De: José Ferraz Alves - "Nicolas Sarkozy quer incluir felicidade no PIB e outras coisinhas mais"
Eu sou um grande fã da expressão “pensa-se a partir do que se escreve e não o contrário”, por isso, de vez em quando, em liberdade, têm de levar com um conjunto de pensamentos meus. Apenas pretendo sinalizar para um debate que já está em curso, que não tenho visto suficientemente destacado em Portugal, que significará uma grande mudança na definição de políticas económicas, sociais e ambientais para a próxima década e que coloca Nicolas Sarkozy no mesmo patamar revolucionário do que Barack Obama, ou, melhor dito, que destaca que a influência de Carla Bruni sobre o mundo atinge já o mesmo patamar da de Michelle Obama. E ainda bem que assim é. Esperemos para ver se esta boa onda feminina de mudança também nos atinge aqui no Porto…
Nicolas Sarkozy quer reformular o cálculo dos indicadores económicos: «A França vai lutar para que todas as organizações internacionais modifiquem as suas estatísticas», disse o presidente francês durante a apresentação de um relatório dirigido à comissão liderada pelo Nobel da Economia, Joseph Stiglitz, sobre o progresso económico e social. Sarkozy disse que «há muito tempo que há um problema com o que calculamos e com a maneira como utilizamos», acrescentando que, «durante anos, as estatísticas mostraram um crescimento económico cada vez mais forte», mas que «põe em perigo o futuro do planeta e destrói mais do que cria». Uma medida aplaudida pelo Nobel Amartya Sen, que considera que, apesar de o PIB «não ser errado», «é utilizado de forma inadequada», em particular quando aparece como «uma medida do bem-estar económico».
O desenvolvimento económico é diferente de crescimento. Mas não há desenvolvimento sem crescimento económico. Para o atingir, é necessário utilizar os meios financeiros desse crescimento económico para satisfazer as necessidades das pessoas, desde as mais básicas como a saúde, a educação, a segurança, até à oferta e disponibilidade de cultura. Só depois de satisfeitas essas necessidades, é que podemos falar de desenvolvimento. O crescimento é extremamente importante para fazer reduzir a pobreza, sobre isso não há qualquer dúvida. Mas pensar que a única forma de reduzir a pobreza é a promoção do crescimento leva os responsáveis pela implementação destas políticas a percorrer o caminho teórico e mais curto: a construção de infraestruturas que promovam a industrialização e a mecanização. Além disso, na sua busca pelo crescimento, os responsáveis pelas políticas concentram esforços para desenvolver instituições já estabelecidas, que podem ser as causadoras da própria pobreza.
Será que é pela habilidade em produzir e consumir que se deve medir o sucesso de uma nação, ou pela qualidade da vida e a felicidade do seu povo? Sobretudo, em relação a uma humanidade que está a consumir 30% a mais do que a capacidade de renovação da Terra, o que inviabiliza a sustentabilidade do planeta? Entretanto, mesmo com tamanha devastação de recursos naturais, os conflitos entre as nações multiplicam-se e a insatisfação da humanidade é cada vez mais evidente. Por exemplo, nos EUA, o PIB aumentou 300% nos últimos 50 anos mas, no mesmo período, o número de divórcios duplicou, o de suicídios entre adolescentes triplicou, o de crimes violentos quadruplicou e o da população presa quintuplicou.
Imagine-se, entre as obrigações básicas do Governo, como garantir o acesso à saúde, educação, trabalho e segurança, se estivesse também definido o de proporcionar a felicidade das pessoas. Isso é realidade no Butão, um reino que preferiu ir além do PIB - índice que mede a quantidade de riqueza produzida por determinada nação sem, no entanto, considerar as condições humanas da sua produção -, tendo adoptado a FIB – Felicidade Interna Bruta. Trata-se de um índice que combina vários indicadores e, mais importante de tudo, que depois fundamentam as decisões políticas do país que têm de estar direccionadas principalmente para a felicidade da população. Os indicadores que compõem o FIB são nove: bom padrão de vida económica, boa governança, educação de qualidade, boa saúde, vitalidade comunitária, protecção e conservação ambiental, acesso à cultura, gestão equilibrada do tempo e bem-estar psicológico. Estes indicadores permitem que o Governo conheça a realidade que está por detrás dos números, garantindo o desenvolvimento integral de uma sociedade. O rendimento nacional não é procurado pelo seu bem em si, mas para aumentar a qualidade de vida, para obter a felicidade baseada em ética, em cultivar relacionamentos entre a diversidade populacional e com a natureza.
As outras coisinhas são:
- - Continua-se a discutir a questão da gestão autónoma do aeroporto Francisco Sá Carneiro sem nada trazer de novo para debate, pelo que sugiro que se veja o que a Associação de Cidadãos do Porto propôs como modelo eficaz para a auto-regulação. Para chegar aqui, tive de lançar o Sarkozy, a Carla Bruni, o Butão…
- - O PROT – Plano Regional de Ordenamento do Território, por omisso em relação à linha ferroviária do Tua, é um documento ferido de falta de democracia e é perigoso para esta causa.
- - A propósito do PROT, que não olha para a Galiza e para Castela-Leão, que tal uma efectiva linha ferroviária a ligar a Corunha, Santiago, Vigo ao Porto, como a única exigência que temos de fazer aos poderes públicos para a integração das comunidades destas regiões? Sabem quantos dias são precisos para ir de caminho-de-ferro da Corunha ao Porto? Conhecem meio de transporte mais agradável e eficaz para fomentar a interacção e o conhecimento das populações? Acham que são as camionetas, a olhar para os penteados, carecas e caspa dos da frente? Não acham que os interesses das empresas de camionagem foram já suficientemente remunerados? E se calhar esta simples realidade explica porque Galiza e o Norte ainda não estão integrados como deviam. Eu não sou como a senhora que disse que “não quero ver os espanhóis misturados com os portugueses”. Eu quero, vai-nos fazer bem.
José Ferraz Alves
Rede Norte