De: Lurdes Lemos - "Em troco do TGV"

Submetido por taf em Sábado, 2011-07-23 14:39

Acompanho regularmente “A Baixa do Porto”. O recente texto de Daniel Rodrigues motivou-me para esta participação que surge não como resposta mas como “aditamento”.

Já há muito tempo que penso que a realização de pequenas articulações na rede ferroviária portuguesa da região Norte e Centro-Norte seriam suficientes para tornar o serviço existente muito mais eficaz. Em vez disso estivemos a focalizar a nossa atenção em projectos muito mais dispendiosos e menos importantes para as populações. Refiro-me particularmente ao TGV. Em países como a Holanda, a Bélgica ou a Suíça (países organizados descentralizadamente e onde o comboio funciona, tem procura e dá lucro) o TGV circula em linhas convencionais às quais foram feitas apenas algumas variantes. Aí, o investimento é feito essencialmente nas linhas convencionais.

Em Portugal temos um património ferroviário ao qual não temos dado o devido valor. As exigentes regras com que as nossas linhas foram traçadas no século XIX deviam permitir hoje um serviço rápido e eficaz. Isto só não acontece por duas razões: o desinteresse por parte da CP em fazer horários que permitam fazer correspondências entre as diversas ligações que realiza, e o desinvestimento no infraestrutura (veja-se que os carris da Linha do Vouga são os mesmos desde o tempo da monarquia, e durante muito tempo permitiam velocidades muito mais elevadas simplesmente porque estavam “dentro do tempo de vida” e tinham manutenção adequada). Casos como a concordância da Pampilhosa (1km de via férrea), que foram estudados pela REFER mas rejeitados pela CP, são mais que muitos.

A lista de articulações que Daniel Rodrigues considerou não é muito distinta da que acho necessária. Ainda assim há que referir a urgência da substituição da via férrea no troço Ovar-Devesas, que está actualmente em situação de colapso. Apenas discordo de Daniel Rodrigues no caso da Linha do Tua. No cenário de adaptação da rede nacional à bitola europeia esta é, de todas as linhas de via estreita, aquela que melhor se adapta à bitola convencional, permitindo uma futura ligação à linha espanhola do AVE em Puebla de Sanábria, o que se pode revelar tão ou mais importante do que uma ligação a Salamanca.

Penso, porém, que estas articulações devem ser feitas com visão de futuro. A ligação ao Aeroporto, por exemplo, deve ser pensada como um troço do que poderá ser um eixo fundamental do nó ferroviário do Porto. Refiro-me à ligação directa a partir da Linha do Norte, atravessando o Porto pela zona da Boavista. Esta ligação já foi anteriormente aqui referida por diversos intervenientes e não difere muito da que foi planeada nos anos 40 e 50, quando se considerava a hipótese da Ponte da Arrábida vir a ser rodo-ferroviária. Se esta ligação for realizada segundo o modelo de outras cidades europeias (veja-se o atravessamento norte-sul de Bruxelas, o projecto CEVA de Genéve em realização, ou os atravessamentos subterrâneos para comboios sub-urbanos em cidades como Madrid, Paris, Milão e Berlim com estações não muito distantes entre si) a segunda linha do metro para Gaia torna-se dispensável, pelo menos a curto prazo. Claro que este investimento seria mais pesado, pelo que seria algo a realizar mais tardiamente devido ao cenário de crise actual, mas que não deveria ser inviabilizado por outros projectos, como a ligação ao Aeroporto ou a ponte sobre o Douro “paralela” à da Arrábida que podem e devem ser pensadas tendo em conta o dito atravessamento.

Cumprimentos
Lurdes Lemos