De: Alexandre Burmester - "Comprido mas instrutivo"

Submetido por taf em Quarta, 2007-07-11 18:22

Já aqui disse, mais que uma vez, que há certas classes profissionais, como os Políticos, que andam neste mundo a julgar que a realidade começa e acaba nos próprios. A par dos políticos, existem mais outros tantos, de onde não fica nada longe a Justiça e os seus Juízes. Senão entenda-se a sentença que aqui transcrevo.

Trata-se do edifício em construção na Rua Marechal Saldanha, e porque este foi um assunto já aqui denunciado, e porque se tornou público, dou neste momento conhecimento da decisão tomada pelo Tribunal Administrativo relativamente à Providência Cautelar. Com base nas alegações apresentadas, que transcrevo parte extraídas da Sentença:

“…..Para tanto, alegaram que, o presente procedimento cautelar, se destina a impedir a realização da edificação de modo a salvaguardar a qualidade de vida, o ambiente, o urbanismo e o ordenamento do território que são postos em causa pela referida construção, defendendo que a ilegalidade do acto de licenciamento é evidente, porque não respeita o coeficiente de ocupação do solo permitido pelo artº 2º do PDM-1993 e pelas normas provisórias, o que determina a nulidade do acto de deferimento do pedido de licenciamento; que prejudica as características dominantes do quarteirão, a que se refere o artigo 5º do PDM-1993, pois a cércea deste projecto ultrapassa a definida pela construção existente, pelo que mostra-se também incumprido o disposto no artº 5.°, 1, a), do PDM-1993, o que inquina o acto de licenciamento do vício do violação de lei, causal da sua nulidade, conclusão a que também se chegaria em face do PDM actualmente em vigor (PDM-2006); que a construção de dois andares recuados não é permitida pelo Regulamento Municipal de Urbanização e Edificação do Concelho do Porto, o que gera a nulidade do despacho; que a cércea do edifício proposta para a Rua do Funchal ultrapassa a regra dos 45° graus, o que representa a violação de lei geradora de nulidade; que o projecto objecto deste processo igualmente não cumpre o previsto nos instrumentos municipais de planeamento urbanístico quanto a área de impermeabilização, o que representa violação de lei geradora de nulidade; que o projecto em causa também não cumpre a distância mínima de 10 metros entre fachadas de edificação exigida pelo artigo 60° do RGEU relativamente a moradia situada a poente, o que gera a sua anulabilidade…”.

E que inclusive relata a cronologia do processo Camarário:

  • "...
  • - Em 11 de Maio de 2005, a Requerente do licenciamento apresentou novo aditamento ao processo, o qual veio a merecer parecer favorável da gestora em 12 de Maio de 2005;
  • - Em 17 de Maio de 2005 foi apresentada informação com proposta de aprovação do projecto de arquitectura;
  • - Em 31 de Maio de 2005, a Chefe de Divisão de Gestão Urbanística II proferiu despacho concordante, tendo o Director Municipal do Urbanismo, em 15 de Junho de 2005 proposto a aprovação de tal projecto;
  • - Em 16 de Junho de 2005, o Vereador responsável pelo Pelouro do Urbanismo, Mobilidade e Desenvolvimento Social aprovou o projecto de arquitectura.
  • ..."

(Ainda há pessoas que dizem que a Câmara não é rápida a apreciar projectos)

O pedido de medidas preventivas (Providência Cautelar):

” … só poderá ocorrer se houver "fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado" ou se houver razões para temer a “produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o Requerente pretende ver reconhecidos no processo principal”.
….
Defenderam os requerentes, a este propósito, que o não decretamento da suspensão de eficácia o acto de licenciamento requerida ao Tribunal e, consequentemente, a continuação da execução da obra, originará a conclusão do prédio e a sua ocupação por terceiros para a habitação destes, tornando impossível a reintegração da situação actual. E que ocasionará danos para os que residam próximo por virtude da afectação da salubridade das habitações próximas dada a privação ou diminuição de luz solar bem como mais trânsito e menos estacionamento na zona.

Acrescentaram que “o interesse público de cumprimento das regras urbanísticas e do bom ordenamento territorial não se compadecem com as demoras típicas de um procedimento jurisdicional ordinário, mas impõem urna decisão célere que suspenda a realização de operações urbanísticas antes que se torne praticamente impossível revertê-las” e que “Por mais que se ficcione sobre os seus efeitos não é possível vir, no futuro, a «apagar-se», pelo provimento da sua impugnação, o conjunto de situações originadas pelas consequências do acto cuja suspensão da eficácia requer”.

Ora vejamos a conclusão:

Sendo certo que a não suspensão do acto ocasionará a construção do edifício e que essa circunstância poderá representar uma maior dificuldade de reparação dos danos para os bens que se pretendem acautelar, ainda assim, em caso de procedência da acção principal e demonstrada a ilegalidade do acto de licenciamento, nada impede que, em definitivo, se proceda à imposição e efectivação das necessárias correcções que advenham da alegadas ilegalidades ocasionadas com o deferimento da construção em questão, nomeadamente, no que tange à ocupação da área de terreno, à cércea dominante e regulamentarmente imposta bem como aos dois andares recuados e à área máxima de impermeabilização.
….
Assim sendo, é forçoso concluir que a alegação feita, não sustenta a existência de um verdadeiro periculum in mora e sem este a providência requerida não pode ser decretada….”

Assim, estando ainda a correr a acção principal, o Juiz entendeu não haver lugar à Providência Cautelar, mesmo que se prove que está mal, porque concluiu que um edifício é igual a um bolo. Se tiver partes a mais, é fácil - corta-se.

Então se a taxa de implantação do prédio supera o legal, e por acaso até se trata de uma laje de ensoleiramento com 1 metro de altura, ainda mais fácil é cortar e diminuir. Mas afinal que percebe esta gente de construção? De que percebem? Quando a Providência Cautelar entrou, ia o prédio no 3º andar, hoje está concluído nos 7 pisos. É caso para dizer que a Justiça tarda e só por isso falha.

Alexandre Burmester

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Nota de TAF - Senhores(as) Jornalistas que lêem o blog: há aqui tanto para investigar e publicar! A começar pelos nomes de todos os intervenientes: arquitectos, técnicos, decisores autárquicos, promotores, etc., etc. E juiz, porque não? Caro Vereador do Urbanismo, o que diz deste processo aprovado pelos seus antecessores?