De: F. Rocha Antunes - "Rua das Flores"

Submetido por taf em Sábado, 2006-07-08 16:17

Meus Caros,

Eu até nem sou dado a estas coisas mas acho um bom augúrio que a primeira operação de reabilitação tenha sido precisamente numa rua com esse nome magnífico.

Não resisto a propor algumas lições desta operação da Porto Vivo:

Primeiro, a iniciativa. Numa terra em que por cada um que faz alguma coisa há dez que dizem mal, ter a iniciativa e concretizar alguma coisa merece sempre os meus parabéns, independentemente do resultado.

Segundo, os prazos. Começa a ficar claro para os operadores de mercado que os prazos de aprovação dos licenciamentos funcionam. E fazer uma obra dentro de um prazo razoável é muito mais importante para a atracção do investimento do que se possa imaginar. Se nos lembrarmos do atoleiro que é a situação geral dos licenciamentos camarários no urbanismo do Porto nas últimas décadas, agravada nos últimos 5 anos, mais importante se torna este facto.

Terceiro, a transparência. O processo de sorteio tem muitas limitações e injustiças, não é o mais eficiente do ponto de vista económico (o sistema de leilão claramente traria melhores resultados) mas tem a enorme vantagem de ser transparente. Tão transparente que até os próprios familiares dos funcionários puderam concorrer e ganhar, como qualquer outro cidadão. E isso é essencial para a confiança, porque se pode concorrer das próximas vezes porque existe hipótese real de se comprar uma habitação a preços que são claramente abaixo do mercado (só o leilão permitiria que as casas atingissem um preço de mercado).

Quarto, os resultados. Ficou demonstrado, ainda que numa pequena escala, que há procura. O Tiago bem pode alertar para eventuais excessos de entusiasmo de alguns das responsáveis da Porto Vivo mas o facto está aí, inquestionável: por cada casa que havia por vender, apareceram oito interessados. Se nos lembrarmos que o mercado imobiliário dos concelhos vizinhos é caracterizado por ter oito casas por cada interessado, percebe-se que a relevância deste facto.

Quinto, a hora dos promotores imobiliários privados chegou. Para mim, que sou promotor imobiliário, isso é claro há muitos anos. O investimento público indispensável à revitalização da Baixa está concluído, no essencial, e agora é a vez dos investidores privados. Eu tenho um pudor considerável em falar dos projectos que estou a desenvolver num espaço que é de cidadania, mas posso garantir que dentro de pouco tempo terão notícias concretas sobre os mesmos :-).

Sexto, para ajudar aqueles que pretendam começar a fazer contas ao investimento na Baixa, deixo aqui a minha opinião profissional sobre qual o valor de referência a considerar na venda de mercado dos apartamentos a propor: 2.200 euros por metro quadrado.

Este valor é um valor de referência para apartamentos de dimensão média, entre os 100 e os 140 metros quadrados, com todas as comodidades exigíveis pelo comprador médio, com um lugar de garagem dentro ou muito perto do edifício e numa localização arejada e com bons acessos imediatos a transportes públicos. Os valores de referência são utilizados pelos profissionais da promoção imobiliária para adaptar a análise de cada hipótese de investimento concreta e tomarem uma decisão. Por exemplo, se eu quiser comprar um edifício em muito mau estado de conservação, mas numa localização acima da média, em que posso criar o número de lugares de garagem mínimos, eu poderei pagar por esse imóvel o equivalente a 25% do valor de referência, ou seja, 550 euros por metro quadrado de construção. Se esse imóvel tiver elementos arquitectónicos que possam recuperados e valorizem os futuros apartamentos, e o seu estado de conservação for razoável, posso pagar consideravelmente mais, uma vez que o valor de venda final pode ser superior ao valor de referência.

O valor de referência é um valor que reflecte as condições de mercado de uma determinada zona quando comparada com outras zonas de uma mesma região. O valor de referência deve servir para calcular os valores de oferta que reflictam as condições específicas de cada casa. Vou dar mais dois exemplos apenas para ajudar a concretizar. Um dos factores mais importantes é a localização e essa, dentro de uma zona, também varia consideravelmente. Um apartamento na Rua de Sá da Bandeira vale mais do que outros iguais mas localizados em ruas diferentes: na Travessa da Pena Ventosa, na Rua dos Caldeireiros e até que em certas zonas da Rua de Gonçalo Cristóvão. Outro factor que pode alterar consideravelmente o valor de uma casa é a vista: eu sei de um prédio em cima do Rio Douro que vale, na minha opinião, 5.000 euros por metro quadrado. Os prédios da rua imediatamente atrás desse se calhar valem 1.800 euros por metro quadrado, porque não estão em cima do rio e têm um tipo de problemas sérios, como a falta de salubridade e de segurança em caso de incêndio, que não se resolvem facilmente.

Concordo com o Tiago, a hora do investimento privado chegou. E quem o fizer agora tem a vantagem de ter mais potenciais compradores do que quem apenas decidir investir daqui a 5 anos.

Francisco Rocha Antunes
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Nota de TAF: Caro Francisco, não vejo nenhum problema em que faças aqui referência a projectos imobiliários concretos na Baixa, pelo contrário!