De: José Ferraz Alves - "Uma outra perspectiva na resolução da crise"

Submetido por taf em Quarta, 2011-04-20 18:14

O círculo virtuoso da circulação do dinheiro

Acho fantástico que mais um grupo de notáveis deste País se esteja a organizar em mais um manifesto. Pode ser que em grupo funcionem porque, individualmente, muitos estão por detrás da situação que vivemos. Se eu próprio não tiver cuidado, qualquer dia também eu cairei nessa de dar ouvidos aos mesmos de sempre… A maior parte dos problemas não carece de grandes decisões estratégicas, mas de regras práticas de educação, de respeito pelos outros, de cumprimento das nossas obrigações, de percepção do impacto que temos na vida dos outros.

A minha proposta, pensando sobretudo no desemprego e falência de tantas empresas a Norte baseia-se numa simples ideia: e se baixássemos os impostos sobre os rendimentos de trabalho, o IRS, levando-o nalguns escalões a zero?

A riqueza não é só um processo de acumulação, mas também de circulação. Conhecem a anedota do turista que se hospeda num hotel e deixa o dinheiro do quarto no balcão, enquanto sobe para inspeccionar o quarto? Entretanto este dinheiro vai circulando, passando para o dono do supermercado, do talhante, da empresa de transportes que deve dinheiro ao hotel, assim regressando às mãos do turista, a quem não agrada o quarto e deixa-o no momento seguinte. Todos pagam as suas dívidas e o Estado cobra os impostos indirectos inerentes, pela circulação.

Se quizesse escandalizar, diria que a taxa de IRS deveria ser zero para todos os níveis de rendimento e que se devem taxar apenas as situações de imobilismo da massa monetária, nos depósitos, aplicações financeiras e imobiliária. Precisamente o contrário do que fazem. E não me venham com a fuga de capitais para o exterior! Os grandes rendimentos já estão fora e a Banca portuguesa, que sempre procurou viver dos grandes rendimentos do Estado, precisa de perceber que é nos poucos rendimentos multiplicados pelas pessoas que ainda conseguem viver em Portugal que está o seu negócio.

Critiquem-me. Mas em que é que o aumento das taxas de imposto ajudou nalguma coisa, se virmos a história e analisarmos os casos de Portugal, Irlanda, Grécia? Só provoca recessão, e com o diferimento de 3 a 6 meses, aumento das prestações sociais por desemprego e redução de novos encaixes no IRS por aumento do desemprego.

Em que é que aquilo que tem sido feito e se pretende continuar a fazer foi e é acertado? É tão simples e básico. Por isso não o fazem? Parece mal por ser simples e básico? Quais são os mitos e os erros da política económica em Portugal?

  • O Grande
  • O Concentrado, numa Região, em poucas pessoas
  • As cidades criativas
  • O Ganho das Economias de Escala, em se pretender tudo fazer de uma só vez
  • A Internacionalização, descurando o mercado interno
  • Os Resultados rápidos, por uma exigência das Bolsas, de 3 em 3 meses
  • Os Oligopólios nos bens não transaccionáveis: energia, telecomunicações, estradas, saúde

O que fazer? O contrário.

  • As micro e PME's
  • A Regionalização
  • O regresso ao interior, para o qual as linhas ferroviárias regionais são essenciais
  • As obras públicas repartidas por pequenas adjudicações que fomentem a eficiência pela concorrência e a baixa dos preços e não pelo monopólio de grandes obras em que só alguns conseguem concorrer
  • O mercado ibérico, a Euroregião Galiza - Norte de Portugal - Castela e Leão
  • O capital paciente e os resultados uma vez por ano
  • A concorrência nos bens não transaccionáveis

O problema do país é o déficit comercial e o facto de termos de pedir euros fora, pois temos déficit corrente!
Esse é o problema que se segue, não é o principal. Havendo massa crítica, isto é, valor de mercado, atrairemos mais facilmente o investimento no país para colmatar os desequilibrios nos aparelhos produtivos. O problema número 1 é a pobreza da classe média. Não estou a sugerir que os impostos retornados sirvam para ir às compras em Londres. Estou a dizer que há quem não tenha dinheiro ao fim do mês. Isso realiza-se de imediato. Não posso aceitar que se limite tudo ao endividamento externo.

E onde vamos buscar Euros para pagar as despesas do Estado?
Aos impostos indirectos e sobre o consumo, que decorrem por multiplicar o dinheiro pelo acréscimo de transacções e reduzindo os subsídios de desemprego. E neste sistema que vai criar recessão onde se vai buscar o dinheiro para o Estado em Setembro, após acréscimo de falências no Verão?

Mas o problema é que temos 10% de déficit corrente, o que significa que quanto mais transacções mais euros saiem do país, isto é, perdemos 10% em cada transacção!
Para isso é preciso uma acção de "compre o nacional" e Fundos de Investimento Regonais para dinamizar a base de produção nacional que substitua importações, financiado pelos nossos emigrantes pela nossa rede da lusofonia. E trazer reformados do Norte da Europa e suas reformas para o Norte de Portugal, em turismo de saúde, ambiental e geriátrico. Em conjunto com a baixa do IRS.

