De: David Afonso - "A hora da política"
A extinção da FDZHP não suscitou paixões. Com excepção da JCB, ninguém perdeu muito tempo a pensar no assunto. Nem os partidos, nem as personalidades que directa ou indirectamente estiveram implicadas no processo de criação desta Fundação. Surpreendente? Nem por isso. Era um segredo de polichinelo. No fundo, já todos sabiam que a coisa ia acabar mais ou menos assim. Os grémios partidários, como todos estarão fartos de saber, nem sempre estarão à altura e as elites migraram para Sul, anunciando este Inverno cívico em que vivemos.
Para além do esbanjamento do saber acumulado durante cerca de 15 anos, esta medida poderá dar um sinal negativo aos portuenses e aos portugueses. A percepção que se tem é a de que os responsáveis políticos deixaram cair a bandeira da reabilitação social e humana da Zona Histórica. Admito estar errado, mas a verdade é que existe esta impressão de que a cidade admitiu estar perante um caso perdido, que a coisa só vai lá com injecção de sangue novo. Quanto à população residente, com raízes bem fincadas, as quais, em alguns casos, podem ter a profundidade de gerações, bastará a ter sob vigilância como a uma doença incómoda sobre o qual nada podemos fazer, mas com a qual temos de viver (mal).
Parece-me que é urgente dar um sinal positivo que contrarie as expectativas mais negativas. Não defendo o retorno a um assistencialismo que tende a perpetuar a situação actual e assistência é o que as IPSSs dão. O Estado central, a Câmara e os privados não podem alhear-se deste problema. É necessário preencher o vazio deixado pela FDZHP, caso contrário corremos o risco de deitar a perder todo o esforço que se tem vindo a fazer na reabilitação física do Centro Histórico, a qual só fará sentido se, em primeiro lugar, for realizada em nome dos que lá vivem.
Não será um desafio fácil, mas pergunto-me se teremos alternativa. Nada fazer, ou passar o dossier às IPSSs, lavando daí as mãos, é aceitar mais uma derrota social, económica, política e... moral para toda a cidade. E quem é que quer viver numa cidade que não sabe tomar conta de si própria? É hora da política voltar ao terreno, é hora de decisões. Mas também é hora dos privados fazerem um pouco mais. Por exemplo, existem bancos que são parceiros na reabilitação da Baixa portuense. Pois bem, alguém melhor do que estes bancos estará em condições para avançar com um programa de micro-crédito desenhado especificamente para a Zona Histórica?
PS1: Compreendo o entusiasmo pelos aviões apesar de não o partilhar com os 600 mil que por aí andaram e só um cego dos piores (dos que não querem ver) é que não vê que a air race foi positiva para a cidade. Mas não exageremos: se fosse possível transformar circo em pão, seríamos uma superpotência económica.
PS2: Muitos dos meus camaradas d'A Baixa do Porto devem ter ido ao debate da Via Nun'Álvares. Eu, sem tempo para lá ir, espero ninguém de lá saia com a sensação de tempo perdido. Deixo aqui mais uma provocação: se a pequena cidade com 1200 novas habitações e com 3000 habitantes vier a acontecer porque não negociar pelo menos contrapartidas para a Baixa? Até Menezes o fez!
David Afonso
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