De: Rui Valente - "E se o Povo não formos só nós?"
Caro Tiago
Parabéns Tiago! Pelo que vai escrevendo nota-se uma perfeita adaptação aos paradigmas político-partidários tradicionais. Ou seja, sobre regimes de administração política está tudo inventado: ou ditadura, ou democracia. Sendo que, já todos concluímos, nenhuma delas é perfeita, por quê então insistir na democracia, tal como ela está?
A hipótese que o Tiago considerou à laia de provocação ("E se o povo não quiser?"), pode ser analisada sob várias perspectivas. Obviamente, a mais previsível e confortável será a politicamente correcta. Nada de inovador, convenhamos. Todas as outras, como é costume, não são mais do que actos suicidas, aventureirismos, etc., e tal. Já conhecemos o "CD". É pena que tenha de ser sempre assim, porque se houvesse um pouco mais de coragem e abertura para enfrentar novos desafios, talvez muito boa gente (entre a qual se encontra o insigne autarca portuense) tivesse votado a favor da regionalização no tempo certo. Assim, nem uma coisa nem outra e por cá continuamos a discutir o sexo da angélica política...
Mas, já que fez questão de nos lembrar que a essência da democracia está no voto do povo, então talvez tenha chegado a hora de questionarmos se essa essência da democracia começa e termina no acto eleitoral. Se me vai dizer que aquilo que vamos fazendo nos blogues e nas nossas actividades profissionais (e agora, no seu caso, também partidárias) é uma outra forma de estender a intervenção cívica, digo-lhe já que para mim isso não só não chega, como não representa, nem de perto nem de longe, o Povo. Há um "Povo" informático e outro que nem sabe o que isso é. A que povo essencial se reporta o Tiago? Qual deles estará em maioria?
Eu diria que as coisas não são assim tão óbvias, diria que a essência da democracia passa em primeira instância pelo voto popular e, depois para ser sustentável, pela aplicação das regras democráticas e pelo cumprimento das promessas eleitorais de quem se constitui Governo. Se não cumpre, não serve, não merece representar o Povo! Só que a solução para os incumprimentos não pode limitar-se a substituir peças por outras peças, tem de passar por disciplinar a classe política. Sem isso, não existe democracia, existe um embuste. E não me parece intelectualmente sério que de uma doutrina adulterada, cheia de contradições, de abusos de poder, possamos passar imediatamente para uma verdade inquestionável e vitalícia sobre a bondade desta democracia.
Sobre as preferências nacionalistas de cada um, tem a ver com o que atrás referi. Já gostei mais deste país do que gosto. Não me peçam por ir a reboque de um nacionalismo scolariano-centralista porque nessa patetice nunca participarei. Os valores de um país medem-se pela qualidade dos seus dirigentes e do seu povo. Este, em que agora vivo, infunde-me vergonha.
Rui Valente