De: António Alves - "Resultados: uma análise sócio-política"
Ao contrário do que alguns tentam fazer crer, a vitória de Rui Rio não se deve ao ‘povo’. O núcleo duro de votantes de Rio é uma elite. A elite financeira e económica, a burguesia tout court, que habita principalmente em Nevogilde, Foz, Lordelo do Ouro, Aldoar, Massarelos e Cedofeita. As maiores percentagens de Rio foram obtidas nestas freguesias. Nevogilde, paradigmaticamente, deu-lhe uma votação de 77%; a Foz 59%. Lordelo, mais eclética, mas que inclui a Gomes da Costa, o Cristo Rei e parte significativa da Av. da Boavista, premiou-o com mais de 52%. Cedofeita também 52%. Em Aldoar, mais classe média, também com bairros sociais, mas que inclui igualmente parte da Av. da Boavista, a Fonte da Moura, António Aroso e toda a zona do Garcia da Orta até à junta de Nevogilde, obteve 46,5%. No total, nestas freguesias somou 24 562 votos. 39,3% da sua votação. A grande freguesia do oriente e o centro histórico, significativamente as mais pobres, discriminadas e abandonadas partes da cidade, votaram maioritariamente em Elisa Ferreira. Mas é inegável que Rio não venceria sem parte considerável da classe média que resta (Paranhos, Ramalde) e de muita gente dos bairros sociais. A estratégia da coesão soldada a tinta plástica resulta. Significativo é também a transferência de muitos votos comunistas, e até do BE, para Rio, como demonstram a diferença entre a votação para a Assembleia e a Câmara. Afinal, os extremos tocam-se, não é? Esta é uma cidade dual e isso reflecte-se nos resultados eleitorais.
O que me intriga é que este homem, com uma excelente estratégia eleitoral, tenha uma visão tão estreita da cidade e, parafraseando António Lobo Xavier, seja um incapaz de qualquer “comunicação de sonhos” e se limite a ser “um homem muito prático”, que “não fala de grandes projectos, não exibe um grande conhecimento do mundo”. Reflecte, no fundo, o Porto actual e a sua burguesia. Ao contrário do que advoga Rui Moreira no seu recente livro, o frenesim político pós 25 de Abril desta burguesia não se deveu ao seu intrínseco liberalismo, pois este há décadas e décadas que desapareceu. Deveu-se ao seu atávico terror em perder privilégios e profundo horror à modernidade. Aliás, um arquétipo desta burguesia é o sempre presente advogado Miguel Veiga.
Também é verdade que a maioria dos portuenses votantes não votou em Rui Rio – 69 mil eleitores contra 62.500 escolheram outras opções. Nenhuma vitória se deve ao ‘povo’ quando a maioria do povo não votou nessa opção. Mas o sistema eleitoral autárquico é este e eu até concordo com ele. Resta-nos democraticamente combater a gestão sem “grande conhecimento do mundo” desta Câmara.