De: Carlos Araújo Alves - "O negócio da cultura e as vistas curtas"
«Em Portugal, por exemplo, a percentagem do sector cultural e criativo para o PIB é de 1,4 por cento, abaixo do sector têxtil (1,9) mas acima do dos derivados de borracha e plástico (0,5 por cento).(...) Já em França, Itália, Holanda, Noruega e Reino Unido, o sector cultural e criativo é o que mais contribui para os PIB nacionais.» (no Público)
Há evidências que a insigne e nobel escola económica portuguesa (especialistas em finanças públicas e de todos os tipos ou, mais concretamente, versão moderna de guarda-livros) não consegue decifrar por evidente formatação do ensino. Nas nossas faculdades de economia e de gestão não se formam gestores, não se incute o desenvolvimento do "faro" do negócio, antes espartilham o conhecimento na gestão corrente, na despesa e na receita, escamoteando a análise de oportunidades de negócios e mercados emergentes, condicionamento que limita drasticamente a capacidade de discernir o que é despesa do que é investimento.
Num momento em que o investimento na indústria ruma para o Oriente e a dos serviços concentra-se em enormes grupos financeiros que ninguém conhece ao certo seu modus operandi nem as regras do jogo, o negócio da cultura parece ser o que de mais promissor a Europa pode explorar. Temos património, temos criadores, temos equipamentos, mas falta-nos o know how para explorar o negócio - o investimento na formação de gestores, no caso, gestores culturais. Temos o ouro, mas não o sabemos garimpar... Não tenho a veleidade de pretender sensibilizar pessoas como o Dr. Rui Rio, mas há muita boa gente que ainda está a tempo de perceber estas mudanças dos mercados e do comportamento dos consumidores e arrepie caminho!
Pensem, por exemplo, no chavão de que o Estado gasta muito dinheiro com a cultura! O que é que isso quer dizer em termos práticos? Não sei, mas os factos são estes: o orçamento do Ministério da Cultura é de cerca de 0,6% do PIB enquanto o contributo da cultura para o nosso PIB é de 1,4%!
Repare-se no fenómeno Casa Fernado Pessoa. Trata-se de uma instituição nova? É sobre-financiada? De forma alguma! Trata-se de um caso de sucesso muito recente onde existe trabalho, muito com certeza, mas competência (o termo que a distingue e deveria constituir-se em case study nas nossas faculdades), competência intrínseca às coisas da cultura e, essencialmente à forma como é gerida.
É tempo de aprendermos e de arrepiar caminho sem nos deixarmos prender por conversas de café como a de saber se mais ou menos Estado, se somos neo-liberais ou sociais-democratas ou outra coisa qualquer, porque o mercado e as oportunidades de negócio não esperam nem dessas cogitações querem saber. Para um economista, para um gestor, a questão deveria resumir-se a constatar que a cultura é uma das mais promissoras oportunidades de negócio para a Europa e que devemos investir o mais eficazmente possível para estar rentavelmente nele. Para os governos a questão poderá ser mais complexa, como venho defendendo, pois eles próprios deveriam reorganizar-se numa perspectiva de gestão cultural, envolvendo tutelas que hoje estão dispersas pelos ministérios da cultura, educação e negócios estrangeiros e pelo audiovisual, com missões e objectivos próprios quando não contraditórios.
Carlos Araújo Alves
(Ideias Soltas)