De: Pedro Figueiredo - "Parabéns atrasados (colaboradores do) Arq.º Souto Moura!"
Com muito humor e simpatia, o Arq.º Siza comentou para a rádio “Gosto muito de ser vizinho de alguém com o Pritzker”.
Das obras de Souto Moura que mais me impressionam, destaco: O estádio de Braga à cabeça. Magnífica estrutura expressiva em betão aparente e sensibilíssima inserção em (improvável) terreno, a pedreira. No fundo é como a Casa de Chá da Boa Nova de Siza: Só um óptimo arquitecto consegue provar à exaustão que qualquer terreno pode ser bom para construir. Seja uma pedreira abandonada ou um conjunto disforme de calhaus...
Depois, a reabilitação do Convento de Terras do Bouro para pousada é outro esforço para levar mais longe a crítica ao sítio, questiona a filosofia do que é ou pode ser “intervir” numa reabilitação. Até ali, ninguém em Portugal se tinha perguntado se uma reabilitação de um edifício não poderia ser antes simular a “fixação de uma ruína”?... Fingir que um edifício novo é uma ruína mantida “perpetuamente” com o aspecto de ruína... e ser Arquitectura nova, afinal.
Por fim, o Metro do Porto, por ser a inovação no método. Aqui o questionamento ao status é obviamente a “intromissão” de um arquitecto num tipo de filosofia de intervenção tradicionalmente reservado a um pensamento “engenheiro”, que é a coordenação, normalização de procedimentos, racionalização gráfica, construtiva e coordenação de especialidades várias, sobretudo de um projecto tão técnico como o será sempre uma qualquer rede de transportes. Provar que as especialidades se submetem à Arquitectura e a “servem”. Todas as especialidades encaixam no projecto do Metro do Porto.
Para quem não sabe que a Arquitectura é um árduo trabalho em equipa, a tendência é para achar que o trabalho é o de um artista solitário, que é “genial” e que desenha coisas de uma vez só com esquissos mágicos... Os media nunca o desmentem. Apresentam “o” arquitecto, apresentam as fotografias da obra “feita”. Nada transparece do “processo”. Da equipa. Dos arquitectos colaboradores. Do trabalho árduo dos engenheiros de especialidades que muitas que asseguram que “a ideia” se torna coisa real. Há uma enorme omissão e desconhecimento
sobre o que é a Arquitectura.
E também é o lado negro da coisa. Que é a precariedade a que os gabinetes em geral submetem os seus colaboradores. Em geral, e o gabinete do Arq.º Souto Moura não é excepção – a cultura do “mundo da Arquitectura” é generalizar o “falso recibo verde” como se de profissional liberal se tratasse quem (também) cumpre ordens, quem colabora em equipa de gabinete, quem usa o material do escritório, quem cumpre horário, etc... Chama-se a isto um “contrato de trabalho” com todos os direitos inerentes incluindo “protecção”. Muitos arquitectos “não sabem” disto. Segundo a lei, só o patrão é que é ”liberal”, os outros não (dura lex sed lex).
Isto, em (quase) nada diminui os parabéns mais do que merecidos ao Arq.º Souto Moura. A justiça das coisas obriga-me a lembrar-me quer do arquitecto coordenador quer dos arquitectos “colaboradores”. Ambos suam as estopinhas, experimentam, desenham, redesenham, corrigem e recorrigem. Todos fazem directas se preciso for para uma Arte que é de facto maltratada pela sociedade que acha que fazemos apenas “uns riscos”, uma coisa gira. A Arquitectura agora atravessa uma crise. Os falsos recibos verdes já eram a crise. A crise antes da crise. Crises à parte: não há crises quando se ganha o Pritzker. Parabéns Souto Moura e colaboradores!
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