De: José Ferraz Alves - "Colonialismo, por culpa de quem?"
Caro António Alves
Agradeço a importante menção que faz a esse acordo de um Município com uma Grande Empresa – EDP - que vai explorar recursos que ainda são de todos nós. Porque aquilo que nos afecta a todos não são de facto políticas e estratégias teóricas debitadas em programas de televisão ou em seminários ou conferências. São os múltiplos actos de gestão de recursos e de decisões que são tomados diariamente. Por isso me insurjo tanto quanto vejo participações maciças em debates e colóquios sobre temas como os investimentos públicos ou entre opções entre maior ou menor grau de descentralização nas decisões dos governos centrais e depois assisto à passividade e ligeireza como aceitamos as acções diárias, e sobretudo, à nossa pouca capacidade de apresentação de projectos alternativos.
Eu considero que o único não culpado de toda essa situação que apresenta é de facto a EDP, que se limita a defender os interesses dos seus accionistas. E só demonstra que tem uma excelente equipa de gestão. Mas, e o que dizer de quem aceita esses acordos e da sua incapacidade de propor alternativas mais capazes para o desenvolvimento da sua região?
Estamos na época certa para discutir projectos para o futuro das nossas comunidades e não seria de perguntar o que cada um dos candidatos autárquicos dos municípios da bacia hidrográfica do Douro tem para apresentar? E, já agora, o que cada um de nós tem para propor para o desenvolvimento da sua região? Ninguém nos proíbe de o fazer, junto da CCDRN – Comissão de Coordenação para o Desenvolvimento Regional do Norte, das Direcções de Turismo da Região do Douro, dos deputados da região, etc.
Eu tenho uma proposta muito simples e alternativa às indemnizações das barragens para a Região do Douro: o aproveitamento das magníficas linhas de caminho de ferro para o desenvolvimento de um comboio turístico. Já existe uma oferta organizada em todo o Norte de Espanha, pela FEVE, que é a sua empresa ferroviária de vias métricas. Têm comboios de passageiros, mercadorias e turísticos e os seus clientes pagam bilhetes caros para viajar pelo Norte de Espanha. Sob o objectivo de integrar as duas euro-regiões, não acham que os podemos desafiar a descer até ao Porto-Leixões, ligá-los ao terminal de cruzeiros, e seguir pelo Douro até Salamanca? Até porque seria a forma mais simples e rápida de colocar este produto em funcionamento.
Porque não se trabalha um pouco mais, porque não deixamos esta mentalidade de aceitar pagamentos e esmolas de curto prazo, que nos exigem pouco esforço, e não enveredamos por efectivos projectos estruturantes e de desenvolvimento de uma região? Como muito bem me referiu ainda ontem um amigo, o fluviário de Mora está a ser um sucesso, o Centro de Interpretação da Batalha de Aljubarrota está a seguir o mesmo caminho… No turismo, a oferta cria a procura. É preciso investir de forma estruturada e com visão e assumir esse risco. Há algo muito errado no desenvolvimento das nossas regiões, em que a capacidade de captação de fundos, nomeadamente de depósitos de emigrantes dessas regiões, depois não se reverte em projectos de investimento para o seu desenvolvimento.
Já agora, eu moro no Porto, e não concebo como se deixou cair um projecto como o de aproveitamento da energia das ondas nos molhes da Foz do Douro, caso único a nível mundial, com efeito demonstrador e afirmador de uma cidade a nível internacional (e, entretanto, está-se a pensar a construção de uma cidade inteligente em Paredes), porque supostamente não surgiu uma autorização de uma determinada Direcção Ambiental. E, no caso das barragens, a autorização já veio? Novamente, não critico a capacidade da EDP em as obter, mas de todos os que deixam morrer projectos válidos pela inexistência de um dono de problema que assuma a luta perseverante na defesa de projectos em que, supostamente, acredita. Eu nunca me esqueço que há duas formas de pecar perante Deus e os homens: por actos e por omissões.
José Ferraz Alves