De: Luís de Sousa - "Mestres... mas não muito"
É com grande satisfação que hoje fiquei a saber que muito provavelmente dentro de 3 anos posso vir a tornar-me "Mestre em Arquitectura", fantástico não é? Tendo em conta que estou ainda no 2º ano e que daqui a 3 terei apenas 22, serei eu e mais uns quantos milhares de outros estudantes de arquitectura que se formem até lá ao abrigo do "Tratado de Bolonha". Vendo bem Portugal passará a ter mais mestres em dez anos do que teve em todo o seu passado universitário.
Apenas com uma PEQUENA diferença, provavelmente o novo título não trará maior qualidade ao urbanismo e arquitectura portugueses, devido a uma série de factores bem conhecidos de todos nós que passo a citar.
1- A continuidade da regulação da arquitectura estar sob alçada de funcionários camarários licenciados em arquitectura e em engenharia civil e não a cargo do próprio arquitecto (devia ser interessante se um médico cirurgião antes de operar tivesse de entregar um plano minucioso da intervenção cirúrgica a um seu colega que RARAMENTE opera para este dar o seu parecer, que caso fosse desfavorável implicaria o adiamento da operação e um novo plano que se enquadrasse num qualquer manual de procedimento médico do século passado, similar aos PDM's manhosos e ou RGEU a que obrigam os arquitectos cá em Portugal, sendo que no meio de tudo isto o que menos importa é a saúde do doente.
2- A descredibilidade em que a profissão caiu junto da opinião pública que prefere muitas vezes os engenhosos e os desenhadores que sempre fazem o trabalho mais rápido (logo mais barato) e que não se importam de passar a limpo o desenho feito no guardanapo pelo "pato" (bravo claro está) ou, ainda pior, vender um modelo do livro 1001 maneiras de fazer uma moradia (segundo a forma e tamanho do terreno quer seja ele no Porto ou em Alter do Chão) a um pobre analfabeto espacial que o procure para licenciar a construção da sua casa.
3- Alguns arquitectos gostam muito de dinheiro! Que mal tem? Afinal todos nós gostamos e o arquitecto tem que se precaver pois as oportunidades para projectar nem sempre são muitas e a arquitectura é uma arte que leva o seu tempo a formalizar até ao projecto de licenciamento (que é o mais importante senão os iluminados camarários não deixam as pessoas ter casa ou mandam abaixo tudo que não seja aprovado). Quando se trata de bem público e o cliente não é pessoa mas sim instituição, há alguns arquitectos que tomam opções que a nível arquitectónico até nem têm muito relevo, mas quando o preço do projecto está inerente a uma percentagem em relação ao preço da obra pode fazer muita diferença. Isto associado às derrapagens faz com que se construa menos vezes e portanto se requalifique menos espaço público.
4- Nós, futuros mestres, muito provavelmente não seremos uma mais-valia em termos gerais, pois os que são realmente bons (não devemos confundir bons com médias de final de curso altas, pois nem tudo corre bem no ensino superior e nem sempre os bons profissionais foram bons alunos) conseguiram fazer algo de bom pela arquitectura como agora há quem faça, os outros continuaram a ser medianos ou mesmo maus e o novo título de nada lhes servirá além do prefixo no cartão de crédito. Logo a arquitectura e o urbanismo não sentirão muito a nossa entrada no mundo profissional pois mestre com 5 anos de formação ou licenciado com 6 a diferença não será com certeza muita.
Cumprimentos
Luís de Sousa
P.S. Felgueiras durante 4 anos licenciou 2481 projectos, apenas 134 destes foram assinados por arquitectos. (Arq. José Pulido Valente in "Remar contra a Maré", pag.25)