De: TAF - "O mistério dos investidores desaparecidos"
José Mildmay coloca aqui algumas perguntas pertinentes às quais vou tentar dar resposta, embora infelizmente de modo um pouco telegráfico por falta de tempo.
1) É conhecido por todos o lastimável estado de significativas áreas de muitas cidades, bem como de muitos edifícios de valor fora dos centros urbanos.
2) É conhecida também a grande procura de espaços (especialmente de habitação e para arrendamento) no centro das cidades, sem que haja oferta adequada.
3) O tema da reabilitação urbana tem vindo a ser debatido e divulgado há já muitos anos, e está agora na moda. Até a CIP realizou um estudo sobre Regeneração Urbana, a que recentemente deu grande destaque mediático.
Neste contexto, como se explica que o volume de obras de reabilitação em Portugal seja tão pequeno? Como se explica que no evento em causa, numa sala cheia, tenham estado pessoas de todas as áreas de intervenção (arquitectos, engenheiros, senhorios, mediadores, potenciais inquilinos, ...) excepto investidores? Nem um? Os investidores viverão num mundo paralelo onde a informação não chega? Junte-se a isto a minha experiência já com muitos anos de contacto directo com dezenas de potenciais investidores, apresentando projectos concretos. Juntem-se experiências semelhantes de muitas outras pessoas, que sei existirem, igualmente com sucesso limitado.
Podemos em teoria admitir que os nossos projectos são muito maus e portanto afastam qualquer investidor sensato. Ou que somos totalmente incapazes de divulgar as oportunidades de negócio e os eventos que organizamos. Será isso realmente provável? Eu estou convencido que o problema está mais do outro lado, principalmente por uma razão: nem sequer para criar e analisar em conjunto operações de reabilitação se consegue sentar um potencial investidor à mesa com promotores sem capital próprio. Nem que fosse para ao fim, depois de ponderada uma eventual parceria, dizerem que não. Eles pura e simplesmente não discutem o caso. (Há sempre notáveis e honrosas excepções, não quero também generalizar demais.)
A motivação principal para um investidor é obter lucro. Dantes ainda existiam aplicações financeiras de risco baixo com taxas razoavelmente atractivas que, à falta de alternativas, seriam a escolha normal. Agora o sistema financeiro não propõe soluções interessantes. Daí que a procura activa de bons negócios, com o equilíbrio adequado risco/remuneração, seja uma necessidade de quem tem liquidez para aplicar.
Continuando a generalizar um pouco, eu diria que para quem está dentro deste tema da reabilitação parece óbvio que há bons negócios à espera apenas de capital. Ao contrário, para os detentores de capital parecerá evidente que não há oportunidades potencialmente lucrativas que sejam minimamente sólidas. É a "bolha do imobiliário", a "crise", a suposta "falta de procura", etc. Há aqui, portanto, um evidente problema de comunicação. Não atribuo culpas a ninguém, limito-me a fazer o melhor que sei para o ultrapassar.
PS: Eis um exemplo ilustrativo. Há pouco tempo, quando a CIP publicou o tal estudo, solicitei apoio à Direcção da CIP no sentido de estabelecer contacto com potenciais investidores nesta área, já que as tentativas que tenho vindo a fazer nas relações que possuo se têm revelado pouco frutuosas. A resposta da CIP foi a de que o seu papel se esgotava na publicação do estudo e não incluía a divulgação de oportunidades concretas de negócio junto de detentores de capital que eventualmente conhecesse... É um bom retrato de Portugal.
PS2: Outro fenómeno, que deverá ser um bom caso de estudo para sociólogos, é a extraordinária renitência em investir de tantos portugueses com grande património pessoal e até envolvidos em actividades de cidadania com muito mérito, em particular no Porto. Quando são convidados para estudar parcerias para novos negócios, escusam-se com simpatia e remetem para investidores institucionais (que não têm o perfil minimamente adequado para as propostas em causa). "Dão as tácticas", mas arriscar dinheiro deles é que não.