De: Joana da Cunha Barros - "A evidência #1"
Já reparei que as atenções estão a divergir para um acontecimento mediático do momento e por isso vou ficar aqui quietinha. Contudo, devo concordar com FRA e recomendar que ninguém perca a sua razão facilmente, bastando para isso não perder a calma e a serenidade. Não resisto a adaptar uma máxima já muito utilizada de JFK "(...) perguntem antes o que podem fazer pelo Porto".
Não posso deixar passar a notícia do JN que demonstra aquilo que é evidente para mim e que aflorei no último comentário: uma reabilitação consolidada e duradoura 'precisa-se'. Estou, no entanto confiante, pelo que conheço do trabalho e da pessoa do Eng. Rui Quelhas (é alguém que equilibra uma balança), que o processo esteja a decorrer de forma correcta.
Mas se juntarmos a um mau projecto uma pesada ameaça ou sanção, não sobra muito espaço para a criatividade. Violentar um quarteirão (espaço privado) para se construir um estacionamento público e uma praça (espaço público) e uma galeria comercial de luxo (?) não me parece motivo suficiente para cumprir os pressupostos que permitem afirmar a legitimidade da expropriação, designadamente o princípio da utilidade pública e da proporcionalidade. Para este último é ainda necessário verificar o sub-princípio da adequação (o que a intervenção específica beneficiará a reabilitação do quarteirão), o sub-princípio da necessidade (tendo em consideração o excessivo sacrifício que a intervenção impõe aos proprietários), e o sub-princípio da proporcionalidade em sentido estrito (qual o eventual grau de satisfação do interesse público tendo em conta a afectação gravosa dos interesses particulares).
Ainda assim (caso a intervenção avance), para minimizar o estrago, proponho a construção, no lugar da praça, de um equipamento cultural ou desportivo para compensar a cidade. Imaginem um pequeno pavilhão para os miúdos e as colectividades poderem praticar as suas actividades e ajudarem a resolver os problemas de exclusão. Poderá ter na mesma o squash e o spa e etc., para os clientes VIP do novo hotel, mas doar à população algo que ela não tem e tanto precisa, algo mais do que uma praça... terra de ninguém, que ninguém cuidará e mais um espaço ao abandono para precisar ser reabilitado. Total confusão (desnecessária) entre espaço público e privado.
Mas não, eu não concordo com a ocupação do interior dos quarteirões ao contrário de TAF. Penso que as prioridades deveriam ser outras, deveriam também incluir cidade e ambiente sustentáveis (como há décadas o Professor Ribeiro Telles tenta demonstrar, provando os efeitos negativos do mau urbanismo), deveriam respeitar o PDM em matéria de área permeável, mas sobretudo respeitar aquilo que tem sido claro em tudo que é lei, a fronteira entre espaço público e privado. Um estacionamento público é habitualmente construído em espaço público e tendo já sido perdida a hipótese de o fazer na Avenida dos Aliados e na Avenida da Ponte, na Praça da Liberdade e na Almeida Garret, sobra apenas o Largo dos Lóios. Independentemente do problema geológico (grave, julgo) o maior obstáculo à intervenção da SRU é não o poder fazer em espaço que não seja o quarteirão, logo...!
Joana da Cunha Barros
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Nota de TAF: Há quarteirões e quarteirões, e nunca defendi isso ser uma prioridade/necessidade imediata nem muito menos a sua ocupação total. Estou naturalmente de acordo quanto à sustentabilidade, nem poderia ser de outra maneira. :-)