De: Pulido Valente - "Governabilidade das cidades e dos concelhos"

Submetido por taf em Quarta, 2007-07-04 15:31

A propósito da entrada do Francisco quero dizer que a carga burocrática que atrasa os procedimentos e cria a corrupção não se deve só à má qualidade dos funcionários, que os há e muitos não competentes, mas às leis que possibilitam as traficâncias e a corrupção.

Por exemplo: não há dúvida de que compete às câmaras a fiscalização daquilo que se constrói. No entanto o facto de ter de haver uma aprovação prévia dos investimentos sob a forma de aprovação dos projectos compromete as câmaras e cria o ambiente propício para o tráfico de influências e o livre arbítrio dos funcionários e dos políticos.

Se a fiscalização dos projectos for feita depois de taxados os processos e liquidadas as verbas a pagar, os autores dos projectos tinham muito cuidadinho no que fazem pois cai-lhes em cima a lei accionada pela câmara e julgada nos tribunais que diriam se a interpretação da lei está correcta na interpretação do projectista ou na dos funcionários e políticos. Como deve ser, pois não há qualquer explicação para retirar a responsabilidade aos autores dos projectos transferindo-a para as câmaras que, com as aprovações, se comprometem. Daí os enormes encargos com indemnizações que as câmaras têm.

Há dezenas de anos que se reclama contra estas leis mas, afinal, ninguém da área do projecto ou dos investidores está interessado em mudar. Porque já têm as coisas arranjadas para facilitar os seus assuntos e preferem não mudar e assumir e dar a responsabilidade a quem deve ser dada.

Na verdade, se as câmaras fizessem a fiscalização independentemente de se comprometerem com os alvarás que aprovam, a responsabilidade ficava, como deve, com os autores dos projectos que seriam confrontados com processos levantados pela câmara e pela organização profissional nos casos de dolo ou incompetência. Os serviços ficavam assim sem a faca e queijo na mão, e os políticos também, o que acabava de vez com a corrupção nas câmaras e nos serviços exteriores às mesmas. Para estes seria mantida a hipótese de consulta directa às entidades exteriores à câmara caso se quisessem defender de preconceitos dos funcionários do IPPAR, por exemplo.

Há anos que bato nesta tecla e não houve um único arquitecto que me desse um eco consonante. Preferem os arranjos e cumplicidades com os políticos e com os funcionários (às vezes os administrativos chegam, não sendo necessário ir até aos técnicos). Será que chegou a altura de responsabilizar os arquitectos e os outros técnicos intervenientes pelo seu trabalho sem ser preciso passar pela aprovação das câmaras?

Fiscalizar não quer dizer aprovar.