De: Daniel Rodrigues - "Quo Vadis"
Bom, será esta a minha última intervenção sobre este assunto, para dar o espaço aos assuntos prementes neste momento: pressionar a STCP para o aumento do número de eléctricos, encontrar uma solução adequada para o problema da Nun'Alvares, manter todas as informações actuais sobre o processo de reabilitação da Baixa, e, de uma forma geral, pensar o Porto.
Mas não queria deixar de clarificar a minha posição que creio ter sido um pouco adulterada pelas palavras do caro José Luís Ferreira. Creio que os entendimentos subjectivos na condução da nossa vida enquanto seres racionais são inequivocamente essenciais à nossa condição humana, concordo. Mas, enquanto pessoas inseridas numa sociedade, criamos um conceito, chamado "Lei", que procura ser objectiva. Entendimentos subjectivos, são, a meu ver, dispensáveis na análise de um caso perante a Lei. Eu não sou especialista em Direito, mas sinceramente, tremo quando a frase "apenas demonstrar da forma que entendiam" aparece enquadrada numa decisão judicial. E foi isso que referi. Mas este é o meu entendimento subjectivo sobre o caso. Outras pessoas terão outro. E não as considero menos cultas por causa disso (eu usei da ironia no que respeita a ser culto, não sei se terá bem atingido o seu propósito. Embora a cultura, novamente, seja muito subjectiva. Assim como o que é uma elite, mas isso é outra discussão.).
E, clarificando, não vejo o absurdo de considerar que acções impulsivas são antagónicas em relação ao que pretendemos hoje em dia para o Porto (ou que, pelo menos eu, julguei que era o sentimento predominante entre as pessoas que aqui escrevem): uma atitude construtiva, de execução, de bom-senso, de encontrar soluções. Ora diga-me, frontalmente, e fica aqui o meu e-mail para quem quiser continuar uma discussão sã sobre o tema (danielcr@ieee.org), se considera a atitude dos intitulados 'artistas' construtiva. Se através da sua acção mobilizaram forças e energias na cidade. Se movimentaram o (subjectivo) povo, ou apenas algumas (subjectivas) elites. Se evitaram a atitude de confronto para encontrar um espaço adequado para as suas actividades. Se actos como este devem ser admissíveis numa sociedade democrática? É certo que uma sala de espectáculos tem a sua especificidade, mas devemos aceitar o precedente? Se o Filipe La Feria se decidir neste momento a contestar esta esta decisão judicial e encerrar-se dentro do Rivoli, o que dirá o José Luís Ferreira? Presumo que gritará na rua que a sala é do povo do Porto, mas isso é só uma assunção.
Tendo em conta a falácia tremenda apresentada pelo seu autor, desejo-lhe outras leituras, mais... reais. Permita-me, por exemplo, citar uma breve passagem de uma obra de um nosso grande conterrâneo que foca bem a problemática do espalhafato artístico. Estou seguro que entenderá perfeitamente a metáfora (e deixemos a política expressa de parte.)
"— À força é que se fala — tornou o campino para estabelecer a questão em terreno que lhe convinha. — À força é que se fala: um homem do campo que se deita ali à cernelha de um toiro que uma companhia inteira de varinos lhe não pegava, com perdão dos senhores, pelo rabo!...
E reforçou o argumento com uma gargalhada triunfante. que achou eco nos interessados circunstantes que já se tinham apinhado a ouvir os debates.
Os ílhavos ficaram um tanto abatidos; sem perderem a consciência de sua superioridade, mas acanhados pela algazarra.
Parecia a esquerda de um parlamento quando vê sumir-se no burburinho acintoso das turbas ministeriais, as melhores frases e as mais fortes razões dos seus oradores.
Mas o orador ílhavo não era homem de se dar assim por derrotado. Olhou para os seus, como quem os consultava e animava, com um gesto expressivo, e voltando-se a nós, com a direita estendida aos seus antagonistas:
— Então agora como é e força, quero eu saber, e estes senhores que digam, qual é que tem mais força, se é um toiro ou se é o mar.
— Essa agora!...
— Queríamos saber.
— É o mar.
— Pois nós que brigamos com o mar, oito a dez dias a fio numa tormenta, de Aveiro a Lisboa, e estes que brigam uma tarde com um toiro, qual é o que tem mais força?
Os campinos ficaram cabisbaixos; o público imparcial aplaudiu por esta vez a oposição, e o Vouga triunfou do Tejo."
Bem haja,
Daniel Rodrigues, a partir de bem longe do Porto...
PS: Caso não se tenha apercebido da falácia, a pessoa normal, provavelmente inculta, escrevendo a tinta azul, mente, logo como interpretar a indicação de que ele não tinha tinta vermelha? Estava provavelmente a mentir, o que significa que tinha a tinta vermelha... ora se tinha tinta vermelha, poderia escrever com ela. Mas optou por utilizar a tinta azul. Que raio de beco. Então ele optou por não ser livre? Mas pronto, são estes idiotas raciocínios matemáticos que quebram a frase brilhante e a poesia dos autores estrangeiros. Raios partam o povo! Já agora, sabe sequer pronunciar Žižek? Não assuma a ignorância das outras pessoas. Pode ficar agradavelmente surpreendido...