De: José Ferraz Alves - "Governo quer criar mais empregos fora do País"
- Governo quer criar mais empregos fora do País, Diário de Notícias, 2011.02.11
Não, Portugal tem é de criar empregos no país, importar empreendedores e fazer retornar os seus emigrantes. Ainda de acordo com a notícia: “…se em Portugal não há emprego incentiva-se a criação de postos de trabalhos nos mercados emergentes.” E dão-se benefícios fiscais para o efeito (???). Políticas para fomentar a saída de mais portugueses? Já somos 10 milhões cá e 4,5 milhões lá fora, continuemos o êxodo. Está mal. E errado. Agora até a Sra. Ministra da Cultura recebe 5 milhões de euros para promover a exportação de cultura. Está tudo doido?
O exagero de políticas de promoção da internacionalização e das exportações aumenta a desigualdade social, que é o nosso grande problema, porque imobiliza o capital em poucos, muito ricos. Para mim, desenvolvimento é ter emprego, qualificado e altamente remunerado, hoje e na geração das minhas filhas. Se a despesa pública e a intervenção do Estado fossem virtuosos, Portugal seria hoje um país risco. Mas Portugal é um país pobre por desigual na distribuição de rendimentos e por uma simples razão, só via salários pagos em Portugal, decentes, se consegue uma adequada redistribuição de rendimentos. Os lucros das actividades no exterior, potenciadas por salários aí pagos, acabam por cair na conta de 2 ou 3 accionistas da empresa, que o aforram no exterior e não vão consumir mais bens essenciais por razões naturais, perdendo-se o efeito de circulação do dinheiro no país.
Tem de se fazer precisamente o contrário. O nosso problema está cá dentro e a solução passa por dinamizar o mercado interno. Belmiro de Azevedo, em 2006. “aproveitou a oportunidade para sublinhar o facto de que para fomentar a inovação é também necessário que Portugal produza resultados, porque, de outra forma, «não haverá investimento, mas despesa». Para o patrão da SONAE, é preciso ainda que Portugal se abra à «imigração», como o fez por exemplo a Irlanda, e que seja capaz de fazer retornar os emigrantes.”
O nosso principal problema é o imobilismo, neste caso até de capital. Prometi a mim mesmo que em 2011, por cada crítica, apresentaria pelo menos duas soluções. Neste caso quatro:
1) A importação de empreendedores
Mais importante do que atrair para Portugal investimento estrangeiro não seria atrair empreendedores que estão fora do país? E pessoas com alto nível de formação?
Em termos históricos, os grandes mestres já surfavam na onda da globalização há mais de 3 séculos. Por exemplo, a Suécia possuía muito minério de ferro, água para eixos motrizes, florestas para fazer carvão, mas não tinha mão-de-obra que dominasse a técnica da forja, da produção efectiva. O rei, então, mandou buscar centenas de famílias à Bélgica, os Valões. Moveleiros famosos da corte de Luís XIV foram importados por Catarina, a Grande, da Rússia. Essa importação de mestres garantiu a esses países distantes, frios, e até então pobres, produzir armas, ferramentas de trabalho, carroças, embarcações melhores do que os vizinhos, etc., o que resultou na conquista de enormes extensões de terras.
A Suécia dos anos 1750 ia do topo da Escandinávia até ao Norte da Itália e da Turquia. A Rússia, pouco depois, tinha a mesma extensão, chegando onde hoje é a Alemanha, no Ocidente e à Sibéria e Mongólia, no Oriente.Muitos artistas e cientistas, que tornaram possível o domínio de outros povos, eram estrangeiros, como Américo Vespúcio, italiano que trouxe terras americanas para a coroa espanhola; De Geer, belga que trouxe a mestria da forja para a Suécia; Leonardo da Vinci trouxe a anatomia e avançados cálculos de pontos para a França. Discípulos de Américo trouxeram para a Espanha ouro e prata, o que permitiu a riqueza dos museus e prédios, e mais tarde centenas de hotéis que hoje atraem milhões de turistas.
Os discípulos de De Geer forjaram os canhões que conquistaram meia Europa, de onde trouxeram tesouros e os profissionais, que transformaram aquele minúsculo e pobre país numa grande potência industrial.
Os sucessores de Da Vinci fizeram as pontes que logo unificaram a França, permitindo uma eficiente rede de estradas e de canais, condição para a rápida expansão da sua agricultura.
A existência de bons profissionais era tão vital para o progresso das aldeias que ainda hoje corre uma história de que, numa vila da Noruega, onde haviam dois padeiros e um só talhante, esse cometeu um crime, sob a vista de um padeiro. Um teria uma pena de oito anos de prisão e o outro apenas seis meses. Pois o juiz, para não prejudicar a aldeia, condenou o padeiro a oito anos e o talhante ficou com os seis meses, porque sem o único, a aldeia não conseguiria subsistir.
