De: José M. Varela - "O Porto e a Cultura"
É hoje consensualmente reconhecido que as políticas culturais ao nível local são fundamentais para a qualidade de vida da população residente, para a qualificação dos recursos humanos essenciais em qualquer processo de desenvolvimento social e económico das localidades, assim como para a sua capacidade de atracção turística. Além disso uma boa oferta cultural é essencial para gerar fluxos de turismo na Baixa, aumentar a sua visibilidade e por acréscimo também gerar maiores receitas para o comércio local. Isto é elementar em qualquer cidade de província em Espanha.
Promover o desenvolvimento social não constitui assim uma tarefa lateral e separável das outras atribuições e competências das autarquias e muito menos numa cidade que se pretende afirmar como motor do desenvolvimento regional, como é o Porto. Pelo contrário, a promoção do desenvolvimento social é também promotora do desenvolvimento económico e da coesão social.
Induzir o desenvolvimento significa assim investir na criação de qualificações e capacidades permanentes de pessoas e comunidades, o que se faz nomeadamente através de políticas culturais onde se incluem complementarmente a promoção da cultura humanística e da cultura científica.
No entanto após quase nove meses após a tomada de posse do actual Executivo camarário, presidido pelo Dr. Rui Rio, o panorama é desolador e o Pelouro da Cultura a quem competia assumir esta competência está mais invisível que D. Sebastião após a batalha de Alcacér-Kibir. Com efeito, durante quase um ano não foi ainda delineada ou apresentada nenhuma iniciativa ou projecto que visasse inverter o progressivo deficit cultural que se tem vindo a instalar na cidade.
A situação actual na cidade do Porto caracteriza-se pelo desprezo pela "massa crítica" da cidade, nomeadamente pelos seus criadores e agentes culturais (será por a "massa" ser demasiado "crítica", algo com que Rui Rio definitivamente embirra?). Desprezo ainda pela articulação com a Universidade do Porto, a principal instituição da cidade, com o programa "Porto Cidade da Ciência" reduzido reduzido a um mero slogan publicitário sem nenhum conteúdo.
Preocupante é também o desprezo a que foram votadas as estruturas culturais municipais, que sobrevivem cada vez mais sem meios técnicos e humanos para realizarem as suas actividades. É o caso nomeadamente da Biblioteca Municipal do Porto. Fundada por Alexandre Herculano esta instituição, que guarda alguns dos documentos mais importantes da cultura portuguesa, debate-se com uma grande carência de meios para cumprir a sua missão e prestar serviços de qualidade aos seus utentes. Uma parte importante do acervo está retirada da leitura e não pode ser consultada porque não há meios para proceder ao seu restauro, situação que acarreta grandes prejuízos aos leituras, nomeadamente a quem elabora trabalhos de investigação. O projecto de ampliação das instalações parece também ter sido abandonado o que faz com que a Biblioteca esteja em vias de prescindir do Depósito Legal por falta de espaço disponível.
Os núcleos museológicos da Câmara foram também votados a uma situação de semi-obscuridade, sem iniciativas próprias nem promoção. Numa recente entrevista ao "Primeiro de Janeiro" o vereador da Cultura avançou mesmo a hipótese de as encerrar, esquecendo que existem compromissos decorrentes de doações e legados que a CMP tem a obrigação de cumprir. A casa de António Nobre, como lembrou hoje Manuel Pina, corre o risco de ter o mesmo destino da casa de Garrett em Lisboa (certamente apenas porque a CMP não deve saber quem foi António Nobre). Mesmo as poucas coisas que se vão fazendo são atiradas para uma semi-obscuridade e não são devidamente divulgadas e promovidas (e o hoje o marketing é fndamental nesta área). É o caso duma importante exposição sobre a figura de Guilhermina Suggia, na casa-museu Guerra Junqueiro e que nem sequer aparece na abertura do site da CMP. Este problema nem sequer é exclusivo da Câmara do Porto, uma vez que o Ministério da Cultura parece também condenar à mesma sorte estruturas da sua responsabilidade como o Museu Nacional Soares dos Reis, o Centro Português de Fotografia e o permanentemente encerrado Museu de Etnologia.
O mais recente caso é o Rivoli. A questão da concessão é apenas a consequência, porque a verdadeira causa é a vontade de extinguir a Culturporto. Com a criação da PortoLazer, numa bizarra mistura de desporto com espectáculos de animação, a Culturporto, depois de ao longo dos últimos quatro anos ter sido gradualmente asfixiada, ficou restringida ao Rivoli (a que certamente não serão alheias algumas divergências antigas com Isabel Alves Costa). Agora será naturalmente extinta por deixar de ter objecto de trabalho e sem que o presidente da CMP tenha honestamente admitido que era esse o seu objectivo através duma política objectiva de sub-aproveitamente do Rivoli..
O futuro do Rivoli é assim uma incógnita e a experiência mostra que as expectativas criadas à volta da chamada "sociedade civil" têm sido demasiado optimistas. O problema tem estado na falta de sintonia entre os que querem (os criadores) e os que podem (os financiadores). Agora se este executivo se declara incompetente para gerir uma estrutura simples como o Rivoli, será que tem alguma competência para gerir uma Câmara Municipal?
Nota Final: Como é que os turistas estrangeiros vêem a cidade do Porto? Leiam aqui.