. Como as pessoas inteligentes já sabem porque olham para os preços do arrendamento nos jornais, arrendar novo sai tão ou mais caro do que comprar a um banco… Quanto ao aluguer antigo e baratinho, os tais alugueres que os ideólogos liberais “acreditam” (fé) serem “o” impedimento a que os proprietários façam obras, é bom que se pense nas consequências sociais em despejar velhotes e velhotas das casas velhas, com reformas de 300 euros na melhor das hipóteses…e em que é que isto “contribui efectivamente para a reabilitação urbana”… Para já, a urgência social em fazer a reabilitação urbana passa por suprir as necessidades de emprego na construção e na área do projecto. Nós, arquitectos, estamos à míngua neste momento. Precisamos de nos agarrar à tábua de salvação reabilitação urbana (tanto mercado: os centros de Porto, Lisboa e Coimbra para reabilitar…). Para quem não sabe: conheço gabinetes que não têm trabalho, arquitectos que foram despedidos, uns e outros não têm encomendas no presente e num futuro próximo, nem num futuro menos próximo, tantos gabinetes que fecharam as portas mesmo.
E isto acontece na mais perfeita esquizofrenia da nossa Ordem dos Arquitectos (OA): a OA multiplica-se em colóquios, debates, encontros, coisas com nomes em inglês, homenagens a arquitectos. Siza e Souto de Moura nunca tiveram tantos prémios (ainda bem), a Arquitectura portuense nunca esteve tão “in”, a OA nunca defendeu tanto a arquitectura e nunca defendeu tão pouco os arquitectos… As faculdades continuam a deitar cá para fora novos arquitectos para o desemprego (ninguém os avisa nem os avisou: terrível)… E ao mesmo tempo (esquizofrenia), não há mesmo trabalho, gabinetes fecham, os meus colegas emigram (S. Paulo, por exemplo, conheço vários que foram), os que ainda trabalham é a falso recibo verde, e etc, etc. Só que acontece eu querer trabalhar em Portugal, porque é ridículo - ridículo - a gente não ter trabalho na cidade de Siza, e da Escola do Porto, com tanta casa para recuperar. No mínimo ridículo e eu recuso emigrar como uma inevitabilidade, 35 anos depois do 25 de Abril.