Pois... por isso tem de ser feito em simultâneo!
Sim. Existe uma ortodoxia em termos de política económica que tem de ser combatida:

  • As medidas de política económica são vistas de forma estática, quando se deverá analisar o seu efeito dinâmico
  • Subir spreads quando o risco é maior (devia ser descer, se o objectivo fosse resolver os problemas) ou deixar de emprestar
  • Intervenção do FMI, em que o próprio FMI antevê como resultados da sua intervenção na Grécia: PIB baixará mais, o desemprego aumentará e aumento da conflitualidade social
  • Sempre subir taxas de impostos para conter contas públicas
  • Endividar para pagar dividendos (empresas públicas e semi-públicas)
  • Não ir à essência básica dos problemas. A poupança em Espanha é de 20% e em Portugal 9%, porque os rendimentos são mais distintos
  • Assumir que todos os recursos financeiros públicos têm de ser consumidos em projectos de investimento. Caso estes tenham uma baixa rentabilidade de retorno, não seria preferível devolver aos cidadãos como imposto negativo?

Segundo um ex-Primeiro Ministro da Suécia, responsável pela resolução da crise bancária neste país, Goran Persson, “o mais importante do factor crescimento económico não é se os impostos são elevados, mas a forma como são usados”. Os portugueses, e não só, foram avisados durante anos sobre os malefícios do consumo em excesso. No entanto, desde que a crise começou, é para os consumidores que os economistas devem olhar e esperar uma ajuda à economia. Se todas as famílias cortarem no consumo, os efeitos para a economia serão negativos, agravando mais a crise. Um aumento ou manutenção dos níveis de consumo darão um contributo importante para a sobrevivência de muitas empresas que enfrentam dificuldades de acesso a financiamento e uma queda abrupta das vendas ao exterior.

O consumo equivale a dois terços do produto interno bruto português, pelo que qualquer variação é muito sentida na economia. Em termos de resistência do emprego, as famílias poderão beneficiar de um desempenho favorável do consumo. É que, com a sobrevivência de um maior número de empresas, menor será o número de despedimentos na economia. O consumo das famílias passou de pecado a tábua de salvação pela lógica do ciclo vicioso: mais consumo, mais actividade económica, mais emprego, mais rendimento para consumo. E o Governo ainda não faz a sua parte, que é a baixa dos impostos. Contrariando-se a moda de uma miopia de acções centralizadas nas políticas públicas de promoção do investimento, ditas keynesianas, sugere-se que o combate à actual crise internacional se faça pela adopção de práticas de índole monetarista associadas a dois princípios: solidariedade e partilha.

Vou chamar ao debate John Kenneth Galbraith que, a propósito da crise de 1928, colocou a desigualdade na distribuição de rendimentos como sendo a sua principal causa. E, muito pragmaticamente, vou apresentar uma perspectiva que junta uma visão mais mecânica, dita monetarista, polvilhada com o comportamento psicológico das motivações e da liderança, para saber induzir os comportamentos que pretendemos adequados aos objectivos finais que se pretendem atingir. Numa recente reunião em Oliveira de Frades, diziam-me: "Nem imagina o dinheiro que anda por aí parado nas zonas rurais, e quando ele estiver novamente em circulação o efeito que terá. Os descendentes estão tão aflitos que quando tiverem as heranças na mão, vão pô-lo a circular e vai ser um novo ouro do Brasil".

O problema do nosso país está no imobilismo, das pessoas, mas também do dinheiro, porque a essência da riqueza está na circulação do rendimento. Num número da revista Actual, publicada pela Unicer, o Eng.º Belmiro de Azevedo explica bem o que é criar ou deter a riqueza:

"A criação de riqueza decorre naturalmente de um processo em que as pessoas talentosas, experientes e transparentes estabelecem relações de confiança, são inovadoras, criativas e constroem riqueza. E a riqueza, dependendo do sistema em que se vive, é acumulada numa empresa, numa instituição, numa fundação, e é, ou não é, reinvestida. A parte menos importante é quem detém a riqueza, porque ninguém leva a riqueza para a cova. A riqueza acaba por se transmitir de várias formas, por vezes até de forma pouco ortodoxa. Uma pessoa que tem muito dinheiro e o estraga em grandes jantaradas, está a distribuir riqueza de uma maneira aparentemente incorrecta, mas o importante é que, se tem dinheiro a mais, que o passe para outro lado qualquer. Que o passe para as pessoas que o serviram, para os fornecedores dos equipamentos que ele utilizou, para o dono desse negócio. Portanto, o dinheiro tem é que circular, tem é que passar por um circuito virtuoso. O dinheiro é apenas um elemento para criar riqueza. A riqueza passa de mão em mão. O importante é que o dinheiro circule.”

Os métodos tradicionais atingiram os limites da sua eficácia, em parte porque a maioria das decisões são invadidas pelos sistemas de valores desadequados à realização de uma sociedade sustentável, sendo agora preferível a alocação de recursos para sistemas multiplicadores, do que ver o seu efeito esgotado num primeiro nível imediato. A minha proposta é que se aumente o consumo, pela via do acréscimo de rendimento, não de endividamento e pretendo explicar que isso é possível, a partir do princípio da velocidade de circulação da moeda. Mas, muito importante, que não chega. Devem-se introduzir os valores éticos e espirituais, que são os motivacionais para o sentido em que pretendamos induzir determinados comportamentos. Há que saber adicionar os valores da interdependência, inter-conectividade, partilha, respeito pela natureza e solidariedade. E por isso, alguns modelos parecidos acabam por se esgotar e auto-derrotar.

Se o mundo falhar, será por falta das políticas certas! E de coragem para assumir o diferente.