De: Pedro Figueiredo - "Graffitis, murais e Arquitectura"
Faço desde já uma declaração de interesses. Chamo-me Pedro Figueiredo e sou Arquitecto.
1 - Sob o puro ponto de vista de um criador de Arquitectura, alguém que intervém na cidade de forma racional, organizada, oficial e criativa, é evidentemente um abuso toda e qualquer criação, feia ou bonita, que adultere sem o consentimento do autor a obra que já lá estava - a obra de um qualquer Arquitecto, Engenheiro ou Desenhador.
2 - Por outro lado, é no mínimo interessante tudo o que tenha a ver com alguma espontaneidade em novas apropriações do espaço urbano, que deve ser cada vez mais diverso, inclusivo, democrático, multi-cultural, aberto à intervenção cidadã, artística ou outra. Os graffitis são apenas coisas chatas, feias e pouco rebeldes ao fim e ao cabo. São a "rebeldia" pobre e "possível", quando não passam de tags, mensagens sem mensagem.
3 - Os murais tipo PREC-MRPP, com qualidades gráficas inegáveis, estão nos antípodas dos tags, pela sua força, expressão, qualidade intrínseca. Bons graffitis, ou seja, com qualidades de expressão, mensagem e força urbana há poucos. Eu digo que o problema não está nos graffitis. O problema está na falta de qualidade de tags e graffitis. Qualquer graffiti com qualidade é bem vindo, sob o meu ponto de vista. Agora, se são legais ou ilegais já me transcende. mas como é evidente que a sua principal qualidade é serem ilegais... Legalizar o graffiti é uma machadada na filosofia de "pedrinha na engrenagem" que parece ser a "filosofia" do graffiti... "Se eu não chateio ninguém com o meu graffiti, para que é que que graffito?", perguntar-se-iam os graffiters.
4 - Por outro lado, ridículo será pensar que se pode controlar os graffitis, delimitando "muros" para graffiti, ou "ensinando" a graffitar. O que é espontâneo pertence ao domínio do Espontâneo, ponto final, não de pode controlar. Aliás, a qualidade de tags e graffitis é essa: são incontroláveis, não são artísticos, não são bonitos nem feios, antes pelo contrário, nem sequer põem em causa cânones de beleza/fealdade... nem questionam sequer ou são "rebeldes". São incontroláveis. Talvez tenha de ser assim.
5 - Também os municípios ao longo dos anos quiseram controlar outros movimentos urbanos: as ocupações de casas, coisa mais que justa, é evidentemente mal vista pelos municípios que preferem deixar cair durante 20 anos para depois vender a preços especulativos as casas recuperadas aos ricos que as possam pagar. Também a Câmara do Porto em 1975 preferiu acabar com o movimento SAAL, que lutou pela construção de habitação popular no centro da cidade, de modo a voltar a poder "controlar" algo "incontrolável"... Sobretudo, como é fácil de ver, é absolutamente necessário impedir as pessoas de permanecer a ocupar os lugares onde já viviam, já que para a municipalidade estes lugares centrais são os melhores para fazer os melhores negócios com as classes favorecidas para serviços e habitação cara.
No meio disto tudo, o graffiti é o menos importante. Nesta tragédia que é a morte da cidade do Porto eu preocupo-me mais em saber porque raio é que eu estou aqui no Porto a pagar 100.000 euros por um T2, quando tive a possibilidade e rejeitei, talvez por estúpida e quixotesca nostalgia desta ruína urbana que é o Porto, rejeitei - dizia - um T3 por 85.000 euros em Vila Nova de Gaia - a verdadeira sede da Área Metropolitana. Este é o drama. Qualquer graffiter saberia ser melhor presidente da Câmara do que Rui Rio, tenha o Senhor os votos que tiver. Eu voto nos graffiters.
Pedro Figueiredo, arquitecto