2) A manutenção das competências em Portugal
“Pegando nas palavras do Sr. Amancio Ortega, que referiu que por cada emprego que criava na China estava a defender um em Espanha, pergunto em que medida é que o processo de expansão de empresas para Angola poderia contribuir para a criação de empregos em Portugal? Por exemplo, o BPI, com a criação em Lisboa de um Gabinete para o Apoio ao investimento em Angola, é um exemplo desta estratégia. Outro cenário seria seguir uma estratégia de triangulação, como por exemplo, uma empresa norte-americana de correio expresso, que para se lançar em Angola decidiu primeiro investir no mercado português, que será a base da operação. Também tem sido esta a estratégia seguida por escritórios de advogacia espanhóis, que começam por abrir escritórios de representação em Portugal para depois se lançarem em Angola.
Porque desenvolvimento não significa, por si só, ter centros de decisão em Portugal – porque isso é remunerar bem meia dúzia de administradores – mas sim ter empregos superiores e médios qualificados e bem remunerados. E com isso, a dimensão do valor do próprio mercado interno cresceria, potenciando a base de partida para as empresas nacionais. Logo, entendo que haveria que desenvolver centros de competência em Portugal. O bem-estar em termos colectivos e sociais só se alcança por uma consciência responsável, favorável a atitude laboriosa e com metas de muita ambição, em relação ao que queremos ser e onde queremos estar a prazo de 5/10 anos, em condições de sustentabilidade futura.
3) Uma nova forma de política pública de incentivo ao investimento em Portugal
Mais do que trabalhar com investimento externo, eu tenho trabalhado com investidores externos, porque de pessoas se tratam. E essas pessoas procuram em Portugal sobretudo know-how que, na prática, são pessoas, competentes. Essas pessoas que eu conheci, que estão a investir de forma espontânea em Portugal, não o fazem por causa de incentivos financeiros e fiscais. Porque não desfocalizar da oferta de incentivos mas procurar as vias para que essas pessoas gostem do nosso país e cá queiram investir? Depois, temos de lhes dar esse know-how que eles procuram, que está a germinar nas nossas universidades, que são excelentes. O resto do dinheiro ficaria para os pequenos projectos de empresários, nacionais ou não nacionais, sob a figura do private equity, apoiando a 100%, mas recolhendo o retorno para auto-sustentação do modelo de financiamento.
Basicamente, não acham que se tivermos muitas pequenas empresas as grandes chegam a seguir?
E que tipo de acções públicas de incentivo ao investimento? Tal como foi feito em Israel, Filipinas e depois na Tanzânia, por exemplo, com o objectivo de atrair bons profissionais, com equipamentos mas com pouco capital, algo parecido com os “polígonos industriais” da Espanha. O país cedia uma grande área de terreno e garantia alta-tensão, redes, esgotos e uma pequena escola industrial numa área urbanizada (algumas já existem), distantes, mas com boas estradas. Podiam ser construídas parcelas de 150,300,450 e 900 m2, que seriam depois alugadas a um valor simbólico por 3 a 5 anos e com opção de compra pelos locatários. Cada um fazia a instalação eléctrica e hidráulica aparente, a partir do quadro principal, consoante as suas necessidades. Nestes países, Escandinavos, Alemães, Polacos, retornados e locais, chegaram com as suas velhas máquinas, trabalharam 12h/d e serviram muito bem os mercados ávidos por qualidade, começando depois a exportar para os países vizinhos.
Lá, especialmente os Nórdicos, usaram a matéria-prima e know-how local para, com a sua qualidade, exportar para os seus amigos no país de origem. E os locais, ao visitar colegas no mesmo 'polígono', aprenderam novas técnicas e progrediram. A maioria formou Associações de Empresários, frequentemente em 'clusters', que conseguia para lá trazer empresas de manutenção de alto nível, palestrantes, etc. E uma Instituição Financeira com visão poderia ter um 'venture-capital' para estes experimentados profissionais, que já tiveram êxito em seus países ou outras regiões, mas vêem agora a concorrência de low-cost-countries e os 'abençoados' por incentivos, matarem o seu negócio. Ou os que têm uma inovação mas não conseguem arrancar por falta de capital de maneio. E um Venture-capital bom é o que tem no seu quadro, ou como consultor externo, pessoas que avaliam não só o risco e o financiamento, mas também o real potencial de êxito, considerando as reacções de outros que não querem perder suas fasquias.
Qualquer Governo teria muito êxito na sua política económica, se atentasse mais a este potencial de sinergias entre os anseios de pequenos investidores, recursos ainda por potenciar na banca e nos Sistemas de Incentivos e a competência prática de empresários silenciosos, mas com uma grande rede de contactos.
4) A regionalização e a descentralização das Administrações das Empresas Públicas
Para cada uma das 5 Regiões, em vez de encavalitados todos em Lisboa, como fomento de novos pólos de dinamização da distribuição do rendimento.