De: F. Rocha Antunes - "O Bolhão e o mercado"
Meus Caros
Raras vezes um sítio teve um nome tão adequado como o Mercado do Bolhão: o tamanho da bolha que foi criada à volta deste assunto é, de facto, muito grande. Falo de bolha porque há uma vontade de empolar o assunto que recusa qualquer hipótese de razoabilidade: toda a gente concorda que é preciso fazer alguma coisa com o Bolhão desde que não seja o que está a ser feito, sem dar a menor hipótese de isso poder ser uma solução razoável. Pior ainda, pessoas cuja opinião muito estimo, e já são algumas, embarcaram numa contestação que, ou sabem coisas que não dizem, ou decidiram prescindir da lucidez que as caracteriza e me deixam igualmente pasmado.
O que foi que aconteceu até agora?
Foi lançado um concurso público, com regras bem claras e exigentes, que obrigam à manutenção de todas as características que toda a gente anda a gritar que são essenciais manter e que estão lá, mas isso não interessa reconhecer senão não havia razão para protestar, e depois de meses de dura negociação a Câmara escolheu a proposta da TCN. O que foi seleccionado foi um investidor que tem vontade, porque acredita que é bom negócio, em cumprir o exigente programa posto a concurso, sujeitando-se a desenvolver todos os passos e obrigações que ainda faltam para poder concretizar a sua visão do futuro Bolhão. Anda toda a gente a falar de um projecto que ainda não foi feito, nem apreciado pelas entidades que o têm de aprovar e julgar imensas coisas irreversíveis que pelo menos arquitectos maduros sabem melhor que eu que não o são.
Imaginem, por hipótese, que o projecto que vai ser apreciado tem os mesmos 2 pisos de estacionamento, a mesma laje intermédia e a mesma configuração, na essência, que o projecto do Arq.º Massena. Ou melhor ainda, que não tem qualquer piso de estacionamento e se limita a recuperar a estrutura existente? O facto de a proposta da TCN ter sido subscrita pela Associação de Comerciantes do Bolhão não interessa nada, toda a gente prefere aderir aos gritos dos associados da D. Laura, que são os das lojas exteriores, e não os que vão voltar para lá, como a TCN garante desde sempre e os próprios confirmam.
Então o que faz que estas pessoas que eu tanto admiro terem esta posição? Correndo o risco de ser injusto acho que sei o que é: o medo do mercado. Nós gostamos pouco do mercado. Passamos a vida a falar do mercado, da importância do mercado, mas estamos pouco habituados a agir em mercado. E o mercado é isto: define-se um caderno de encargos exigente, abre-se um concurso público, aceitam-se propostas, negoceia-se com as melhores e apura-se o vencedor. Não foi um concurso de arquitectura, nem tinha que ser, por muito que custe ao Arq.º Massena. Quem vai investir tem o direito de escolher o arquitecto da forma que achar melhor. O interesse público é garantido pelas entidades que têm a obrigação legal de proteger o património e todas as outras obrigações legais.
Quando o assunto "desinchar" isto vai ser mais claro.
Francisco Rocha Antunes