De: António Alves - "Apontamentos finais sobre TGV's..."
"... onde também aproveito para abordar a esquecida Linha do Douro"
1) O T deitado é de facto a melhor solução porque reune num só troço o tráfego proveniente do Porto com o proveniente de Lisboa. Pode ainda captar tráfego na Galiza. Outra vantagem seria contrapor um universo de mais de 6 milhões de pessoas que vivem nas margens do traçado em T aos 5,5 milhões da região de Madrid. Uma infra-estrutura ferroviária destas leva mais do que a vida duma geração a amortizar-se. Mas isso não implica que a sua operação deva ser hiperdeficitária: a reunião de tráfegos num só troço contribuiria certamente para a redução dos mais que prováveis défices de exploração. E ainda com a vantagem de não prejudicar o tempo de percurso de Lisboa a Madrid e reduzir o tempo do Porto a Madrid. Enfim, manda quem pode. Mas manda mal.
2) Miguel Oliveira diz que a rede em Pi invertido é "sem dúvida a mais completa (ligando dois portos e desenvolvendo o Alentejo e o Centro) e vantajosa quando totalmente construída". Mas o problema reside mesmo aí: nunca será construída. Se o Governo tivesse tal intenção, a linha prioritária seria Aveiro-Salamanca, que é o traçado que nos ligaria verdadeiramente à Europa e por onde as nossas mercadorias circulariam em direcção ao norte do continente sem ter que prestar tributo à capital espanhola. Pelo que se vê, não existe qualquer intenção de a construir e nunca passará dum traço no mapa. A linha Lisboa-Badajoz-Madrid não liga Portugal a nada. Liga apenas Lisboa a Madrid. Transforma também Badajoz na capital de facto do Alentejo. Mas isso, no actual estado das coisas, até deve ser vantajoso para os alentejanos.
3) Nestas circunstâncias o Porto e o Norte de Portugal devem agarrar com ambas as mãos a ligação Porto-Vigo e manter a pressão e vigilância para que não haja retrocessos neste projecto. Resta-nos ainda um problema: ligar os portos de Leixões e Aveiro à rede europeia. Tal pode ser feito religando a Linha do Douro a Salamanca. Esta região espanhola transformar-se-á em breve numa importante plataforma intermodal. Uma plataforma intermodal fluvio-ferroviária no Douro superior colocaria o Atlântico a 150 Km de Salamanca, 220 Km de Valladolid e 350 Km de Madrid. As oportunidades que se abririam a Leixões, ao Porto e à Região do Douro seriam imensas. A Linha do Douro tem ainda uma outra potencialidade que não pode ser desperdiçada: a turística. Esta linha, umas das mais belas e espectaculares do mundo, liga uma vetusta cidade cujo centro histórico é património mundial - o Porto - a outra de igual quilate: Salamanca que, por sua vez, também é classificada como património mundial. Por fim, mas não por último, a ligação entre estas duas cidades atravessa toda uma região que igualmente faz parte do inolvidável património cultural da comunidade humana: o Douro. Se isto não vende turisticamente nada se vende.
Existem sinais de que o governo pretende encerrar a Linha do Douro entre a Régua (ou o Pinhão) e o Pocinho para o serviço de passageiros mantendo apenas, e enquanto for necessário, os comboios de mercadorias com cimento da CIMPOR para o terminal do Pocinho. Tal facto representará o golpe mortal final desta linha. Espero que a Associação Comercial do Porto, instituição que esteve na génese da construção desta extraordinária via férrea, esteja atenta e se oponha violentamente àquilo que António Barreto já classificou como um acto criminoso numa das suas crónicas no Público: pensar o desenvolvimento do Douro sem o Caminho-de-Ferro.
António Alves