De: Maria Augusta Dionísio - "Aleixo..."
Os meus melhores cumprimentos.
Depois de uma longa ausência, julgo oportuno voltar ao tema do meu bairro, sobretudo em resposta a algumas notícias que dão conta que a solução final para o Aleixo está para próximo. Aproveito ainda, se me permitem, para demonstrar a minha total insatisfação com o texto da autoria de Cristina Santos. Trata-se, à vista desarmada, de uma opinião que enferma claramente de desconhecimento da realidade, de uma série de estereótipos e de muito racismo e pouca tolerância.
Para começar, o Aleixo não se situa em Campanhã (como se depreende do título), daqui que toda a descrição que é feita sobre os tormentos que os moradores das zonas vizinhas, privadas, padecem com a escumalha que habita no bairro é falsa. Talvez a Sra. Cristina Santos se refira à realidade daquela zona da cidade, à zona de Campanhã onde de facto, como em Lordelo do Ouro, o número de bairros sociais (ou camarários) é significativo. Se assim é, o melhor será então demolir também o bairro do Cerco do Porto, do Lagarteiro e outros que tantos problemas trazem aos cidadãos cumpridores que habitam nas zonas privadas da cidade. O melhor será proceder-se à higienização da cidade, à maneira hitleriana. Constrói-se uns campos de extermínio, manda-se para lá esses criminosos, e os bons cidadãos poderão desfrutar da cidade tranquilamente. A brincar a brincar, esta solução está já em marcha e a demolição do meu bairro é um bom exemplo disso.
Neste espaço escreve gente que considero inteligente e bem formada. Por isso, não acredito que tão ilustres participantes deste espaço acreditem que o problema do tráfico de droga será resolvido com a demolição do Aleixo! Se alguém acredita, aconselho a observar as consequências da demolição do S. João de Deus, pois o problema principal transferiu-se para outras zonas e assim será quando um dia o Aleixo acabar. A demolição do Aleixo é, pois, um processo de higienização da cidade, que procura libertar as zonas nobres das populações indesejáveis. Hoje é o Aleixo, no futuro será a Pasteleira, o Rainha D. Leonor, ou qualquer outro. E o argumento a utilizar será sempre o mesmo, na medida que infelizmente o tráfico de droga se vai transferir para outros bairros onde os factores que o potenciam existem aos milhares: desemprego, baixa instrução, más condições de vida, etc...
Muita gente não sabe (ou tenta ignorar), mas o Aleixo nem sempre foi o que é. A década de oitenta do século passado explica a realidade actual. Nessa altura muitas indústrias faliram, o desemprego era assustador e a inexistência de apoios sociais (como aqueles que existem hoje) atirou muita gente para uma solução que, sendo indigna, respondeu de imediato à fome dos filhos. É claro que à custa de muita miséria e desgraça, mas penso que muito mais grave são os crimes que certos engravatados e com colarinhos brancos cometem, só para enriquecerem ainda mais. A esses a sociedade não reprime nem castiga com a mesma severidade. Por isso, quando li o texto de Cristina Santos, mais uma vez percebi o porquê de algumas políticas darem certo nesta cidade. Há muito boa gente que aplaude o Presidente Rui Rio de pé quando este tem afirmações como "vamos tratar dos pobres antes que eles tratem de nós" ou quando propõe soluções finais para os arrumadores ou, neste caso em concreto para os moradores do Aleixo.
Quando seria de esperar solidariedade sobretudo com os idosos, não falo de mim. Falo dos meus avós, que desesperam sempre que ouvem falar da demolição porque, ao contrário do que diz o Presidente ou do que alguns aqui escrevem, nem todos os que querem ficar no Aleixo estão ligados ao tráfico de droga. Mais do que ligados ao bairro, estão ligados ao Aleixo. Vivem numa zona privilegiada da cidade, junto ao rio, junto a tudo. Os seus amigos vivem aqui, os seus vizinhos. os seus familiares vivem aqui perto ou mesmo no bairro. Os que já morreram estão no cemitério de Lordelo do Ouro. O médico de família é do centro de saúde de Lordelo. Vão à missa à igreja de Lordelo ou ao Culto na Rua do Ouro. As suas relações de amizade, convivência estão aqui estabelecidas há mais de trinta anos. Será que alguém tem direito a passar por cima de tudo isto com um bulldozer???
Termino, perguntando a quem quiser responder. Será que as promessas, os compromissos escritos têm prazo de validade? Será que um documento oficial, escrito em papel timbrado da Câmara Municipal do Porto, não tem nenhum valor? Será que um verdadeiro líder não é capaz de se sentar a uma mesa e ouvir aquilo que estes moradores querem para o seu futuro? Será tão difícil fazer hoje aquilo que por razões meramente eleitoralistas fez em 2001?
No Sábado passado esteve em visita ao Aleixo a Dra. Elisa Ferreira. É certo que acredito cada vez menos nos políticos, mas que diferença de estilo... Estamos na presença de uma grande senhora. Não o digo pela promessa que aqui fez, pois de facto foi exactamente a mesma que Rui Rio também nos fez um dia. Digo-o porque, como mulher, julgo estar na presença de uma pessoa corajosa, inteligente e com vontade de fazer muito pela cidade.
Maria Augusta Dionísio