De: Cristina Santos - "Do ensino e da burocracia"
Onde há Estado há burocracia, é o Estado que gere o sistema educacional. A burocracia por onde passa anula a capacidade de iniciativa pessoal do indivíduo. É por isso normal que as empresas portuguesas enfrentem graves problemas de produtividade, as pessoas não têm iniciativa, não têm desenvolvidas as capacidades que lhes permitam soluções com base na teoria.
São necessários 3 anos, no mínimo, para adaptar um trabalhador a uma nova tarefa. É um investimento feito pelas empresas, feito no local de trabalho, com custos inconcebíveis e com resultados aquém da concorrência externa, porque ao fim de 3 anos novas soluções surgiram e é necessário começar tudo de novo, porque não há capacidade de associação.
Por exemplo a nível do secretariado, há pessoas a lidar com computadores há 4/5 anos, que invariavelmente bloqueiam o sistema e geram filas enormes no atendimento, pessoas que apelam aos técnicos diariamente e ainda assim não entenderam que seja qual for o motivo do bloqueio, o técnico em primeiro lugar desliga e volta a ligar o computador e que muitas vezes não faz mais do que isso. Há um excesso de zelo pela burocracia, estão todos preocupados com o atestado burocrático emitido e ninguém se preocupa se as pessoas desenvolvem capacidade de raciocínio. Um curso superior destina-se a abrir horizontes, a abrir o raciocínio, para que o adulto entenda tudo o que está ao seu alcance.
Vamos observar 3 trabalhadores na construção civil - isto é um exemplo que não pretende ser generalista nem biográfico – o Africano, o Português e o Ucraniano. Vamos colocá-los todos perante uma situação nova, que deriva de uma situação básica cujas as regras todos conhecem.
- - O Africano não percebe que está perante uma situação nova, dá-lhe o seguimento da situação normal e mesmo depois de explicado continua a não perceber onde errou, uma vez que respeitou as regras, e por isso só pode desempenhar tarefas que não tragam surpresas.
- - O Português, perante a situação nova, pára tudo até à chegada de um técnico especializado que virá atestar que não aprendeu essas regras mas que perante a teoria básica e as circunstâncias há o bom senso que compete a cada trabalhador. O Português entende, mas na próxima vez que lhe surgir uma situação idêntica em que as circunstancias são mesmas, só estão baralhadas, volta a parar tudo para chamar novamente o técnico, até cumprir um nível mínimo que lhe exigiu a experimentação directa de todas as variantes, para compreender o objectivo.
- - O Ucraniano não entende nada das regras nem das justificações, só fixa o inicial e o ponto que se quer atingir, e depois desenvolve ele próprio uma estratégia para atingir o objectivo. Não fala mas observa, e sem nunca ter experimentado pode estar apto a pintar com brio uma parede, porque durante a obra foi apreciando as regras, os defeitos, as perfeições dos pintores e tem um sentido de associação.
Onde queria chegar com isto? Queria dizer que não temos capacidade de produção porque fomos educados burocraticamente. Tudo o que sai das regras, mesmo que saia muito pouco, é preciso chamar uma comitiva para solucionar a questão. Sem iniciativa não há arrojo, sem capacidade de associação e bom senso, não vamos para além do minimamente exigido, da regra base e assim não pode ser. Não há computador escreve-se à mão. Um ofício para a Junta de Freguesia é formalmente diferente de um ofício para o Governo, são as mesmas regras, acrescidas de capacidade de dedução, e isso escasseia, que o digam os chefes de gabinete.